Educação

6 serviços que você pode perder com os cortes nas universidades

Atendimento laboratorial, veterinário, apoio jurídico. Conheça alguns dos serviços prestados pelas universidades à sociedade brasileira

Foto: divulgação
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Os cortes orçamentários feitos pelo Ministério da Educação sobre as universidades federais devem atingir não só professores, alunos e funcionários, mas também as comunidades do entorno onde essas instituições chegam com atendimentos diversos: médicos, veterinários, psicológicos, apoio jurídico, fisioterapêuticos, entre outros, via projetos de extensão.

A manutenção dos cursos pode ser diretamente impactada pela incapacidade das universidades manterem em dia as suas despesas como água, luz, segurança, fornecimento de materiais e pagamento de funcionários terceirizados responsáveis, por exemplo, pela limpeza. Os atendimentos são feitos por alunos voluntários e também bolsistas, outro ponto de preocupação para as iniciativas. Algumas universidades já anunciaram um prazo máximo para conseguirem manter em dia os seus compromissos, caso o contingenciamento não seja revertido.

Os cursos de extensão, que possibilitam, entre outros aspectos, uma relação de diálogo entre as universidades e outros setores da sociedade, são citados no Plano Nacional de Educação como estratégia componente da meta 12, que prevê elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior. A política estabelece que as atividades acadêmicas de extensão façam parte de, no mínimo, 10% da carga horária curricular estudantil dos cursos de graduação. A inserção da extensão nos currículos é opcional na pós-graduação.

CartaCapital entrou em contato com a Universidade Federal do Paraná (UFPR), a Universidade de Brasília (UNB), a Universidade Federal da Bahia (UFBA), a Universidade Federal Fluminense (UFF), a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) para mapear alguns dos atendimentos significativos prestados às comunidades e entender os impactos em caso de descontinuidade.

1. Atendimento aos idosos

O campus Diadema da Unifesp, em São Paulo, mantém o programa Universidade Aberta para as Pessoas Idosas (UAPI), uma iniciativa que tem como objetivo inserir esse público na dinâmica da universidade. A iniciativa também acontece no campus Baixada Santista. Iniciativa similar é encontrada em muitas universidades federais pelo País.

Durante o período de um ano, idosos acima de 60 anos podem participar de aulas, palestras e vivências, que envolvem os temas atualidades, artes, saúde, recursos tecnológicos, psicologia e direitos, entre outros. O coordenador do programa em Diadema, Classius Ferreira da Silva, explica que os “poucos recursos” para a iniciativa são repassados pela pró-reitoria, mas que os impactos não são de todo descartados.  “Além da bolsa para os alunos que oferecem as atividades, precisamos de serviços de impressão e xerox para entregar materiais a eles”, conta, referindo-se aos 50 idosos que participam do programa no campus Diadema. Ferreira também cita a importância do transporte cedido pela universidade, que faz o transporte dos idosos e estudantes entre os cinco prédios do campus.

2. Análises clínicas e toxicológicas

Pelo menos 150 pacientes devem deixar de ser atendidos diariamente pelo Laboratório de Análises Clínicas e Toxicológicas (Lactfar) da Faculdade de Farmácia, localizado no campus Ondina da Universidade Federal da Bahia. A unidade realiza exames de sangue, fezes e urina, microbiológico e para diagnóstico de doenças autoimunes, de segunda a sexta, entre 7h e 15h. Por ano, 51 mil pessoas utilizam os serviços gratuitos.

A continuidade do laboratório está diretamente ligada à capacidade da universidade de manter em dia os serviços de manutenção predial e a vigência de contratos, caso de funcionários de limpeza que trabalham para manter a limpeza da unidade.

“Uma das funcionárias de limpeza da terceirizada é deslocada especificamente para manter o laboratório e banheiros limpos. O vigilante fica atento a qualquer distúrbio durante o atendimento e está pronto para auxiliar se necessário, principalmente porque iniciamos a distribuição de fichas antes das 7h. Sem água e energia, como iríamos funcionar?”, questiona a coordenadora do laboratório, Márcia Teixeira, farmacêutica e professora com experiência em parasitologia e imunologia.

Outro laboratório que pode ser impactado com os cortes é o de extensão do Labimuno, que fica no Instituto de Ciências da Saúde (ICS) da UFBA e atende a população gratuitamente, via SUS. Diariamente são distribuídas cerca de 200 senhas para pacientes da capital e de cidades pactuadas com a gestão SUS Salvador.

O Lactfar e o Labimuno somam mais de 1,3 milhão de exames para usuários do SUS em 2018.

3. Atendimento veterinário

A Escola de Veterinária da UFMG tem desde 2012 um projeto de castração direcionado a cães e gatos para a população vulnerável socioeconomicamente. A iniciativa também orienta a comunidade sobre o tema da guarda responsável e conscientiza sobre o não abandono.

O trabalho gratuito envolve triagem e cadastramento de animais, consultas, exames pré-cirúrgicos, castração e medicação para pós-operatório. O programa conta com a participação de docentes, alunos de graduação (bolsistas e voluntários), alunos de pós-graduação, residentes e médicos veterinários voluntários.

Para ter acesso à castração, os interessados precisam se encaixar a alguns critérios: comprovar renda familiar inferior a 3 salários mínimos; ser protetor independente que faz resgate dos animais e se tornam responsáveis pelos cuidados ou ONGs estabelecidas em Belo Horizonte e parceiras do projeto. Em 2016 e 2017, a iniciativa castrou, em cada ano, 590 animais; em 2018, 570 e, este ano, até o momento, 290.

4. Atendimento psicológico

A Universidade Federal do Paraná mantém o Centro de Psicologia Aplicada (CPA), ligado ao Departamento de Psicologia, que presta serviços nas áreas de psicoterapia individual, avaliação e reabilitação neuropsicológica para crianças, adultos e idosos, além outros atendimentos especializados como: situações de perda/luto, problemas relacionados ao uso de drogas e álcool, avaliação e reabilitação em traumatismo craniano e AVC, entre outros.

Segundo o CPA, grande parte do atendimento é de uma demanda reprimida da região de Curitiba: pessoas que não conseguem ser atendidas pelos Caps (Centros de Atenção Psicossocial) pela longas filas ou porque a terapia deles é apenas em grupo e não possibilita atendimento de casos mais delicados. A estimativa é que o centro realize cerca de mil atendimentos por ano.

No ano de 2018, foram realizados cerca de 3600 atendimentos, realizados pelos alunos da graduação do curso de psicologia da federal e supervisionados pelos professores-supervisores do Depsi (Departamento de Psicologia).

5. Apoio para migrantes e refugiados

Outro atendimento que pode ser impactado e também está sob a gestão da UFPR é o do Programa Política Migratória e Universidade Brasileira (Pmub) que presta atendimento à comunidade de migrantes e refugiados de Curitiba. O Programa é responsável pela aprovação de resoluções que possibilitam aos migrantes refugiados ou com visto humanitário retomar os estudos, revalidar diplomas e ingressar na Universidade por um processo seletivo  por meio do qual competem apenas entre si.

Além disso, contempla seis projetos de atendimento: Português Brasileiro para Migração Humanitária (PBMIH); Refúgio, Migrações e Hospitalidade; Capacitação em Informática para Imigrantes; Migração e Processos de Subjetivação; Migrantes no Paraná; Preconceito, Integração e Capital de Mobilidade; Oficina de História do Brasil para Estrangeiros.

Os projetos envolvem os cursos de Direito, Informática, Psicologia, Sociologia, Letras e o Centro de Línguas e Interculturalidade (Celin), além do Programa de Educação Tutorial (PET) História da UFPR. Participam do Pmub professores, servidores, pesquisadores e estudantes de graduação e pós-graduação. De acordo com a coordenadora, entre 2014 e 2018 cerca de 5 mil pessoas foram beneficiadas pelo Programa.

6. Defensoria pública

A UFBA também mantém o Serviço de Apoio Jurídico da Bahia (SAJU-BA), projeto de extensão criado em 1963, um dos mais antigos da Universidade, para prestar atendimento jurídico à sociedade. A iniciativa, totalmente gerida por estudantes e gratuita, é ligada à Faculdade de Direito da Universidade e funciona no mesmo prédio.

O projeto, formado por estudantes da graduação e advogados, se empenha no apoio jurídico popular, por meio de seus dois núcleos de trabalho: o Núcleo de Assistência, que atende a população hipossuficiente econômica de Salvador em suas demandas judiciais individuais, e o Núcleo de Assessoria Jurídica Popular, que atua com os movimentos sociais em demandas coletivas.

No atendimento individual, é constante o apoio em demandas de direito de família, a exemplo de pensão alimentícia e guarda de crianças, bem como em ações de defesa do consumidor e direito de vizinhança. Para ter acesso ao serviço, é necessário passar por uma triagem prévia, que checa a viabilidade jurídica do caso, bem como a hipossuficiência da pessoa que busca atendimento, critério essencial para se tornar assistido. Se admitido, o assistido é encaminhado para um dos plantões de atendimento, no qual serão colhidas as provas e relatos necessários para postulação em juízo. São admitidas causas iniciais ou já em andamento.

O membro associado do Saju e graduando em direito, Cauã Pereira, afirma que a continuidade do atendimento pode ser impactada caso a universidade não consiga cumprir com seus compromissos financeiros. “O corte de verbas prejudica o nosso funcionamento em diversos aspectos, como por exemplo: falta de segurança no Campus; ausência de materiais de papelaria, fornecidos pela Universidade; limpeza; e as possíveis faltas de energia que inviabilizariam o uso do espaço físico, ar-condicionado e computadores”, afirma.

O projeto conta com 223 membros. Em 2018, o plantão de triagem foi procurado por 893 pessoas e foram admitidos 488 casos novos.

Ufam, UFF e UNB

Em comunicado assinado pelo reitor Sylvio Puga, a Ufam declarou que os 38 milhões do orçamento foram desbloqueados. “Tal notícia assegura a continuidade das ações de Ensino, Pesquisa, Pós Graduação, Extensão, Inovação, Internacionalização e demais já programadas para 2019”, diz a nota.

A UFF declarou que não tem dados concretos sobre os impactos dos cortes. Já a UNB disse em nota que, do bloqueio de 31% do seu orçamento discricionário, não é possível estabelecer setores mais prejudicados. “Os recursos da Universidade não se destinam exclusivamente a cursos de graduação, sendo compartilhados também com cursos de pós-graduação stricto e lato senso, além de pesquisa e extensão, a exemplo do atendimento oferecido à comunidade pelos hospitais”.

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