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Com Trump, analistas temem economia “volátil” e possível recessão

Antes do resultado das urnas, o jornal britânico The Guardian previu o reboliço nas Bolsas de Valores com a vitória do republicano

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Na segunda-feira 7, o diário britânico The Guardian antecipou a reação negativa do mercado financeiro com a eventual vitória de Donald Trump nas eleições norte-americanas – fato que se confirmaria na madrugada da quarta-feira 9, quando o republicano conquistou a maioria dos delegados e tornou-se o 45º presidente dos EUA. Na avaliação de diferentes analistas, o resultado pode arrastar a economia mundial para um período de forte volatilidade e, talvez, de recessão.

Por Suzanne McGee

Presidente Donald J. Trump. Imagine, se puder, começar o pregão da próxima quarta-feira com essas palavras ecoando nos seus ouvidos. É um cenário que deixa muitos investidores preocupados.

“Acho que temos de nos preparar para uma tremenda volatilidade e uma queda inicial do mercado”, disse Timothy Fisher, um advogado fiscal sediado em Nova York e um investidor com poupanças para sua aposentadoria investidas em ações e títulos. Aos olhos dele, esta eleição envolve ao mesmo tempo altos princípios políticos e discussões econômicas.

Assim como seus colegas, Fisher tem observado com ansiedade as alterações de último minuto nas pesquisas. Trump, afirma ele, simplesmente não seria um bom presidente para os mercados financeiros ou para os investidores – ou para a economia como um todo, já que sua abordagem antagônica a lidar com parceiros comerciais poderia reduzir os ganhos em exportações para as empresas americanas e prejudicar o PIB do país.

Fisher e outros estrategistas de investimentos e economistas têm queimado os neurônios ultimamente, analisando o que uma vitória de Trump significaria para os Estados Unidos. Sua resposta? Pense no Brexit e multiplique.

Centenas de economistas americanos que trabalham em instituições acadêmicas (incluindo vários prêmios Nobel) aconselharam a não votar em Trump, exatamente por causa do que eles chamaram em uma carta aberta de sua propensão a desinformar o eleitorado e promover “a ilusão proposital em vez do envolvimento com a realidade”.

Seria a versão americana do Brexit“, diz Mark Zandi, economista-chefe da Moody’s Analytics. A eleição do candidato republicano à Presidência seria, assim como o voto britânico pela saída da União Europeia, um acontecimento que “não é esperado, mas muito importante, enquanto também é muito incerto em termos do que significa exatamente para todos nós, hoje e no futuro”.

Como os mercados de ações detestam a incerteza acima de tudo, a reação inicial à vitória de Trump — assim como ao voto no Brexit — seria uma liquidação no mercado de ações. “Esse tipo de onda de vendas com impulso emocional poderia levar o mercado a perder entre 5% e 10% em algumas semanas ou alguns meses”, diz Jack Ablin, diretor de investimentos no BMO Private Bank.

Depois dessa votação, vimos uma espécie de rebote do Brexit, quando os investidores perceberam que a saída da Grã-Bretanha da União Europeia não aconteceria de um dia para o outro e que levaria anos para negociar um novo relacionamento com seus parceiros comerciais na Europa.

Mas os Estados Unidos são um tipo de animal diferente. É um mercado muito maior, por um lado: cerca de um quarto do PIB global e metade do valor de todas as ações negociadas no mundo são de empresas americanas, mudando de mãos nas Bolsas americanas.

Acrescente-se a isso o fato de que muitos investidores já fizeram grandes apostas em que a adversária democrata de Trump, Hillary Clinton, prevalecerá na eleição presidencial de terça-feira, e temos todos os ingredientes para um feio choque de mercado. O ponto de partida para uma liquidação na Bolsa poderá ser 10%, e poderá piorar a partir daí, sugerem alguns – e esse choque quase certamente seria global, repercutindo a partir do peso e do dólar canadense ao iene e aos mercados europeus.

Simon Johnson, um economista na Escola de Administração Sloan no MIT, afirmou que o tipo de “grande surpresa adversa” que a eleição de Trump representaria para o sistema, causando a quebra da Bolsa, poderá ser cataclísmico. Trump, cujas promessas de reforçar o crescimento econômico imediatamente entre 4% e 5% são “pura fantasia”, na opinião de Johnson, defendeu políticas anticomerciais que levariam a qualquer coisa menos crescimento, afirma o economista. E uma vitória de Trump? Bem, poderia ser suficiente para provocar uma recessão mundial, diz Johnson.

De todo modo, alguns investidores estão se preparando para o risco acentuado de uma presidência Trump, acumulando em seus portfólios dinheiro vivo, ouro e defesas contra o mercado americano, tais como títulos alemães. Eles fizeram isso conforme a situação política se fragilizou e Trump conseguiu estreitar a diferença nas pesquisas entre Clinton e ele, tornando mais provável uma presidência Trump.

Se ele realmente vencer, o choque imediato no mercado não é o único fator que esses investidores terão de considerar, porém.

“Em curto prazo, creio que uma administração Trump afetaria os investimentos em empresas e as decisões de contratação”, diz Zandi, que foi assessor do candidato presidencial republicano John McCain. “Ninguém tem certeza de que tipo de decisão política específica um presidente Trump tomaria, e as empresas fariam uma pausa até terem mais clareza. Isso desaceleraria o crescimento econômico.”

Em prazo mais longo, acrescenta Zandi, a previsão depende das opções que um presidente Trump faria. Que forma tomaria sua posição anti-imigração? Se Trump decidir implementar todas as suas políticas — deportar imigrantes sem documentos, construir um muro na fronteira mexicana –, poderia encolher a economia americana ou desencadear uma guerra comercial.

“É com isso que os mercados se preocuparão mais”, diz Stuart Hoffman, economista-chefe da PNC Financial Services. “Se impusermos tarifas ou cotas a produtos importados, nossos parceiros comerciais provavelmente retaliarão, e nossas exportações para esses países, como China e México, sofrerão.” Não haveria vencedores; o crescimento global seria desacelerado.

Trump prometeu que cortará impostos se for eleito, o que atrai os eleitores. Isso tem o potencial de dar ao setor de consumo pelo menos um rápido empurrão, na medida em que esses cortes fiscais forem suficientemente importantes para os contribuintes individuais, e se essas pessoas decidirem gastar seus proventos.

Mas Hoffman comenta que o plano fiscal de Trump é montado para beneficiar principalmente os americanos ricos. Muitos economistas acreditam que mudanças na política fiscal têm menos efeito nos gastos de famílias ricas. Há também a questão delicada de como Trump pagaria por esses cortes fiscais. “Ele não foi muito claro sobre como faria isso”, diz Hoffman. “Você simplesmente adota déficits mais altos? Seria uma negativa em longo prazo.”

Mas os investidores que enfrentarem uma liquidação de mercado induzida por Trump na manhã de quarta-feira não devem imaginar que não haja vantagens econômicas nessa eleição. Trump prometeu adotar uma abordagem leve à regulamentação das empresas – isso poderia ser bom para os lucros corporativos e para o preço das ações, quando o choque passar. “Muitas de suas ideias são políticas pró-mercado”, diz Ablin.

Se você treme diante da ideia de um presidente Trump, lembre-se de que parte do que ele é capaz de realizar será conduzida pela formação do Congresso. Ele não pode abolir sozinho tratados comerciais existentes, como o Nafta, entre os EUA, o Canadá e o México; ele poderá ver que lidar com o Congresso para aprovar algumas das medidas mais protecionistas que os investidores acham tão terríveis é muito mais difícil do que ele esperava.

A ideia de uma presidente Hillary Clinton é algo a que os investidores tiveram muito tempo para se acostumar, e as políticas da candidata democrata são claramente articuladas e hoje oferecem menos surpresas a qualquer um que tenha prestado atenção. Trump? Ele não traria nada além de surpresas, a começar pela incredulidade por sua vitória. Portanto, apertem os cintos – só por via das dúvidas.

Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves.

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