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Em discuso, Obama pede mais tempo para implementar mudanças

Presidente norte-americano insinua que Mitt Romney pensa com a cabeça da Guerra Fria, além de reprimir liberdades individuais

"Aceito vossa indicação para a função de presidente dos Estados Unidos", disse Obama na Convenção Democrata. Foto: Robyn Beck/AFP
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Por Eduardo Graça, de Nova York

A promessa da esperança virou práxis e foi exercida pelos cidadãos que me levaram à Casa Branca. Assim Barack Obama fechou os três dias de convenção do Partido Democrata com um discurso estratégico, distante de suas celebradas reflexões nos encontros nacionais de 2004 e 2008. A retórica seca, com poucas frases de efeito, traduzida como fria por parte dos analistas, trazia recado direto aos eleitores: “quem fez a mudança foram vocês”.

Em um tom distante do messianismo que marcou suas campanhas ao Congresso e à presidência, Obama citou Abraham Lincoln e disse saber que a trajetória por ele oferecida aos eleitores não é fácil ou de sucesso imediato: “Vocês não me elegeram para que eu dissesse aquilo que queriam escutar. Vocês me elegeram para que eu dissesse a verdade. E a verdade é que precisaremos de mais de um par de anos para resolver os problemas que vieram se acumulando nas últimas décadas.”

O chamamento para a responsabilidade dividida com os eleitores – em determinado momento Obama, acusado por seus rivais de padecer do vício da arrogância, chegou a insinuar que um voto na candidatura democrata equivalia a um ‘exercício de cidadania’ – acentuou o contraste de sua fala com a do outro presidente presente em carne e osso na festa governista.

Na noite anterior, Bill Clinton incendiara a TWC Arena com um discurso de quase uma hora em que estraçalhou a oposição, apresentada como elitista e em guerra contra a classe média e os trabalhadores. Seus seguidores mais próximos celebravam o que consideravam ser o melhor discurso do político sem cargo público com maior aprovação nos EUA.

Para os repórteres presentes na noite de quarta-feira 5 no estádio coberto de Charlotte, na Carolina da Norte, Clinton defendeu Obama de modo mais efetivo do que o próprio presidente em sua batalha contra Mitt Romney. “Nós acreditamos que ‘estamos juntos para o que der e vier’ é melhor do que ‘cada um na sua’”, disse, aplaudidíssimo.

O papel do Estado na vida do cidadão americano, tema central da eleição de novembro, também foi abordado pelos dois oradores que precederam Obama na noite seguinte: o senador John Kerry, que não impediu em 2004 a reeleição de George W.Bush, mas ofereceu tiradas saborosas (“Sarah Palin via a Rússia de sua casa e Mitt Romney fala do país como se só o tivesse visto em Rocky IV”), e o vice-presidente Joe Biden. Mas foi de Obama a argumentação mais eficaz sobre o tema: “Nós não acreditamos ser o governo capaz de resolver todos os nossos problemas. Mas também não o vemos como a causa de todos os nossos problemas, assim como os que se beneficiam dos programas sociais, as grandes corporações, os sindicatos, os imigrantes, os gays ou qualquer outro grupo apresentado como bode expiatório para nossos problemas.”

  

Aos 51 anos, cabelos acinzentados, usando um terno escuro quase fúnebre e sorrindo menos do que de costume, Barack Hussein Obama II fez questão de lembrar a seu eleitorado não ter vindo à convenção apenas como candidato, “mas como presidente dos EUA”. E a defesa de seus quatro anos de mandato, iniciados “em meio à maior crise financeira deste século, após a Grande Depressão” incluiu repetidas menções à captura de Osama bin Laden (“Vá perguntar a Osama se ele está melhor agora do que há quatro anos”, bravateou Kerry) e à salvação da indústria automobilística do meio-oeste.

Obama buscou se apresentar como um presidente duro em segurança nacional. “Meus oponentes são ‘neófitos’ em política externa e querem nos levar de volta a uma era de truculências e asneiras que nos custaram tanto. Você só diz que a Rússia é nosso inimigo número um quando sua cabeça ainda está presa à Guerra Fria. E você não está pronto para a diplomacia com a China quando não consegue fazer uma visita às Olimpíadas sem insultar nosso mais próximo aliado no planeta.” Mas não deixou de levar em conta o mapa eleitoral a ser desbravado em novembro.

“Se o presidente vencer nos estados do meio-oeste, em Ohio, Wisconsin e Michigan, seria virtualmente impossível para Romney conseguir os 270 votos necessários no colégio eleitoral para se eleger presidente”, afirmava, em frente a um de suas imensas e coloridas telas eletrônicas o comentarista da CNN John King. Os três estados concentram o grosso de trabalhadores da indústria automobilística. “Osama bin Laden está morto e a GM vive”, resumiu Biden.

A celebração de três dias de uma convenção marcada pelo retorno do ânimo dos militantes democratas não terminou com a apoteose programada. O discurso de Obama, como em Denver, Colorado, há quatro anos, seria feito em um estádio aberto, com capacidade para 65 mil pessoas, opção deixada de lado por conta do mau tempo.

A mensagem de esperança e mudança de 2008 foi substituída pelo pedido de mais tempo, ‘mais quatro anos’, como gritava a militância em coro, para se cristalizarem mudanças sociais de peso como a reforma da saúde pública. “Se você mudar de lado agora, se você comprar o cinismo de que a mudança pela qual lutamos não é possível, ela não acontecerá. Se você desistir da ideia de que sua voz pode fazer a diferença, outras vozes ocuparão o espaço: a dos lobistas, a das pessoas com 10 milhões de dólares que estão tentando comprar esta eleição e que estão querendo dificultar seu direito ao voto, a de políticos que querem decidir com quem você pode casar e controlar as maneiras pelas quais as mulheres podem escolher como cuidar de seu corpo”, disse o presidente.

“Faltou algo. Faltou o Obama que sonhava”, escreveu hoje na ‘Time’ o colunista Joel Klein. “O discurso foi correto. A alegria e empolgação da convenção democrata nos oferece muito mais do que a desgraça nacional do ódio e das fantasias ilegítimas sobre um Obama inexistente. Mas quero mais liderança deste presidente e este ainda é o sentimento da maioria do eleitorado americano”, completou.

Vitoriosos por pontos no espelho das convenções, os democratas augardam nesta sexta-feira 7 o impacto do novo índice de desemprego na corrida eleitoral e se preparam para o próximo round de uma batalha ainda indefinid: o primeiro debate presidencial, no dia 3 de outubro, na Universidade de Denver, no Colorado.

Por Eduardo Graça, de Nova York

A promessa da esperança virou práxis e foi exercida pelos cidadãos que me levaram à Casa Branca. Assim Barack Obama fechou os três dias de convenção do Partido Democrata com um discurso estratégico, distante de suas celebradas reflexões nos encontros nacionais de 2004 e 2008. A retórica seca, com poucas frases de efeito, traduzida como fria por parte dos analistas, trazia recado direto aos eleitores: “quem fez a mudança foram vocês”.

Em um tom distante do messianismo que marcou suas campanhas ao Congresso e à presidência, Obama citou Abraham Lincoln e disse saber que a trajetória por ele oferecida aos eleitores não é fácil ou de sucesso imediato: “Vocês não me elegeram para que eu dissesse aquilo que queriam escutar. Vocês me elegeram para que eu dissesse a verdade. E a verdade é que precisaremos de mais de um par de anos para resolver os problemas que vieram se acumulando nas últimas décadas.”

O chamamento para a responsabilidade dividida com os eleitores – em determinado momento Obama, acusado por seus rivais de padecer do vício da arrogância, chegou a insinuar que um voto na candidatura democrata equivalia a um ‘exercício de cidadania’ – acentuou o contraste de sua fala com a do outro presidente presente em carne e osso na festa governista.

Na noite anterior, Bill Clinton incendiara a TWC Arena com um discurso de quase uma hora em que estraçalhou a oposição, apresentada como elitista e em guerra contra a classe média e os trabalhadores. Seus seguidores mais próximos celebravam o que consideravam ser o melhor discurso do político sem cargo público com maior aprovação nos EUA.

Para os repórteres presentes na noite de quarta-feira 5 no estádio coberto de Charlotte, na Carolina da Norte, Clinton defendeu Obama de modo mais efetivo do que o próprio presidente em sua batalha contra Mitt Romney. “Nós acreditamos que ‘estamos juntos para o que der e vier’ é melhor do que ‘cada um na sua’”, disse, aplaudidíssimo.

O papel do Estado na vida do cidadão americano, tema central da eleição de novembro, também foi abordado pelos dois oradores que precederam Obama na noite seguinte: o senador John Kerry, que não impediu em 2004 a reeleição de George W.Bush, mas ofereceu tiradas saborosas (“Sarah Palin via a Rússia de sua casa e Mitt Romney fala do país como se só o tivesse visto em Rocky IV”), e o vice-presidente Joe Biden. Mas foi de Obama a argumentação mais eficaz sobre o tema: “Nós não acreditamos ser o governo capaz de resolver todos os nossos problemas. Mas também não o vemos como a causa de todos os nossos problemas, assim como os que se beneficiam dos programas sociais, as grandes corporações, os sindicatos, os imigrantes, os gays ou qualquer outro grupo apresentado como bode expiatório para nossos problemas.”

  

Aos 51 anos, cabelos acinzentados, usando um terno escuro quase fúnebre e sorrindo menos do que de costume, Barack Hussein Obama II fez questão de lembrar a seu eleitorado não ter vindo à convenção apenas como candidato, “mas como presidente dos EUA”. E a defesa de seus quatro anos de mandato, iniciados “em meio à maior crise financeira deste século, após a Grande Depressão” incluiu repetidas menções à captura de Osama bin Laden (“Vá perguntar a Osama se ele está melhor agora do que há quatro anos”, bravateou Kerry) e à salvação da indústria automobilística do meio-oeste.

Obama buscou se apresentar como um presidente duro em segurança nacional. “Meus oponentes são ‘neófitos’ em política externa e querem nos levar de volta a uma era de truculências e asneiras que nos custaram tanto. Você só diz que a Rússia é nosso inimigo número um quando sua cabeça ainda está presa à Guerra Fria. E você não está pronto para a diplomacia com a China quando não consegue fazer uma visita às Olimpíadas sem insultar nosso mais próximo aliado no planeta.” Mas não deixou de levar em conta o mapa eleitoral a ser desbravado em novembro.

“Se o presidente vencer nos estados do meio-oeste, em Ohio, Wisconsin e Michigan, seria virtualmente impossível para Romney conseguir os 270 votos necessários no colégio eleitoral para se eleger presidente”, afirmava, em frente a um de suas imensas e coloridas telas eletrônicas o comentarista da CNN John King. Os três estados concentram o grosso de trabalhadores da indústria automobilística. “Osama bin Laden está morto e a GM vive”, resumiu Biden.

A celebração de três dias de uma convenção marcada pelo retorno do ânimo dos militantes democratas não terminou com a apoteose programada. O discurso de Obama, como em Denver, Colorado, há quatro anos, seria feito em um estádio aberto, com capacidade para 65 mil pessoas, opção deixada de lado por conta do mau tempo.

A mensagem de esperança e mudança de 2008 foi substituída pelo pedido de mais tempo, ‘mais quatro anos’, como gritava a militância em coro, para se cristalizarem mudanças sociais de peso como a reforma da saúde pública. “Se você mudar de lado agora, se você comprar o cinismo de que a mudança pela qual lutamos não é possível, ela não acontecerá. Se você desistir da ideia de que sua voz pode fazer a diferença, outras vozes ocuparão o espaço: a dos lobistas, a das pessoas com 10 milhões de dólares que estão tentando comprar esta eleição e que estão querendo dificultar seu direito ao voto, a de políticos que querem decidir com quem você pode casar e controlar as maneiras pelas quais as mulheres podem escolher como cuidar de seu corpo”, disse o presidente.

“Faltou algo. Faltou o Obama que sonhava”, escreveu hoje na ‘Time’ o colunista Joel Klein. “O discurso foi correto. A alegria e empolgação da convenção democrata nos oferece muito mais do que a desgraça nacional do ódio e das fantasias ilegítimas sobre um Obama inexistente. Mas quero mais liderança deste presidente e este ainda é o sentimento da maioria do eleitorado americano”, completou.

Vitoriosos por pontos no espelho das convenções, os democratas augardam nesta sexta-feira 7 o impacto do novo índice de desemprego na corrida eleitoral e se preparam para o próximo round de uma batalha ainda indefinid: o primeiro debate presidencial, no dia 3 de outubro, na Universidade de Denver, no Colorado.

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