Esporte

A um ano dos Jogos Olímpicos, Tóquio tenta abafar escândalos

Acusações de corrupção, explosão de custos e violações trabalhistas ofuscam os preparativos para o evento esportivo na capital japonesa

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Quando o sol se põe, por estes dias, uma forma peculiar ilumina os céus de Tóquio, bem acima dos telhados. A Skytree, segundo edifício mais alto do mundo, com 634 metros de altura, brilha nas cores dos famosos cinco anéis olímpicos. O simbolismo é óbvio: não falta muito até o maior evento esportivo do mundo chegar à capital japonesa. A partir desta quarta-feira 24, falta exatamente um ano para os Jogos Olímpicos.

Na reta final até a data, o país anfitrião aparenta a maior tranquilidade possível. Já no início de julho, anunciava-se que cerca de 90% das novas obras estavam prontas. Ao visitar Tóquio em maio, os delegados do Comitê Olímpico Internacional (COI) elogiaram os progressos. O presidente da organização, Thomas Bach, já alardeava em 2018 não ter jamais visto uma cidade mais bem preparada. Ao que parece, está tudo sob controle.

A um ano da abertura do espetáculo esportivo, a missão máxima de Masa Takaya é preservar essa imagem. Numa tarde no início de julho, o porta-voz do comitê organizador observa, através da janela de um arranha-céu da zona portuária, as obras quase concluídas do Distrito Olímpico.

“Vão ser Jogos para todos. Todos devem se beneficiar”, promete, com ar concentrado. Só se essa meta for alcançada, se poderá falar que os Jogos Olímpicos foram um sucesso, diz. Há anos o triatleta amador é quem tem que encontrar respostas quando a imprensa faz perguntas incômodas sobre o torneio de duas semanas. E elas são muitas.

Compra de votos

O Ministério Público francês conduz há anos um inquérito contra Tsunekazu Takeda, por suspeita de ter comprado votos na eleição para os Jogos de 2020. Ele liderava a equipe de candidatura e permaneceu até o fim de junho no cargo de presidente do Comitê Olímpico Japonês.

Além de acusações de corrupção, os organizadores têm que encarar uma explosão dos gastos. No começo dos planejamentos, foram calculados custos de 6,6 bilhões de dólares, dos quais os contribuintes – anunciava-se com orgulho – não arcariam com nem um centavo.

Até que, três anos atrás, uma comissão convocada por Yuriko Koike, prefeita da capital, chegou a uma estimativa de até 30 bilhões de dólares, definitivamente onerando os cofres públicos. Como o endividamento estatal do Japão já passa de 200% do PIB, gerações inteiras terão que trabalhar para pagar a sobrecarga olímpica.

Masa Takaya destaca os benefícios em termos de infraestrutura. “Muitas das instalações já foram empregadas em 1964, e agora estão sendo modernizadas. Depois das Olimpíadas da época, elas enriqueceram a vida dos cidadãos por meio século. E estamos seguros que todos, idosos ou jovens, reconhecerão o valor dos Jogos Olímpicos.”

Mas a que preço? “Continuamos pensando que nenhuma verba de impostos deve ser empregada para cobrir os custos dos Jogos. Somos financiados por patrocinadores”, afirma Takaya.

“Para as reformas dos estádios, será mesmo necessário dinheiro de impostos. Mas não consideramos esses trabalhos como custos, e sim investimentos de que Tóquio se beneficiará por anos.” Depois do atual boom de construções, virá um boom de esportes, acredita o porta-voz do Comitê Olímpico.

Jornadas exaustivas e trabalhadores sem folga

Uma sombra também paira sobre as obras das instalações olímpicas. Em maio, a federação sindical Internacional dos Operários de Construções e Madeira (BWI, na sigla em inglês) publicou um relatório estarrecedor, segundo o qual os trabalhadores locais tinham jornadas de até 28 dias sem folga, e a metade deles trabalhava sem contrato. Alguns tinham que custear do próprio bolso os trajes de segurança, e já houve dois casos de morte.

Shinichi Ueyama, professor de administração pública da renomada Universidade Keiko, participou da comissão que apresentou a elevada estimativa de custos para os jogos. Meio satisfeito, ele afirma que graças às recomendações de seu comitê, o orçamento planejado foi reduzido de 30 bilhões para 20 bilhões de dólares.

 

“A maior parte dos cortes foi alcançada pela redução da capacidade do ginásio de natação e nos canteiros de obras”, diz.

Então o contribuinte será poupado, de algum modo? Ueyama ri: “Ninguém acredita nisso. Quem arca com toda a responsabilidade do financiamento, afinal, é o governo metropolitano de Tóquio.”

Portanto os cidadãos da capital não pagarão apenas pela construção dos estádios, mas também por despesas como ônibus shuttle, abastecimento elétrico e os uniformes dos voluntários durante os jogos.

Indagado se, mesmo assim, está feliz pela perspectiva dos Jogos Olímpicos, Ueyama faz uma pausa para pensar e diz: “Gosto de assistir a esportes.” Mas se uma cidade tão bem equipada como Tóquio realmente precisa das novas e caras instalações, ele não parece tão seguro assim.

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