Mundo

Após eleições, saída para crise na Venezuela parece mais distante

Para diferentes analistas ouvidos pela AFP, a solução para a crise está não apenas mais distante, como o país tende a entrar em “um beco sem saída”

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, celebra vitória do chavismo nas eleições regionais da Venezuela
Apoie Siga-nos no

Por Maria Isabel Sanchez

A vitória do governo nas eleições regionais da Venezuela – não reconhecida pela oposição – afastou as chances de uma saída rápida da profunda crise política e econômica do país segundo analistas ouvidos pela AFP.

O presidente Nicolás Maduro proclamou a “vitória clara” de seu partido no pleito de domingo, com 17 estados, contra os cinco atribuídos pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) à oposição, do total de 23. Um deles ainda está em disputa.

Leia mais:
Para entender a Venezuela
Venezuela: como encarar a realidade

 

A Mesa da Unidade Democrática (MUD), que acusa o CNE de servir ao governo, não reconheceu os resultados e pediu uma “auditoria total” do processo. “Pedimos a nossos candidatos que participem das muitas atividades de rua em apoio”, expressou Gerardo Blyde, chefe de campanha opositor.

O governo estava à frente de 20 estados. Embora tenha perdido três, considera o resultado bem-sucedido. Todas as pesquisas apontavam a MUD como favorita em até 18 estados, em caso de participação eleitoral como a de domingo, que chegou a 61%. “Os resultados são absolutamente inconsistentes com todas as pesquisas que mostravam um chavismo em franca minoria”, disse à AFP o cientista político Edgard Gutiérrez, diretor da empresa Venebarómetro.

Realizada com um ano de atraso, a eleição aconteceu depois de dois meses de trégua após as marchas convocadas pela MUD para exigir a saída de Maduro. Esses eventos deixaram mais de 125 mortos entre abril e julho.

Radicalização

A eleição também era vista como uma oportunidade para a MUD mostrar sua força, nesse momento de incipientes aproximações para um diálogo com mediação internacional. “Agora, a via de negociação política entre governo e oposição para resgatar equilíbrios se rompe desastrosamente”, opinou o analista Luis Vicente León. “Diálogo não acredito. Entramos em uma situação muito delicada, o que se prevê é mais confrontação”, disse à AFP o cientista político Luis Salamanca.

León antecipa uma maior radicalização política do governo “para se proteger”, mas também podem se fortalecer os mais radicais da oposição – aqueles que se recusaram a ir votar, preferindo continuar nas ruas. “O chavismo está vivo, está na rua e está triunfante”, festejou Maduro, já pensando na eleição presidencial do fim de 2018.

A frustração e as divisões dificultam a consolidação da oposição, avalia o analista Diego Moya-Ocampos, do IHS Markit (Londres). “É fundamental acompanhar como ficarão os seguidores da MUD, e se seus dirigentes conseguirão ficar unidos, ou se será cada um no seu quadrado”, completou. “A opção de diálogo e a saída eleitoral estão cada vez mais distantes e, de novo, o protesto de rua e a comunidade internacional vão marcar a pauta”, comentou.

Isolamento

Maduro foi acusado por seus adversários e por alguns países de ter instaurado uma “ditadura” na Venezuela, agora com o apoio de uma Assembleia Nacional Constituinte, totalmente oficialista, eleita em 30 de julho passado.

A França expressou preocupação, ao considerar a “falta de transparência que afeta a confiança nos resultados”, segundo a Chancelaria francesa.

Já a chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, ressaltou que os resultados são “surpreendentes”, razão pela qual vê como necessário “averiguar o que aconteceu de verdade”.

Buscando legitimidade nacional e internacional, ele transformou essas eleições em uma validação de sua Constituinte, desconhecida pela MUD e por países da América e da Europa por considerá-la “fraudulenta” e “ilegal”.

Com a instalação desse órgão em agosto, previsto para permanecer em vigor até 2019, os Estados Unidos impuseram sanções econômicas à Venezuela, após sancionarem vários funcionários do governo, incluindo Maduro. “Sem sombra de dúvida, isso vai levar a mais sanções no curto prazo por parte da União Europeia e, sem dúvida, a um maior isolamento. Claramente, vai depender mais de China e Rússia”, disse Moya-Ocampos.

Hoje, a China destacou que o processo eleitoral foi “muito tranquilo” e afirmou que Pequim não interfere nos assuntos internos da Venezuela. “Acreditamos que o governo desse país seja capaz de administrar adequadamente seus assuntos internos no âmbito da lei e manter a estabilidade e a prosperidade”, declarou à imprensa o porta-voz do Ministério chinês das Relações Exteriores, Lu Kang.

Recentemente, Maduro se reuniu em Moscou com o presidente Vladimir Putin para tentar renegociar a dívida venezuelana.

Para diferentes analistas ouvidos pela AFP, a solução para a crise está não apenas mais distante, como o país tende a entrar em “um beco sem saída”, resumiu Salamanca. “Os riscos de conflito e de sanções transformam a Venezuela em um país desfavorável para os investidores“, comentou León, economista e presidente da Datanálisis. “A desconfiança em relação ao resgate de equilíbrios econômicos e ao isolamento nos leva a esperar um cenário de maior primitivização”, acrescentou.

 

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo