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Casa Branca e FBI, uma relação de ódio e amor

Demissão de James Comey por Donald Trump é um evento grave, mas revela antecedentes na relação entre presidentes e investigadores a eles subordinados

O ex-diretor do FBI James Comey
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A demissão do ex-diretor do Departamento Federal de Investigações (FBI) James Comey pelo presidente americano, Donald Trump, nesta quarta-feira (09/05), é mais um capítulo numa longa história de amor e ódio entre a Casa Branca e a agência federal de investigações americana.

Richard Nixon e Watergate

Após a demissão do diretor do FBI por Trump, vários congressistas democratas e diversos analistas traçaram logo paralelos com o ex-presidente Richard Nixon e o escândalo do Watergate, chamando o comportamento de Trump de “nixoniano”. Em outubro de 1973, o republicano Nixon demitiu o advogado-geral dos EUA, Archibald Cox, no infame Massacre da Noite de Sábado. Ele investigava acusações de que a escuta ilegal do Partido Democrata vinha da Casa Branca.

Com a demissão de Cox, Nixon esperava ver livrar seu nome do caso, mas o tiro saiu pela culatra. A ligação entre as escutas ilegais e a Casa Branca foi comprovada. Abriu-se então um processo de impeachment contra Nixon, do qual ele escapou ao renunciar, em 1974. Até agora, essa foi a única renúncia de um presidente na história americana.

Bill Clinton, o perdão de um sonegador e Monica Lewinsky

A favor da neutralidade de Comey pode-se dizer que, na campanha eleitoral, tanto o lado de Trump quanto o de Hillary Clinton o acusaram de parcialidade. Uma semana antes do pleito presidencial, no final de 2016, o FBI sob a administração de Comey publicou um relatório de investigação que comprometia a reputação do marido de Hillary, Bill Clinton.

Segundo o documento, em seu último dia como presidente, em janeiro de 2001, Clinton haveria perdoado o sonegador Marc Rich. Hoje já falecido, ele fugira para a Suíça e na época estava sendo procurado pelo FBI. O perdão levantou suspeita principalmente porque a ex-esposa de Rich havia concedido, anteriormente, uma grande doação ao Partido Democrata.

Poucos dias antes, Comey havia anunciado que retomara a investigação sobre o escândalo do correio eletrônico de Hillary devido a novos e-mails que vieram à tona, mas que ele não via nenhum motivo para uma queixa. Os democratas acusaram Comey de cumplicidade na derrota eleitoral de Hillary, mas o defenderam após a sua demissão por parte de Trump.

Num contexto diferente, Bill Clinton já havia vivenciado muito bem o que um investigador especial pode trazer à luz. Em 1994, o jurista Kenneth Starr foi encarregado de investigar o chamado escândalo imobiliário Whitewater, no qual o casal Clinton estava envolvido. Veio então à tona também o envolvimento de Bill Clinton com a estagiária Monica Lewinsky, o que quase levou ao fim de sua presidência.

Lyndon Johnson e a luta de Edgar Hoover contra ativistas de direitos civis

Nenhum outro diretor marcou tanto o FBI quanto John Edgar Hoover. Ele comandou a agência de investigações por quase meio século, de 1924 até a sua morte, em 1972. No pós-Guerra, Hoover simbolizou como ninguém a perseguição de comunistas e de pessoas que ele achava que fossem. Mais para o final de sua carreira, ele enfrentou problemas durante o governo dos presidentes John F. Kennedy e Lyndon Johnson. Era a época do movimento de direitos civis.

Hoover detestava o ativista negro Martin Luther King e nunca escondeu isso. As tentativas legislativas por parte de Johnson de melhorar a sorte dos pobres e, principalmente, os direitos dos afroamericanos foram sistematicamente boicotadas pelo FBI de Hoover, o que apenas se soube mais tarde.

Por fim acabaram vindo à tona documentos que mostravam que o FBI estava ocupado principalmente em vigiar grupos liberais e de esquerda. Hoover morreu antes que a dimensão do caso se tornasse pública, então só se pode especular se ele teria sido demitido do cargo. No entanto, a até então alta reputação da agência de investigações entre a população foi severamente abalada, pois ficou claro que o FBI se deixava instrumentalizar para fins políticos.

Warren Harding e o escândalo Daugherty Burns

O caso mais antigo não se refere a uma briga, mas à exagerada proximidade entre a Casa Branca e a agência federal de investigações: nos primórdios do FBI, que na época ainda se chamava Bureau of Investigation (BOI), um escândalo de corrupção ocupou as manchetes dos jornais, terminando na renúncia do secretário de Justiça, Harry Daugherty, e do diretor do BOI, William Burns.

Ao assumir o cargo em 1921, o presidente republicano Warren Harding levou para Washington um grande número de apoiadores fiéis de seu estado natal Ohio, dando-lhes postos na capital americana. Daugherty também pertencia ao círculo mais próximo de Harding.

Com o tempo, os ajudantes de Harding, incluindo o próprio presidente, ficaram cada vez mais sob suspeita de corrupção e encobrimento mútuo de fatos. Harding morreu em 1923, ainda no cargo. Sem o apoio da Casa Branca, a pressão sobre o pessoal do ex-presidente ficou cada vez maior. E, finalmente, quando se descobriu que Burns havia iniciado investigações secretas, por ordem do secretário Daugherty, sobre um senador democrata que queria revelar a corrupção entre os republicanos, tanto Burns quanto Daugherty tiveram que ir embora.

 

 

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