Economia

Por que o erro no cálculo de entrada de capital estrangeiro na bolsa é absurdo?

Dados revisados mostram que não houve entrada de 71 bilhões de reais em 2021, mas uma saída de 7,2 bilhões em capital estrangeiro

Foto: Divulgação/B3
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Existe uma premissa básica na teoria financeira moderna, que chamamos de hipótese do mercado eficiente. Em síntese, ela diz que, num mercado eficiente, os preços refletem plenamente todas as informações disponíveis que são relevantes para estimar os retornos futuros de um certo ativo. Isso significa que o mercado irá precificar, na medida do possível e de forma racional, todas as informações relevantes. De resto, oscilações de preço são imprevisíveis.

Essa pequena premissa serve para contextualizar o tamanho do erro cometido pela B3, que atualmente é a única bolsa de valores brasileira, com relação ao fluxo de capital estrangeiro no ano de 2021. Por causa de um erro metodológico primário, a entrada de capital na bolsa, que havia sido divulgada como uma entrada de cerca de 70 bilhões de reais, foi revisada para uma saída de 7,2 bilhões de reais.

E por que se trata de um erro metodológico, como disse, primário? Porque empréstimos de ação, que são uma operação absolutamente comum, que não implicam em entrada adicional de capital, estavam sendo contabilizadas como tal. A partir daí, é possível ter uma noção do tamanho do rombo e do impacto que, na prática, foi gerado no mercado nacional. Não foi, como no caso de 2022, um erro de 30% menos capital estrangeiro entrando. Foi um erro de mais de 100% do total.

Pelas informações disponíveis na mídia especializada, clientes e outras instituições foram responsáveis por informar a B3 do erro nos cálculos, o que faz sentido. Isso porque, em geral, grandes instituições e agentes de mercado fazem levantamentos próprios para investirem, o que acaba por gerar o efeito subjacente de confirmar – ou, neste caso, contestar – aquelas emitidas por uma entidade como a B3.

Isso faz sentido porque, como disse no início do texto, informações como essa são cruciais para decisões de investimento e está no interesse do mercado, como um todo, ter acesso aos dados mais corretos quanto possível. Acontece que, por outro lado, muita gente só veio a descobrir essa discrepância agora, num momento em que o Ibovespa está beirando os 110 mil pontos, em discrepância total com praticamente todos os outros índices acionários do planeta que operam em baixa no acumulado do ano.

Numa comparação nominal, isto é, sem comparar o efeito do câmbio, o Ibovespa acumula uma alta de 4,3%, ao passo que o S&P 500 (Estados Unidos) amarga -17,4%, o Euro Stoxx 50 (União Europeia) perde 14,3%, a Nikkei (Japão) perde 6,2% e o FTSE 100 (Reino Unido) 0,3%. Por sua vez, o indiano Nifty 50 cede 6,57%; o KOSPI, da Coreia do Sul, acumula -11% e o China A50, um total de -14,6%.

Uma parte considerável da alta do Ibovespa pode, assim, estar relacionada ao erro de cálculo da própria B3, que competia com a estranha subida de um índice acionário com peso muito concentrado em commodities. Sim, parte disso era explicado pela pressão de oferta em vista de fatores geopolíticos, como o conflito entre Rússia e Ucrânia, mas outras bolsas pesadas em commodities não viram incrementos como o do Ibovespa.

Parte disso deriva do medo de um cenário de estagflação global, isto é, alta de preços sem crescimento econômico. Com isso, ainda que o preço das commodities suba, não há demanda porque não há atividade produtiva, pois não há consumo de bens industrializados na ponta. Entretanto, em vista da suposta entrada de capital estrangeiro em peso no Brasil, investidores/as comuns, assim como institucionais, podem ter adotado uma exposição ao risco muito maior do que deveriam sob a impressão de estarem numa situação “excepcional”.

Não foi o caso, e o impacto que um erro dessa magnitude irá gerar nos retornos futuros de quem entrou com peso na bolsa brasileira deverá ser sentido nos meses subsequentes. Isso, lembrando ainda da volatilidade acentuada que observamos em eleições, especialmente quando tumultuadas por ameaças golpistas e um cenário econômico de calamidade pública. Como diz o ditado, Brasil não é pra amadores/as.

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