Economia

Petrobras: melhora do cenário externo e reversão estratégica do refino

É o que indicam os resultados financeiros do segundo trimestre

Ivan Monteiro, presidente da Petrobras, anuncia os resultados financeiros
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A Petrobras divulgou nesta sexta-feira 3 os resultados consolidados do segundo trimestre de 2018. Instituições do mercado financeiro estimaram que o lucro líquido da companhia ficaria entre 6,5 bilhões e 7,5 bilhões de reais, mas ficou acima do esperado, em 10,1 bilhões.

O desempenho deve-se basicamente a dois fatores: a melhora das condições do setor de exploração e produção, com elevação do preço do barril internacional e queda dos custos de extração, e a reversão abrupta da política do refino (deslocamento das importações para terceiros e redução da carga processada das refinarias), praticada até maio de 2018, quando eclodiu as greves de caminhoneiros e petroleiros.

Em relação à exploração, a sua receita de vendas aumentou 19% em relação ao trimestre anterior. Esse aumento foi decorrente basicamente do aumento de 24% do preço do barril internacional do petróleo, associado à desvalorização cambial.

Mesmo com esse resultado positivo das receitas, associado à  redução de 7% do custo de extração de 11,5 dólares para 10,7, relativos basicamente à excelente produtividade do pré-sal, o lucro líquido do segmento cresceu apenas 1%. Isso pode ser explicado pelas maiores despesas como poços secos e com a base de comparação dos lucros do primeiro trimestre do ano, que foram influenciadas por receitas não-recorrentes (venda de ativos).

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Além disso, esse resultado, aquém do esperado, reflete, em termos estruturais, uma equivocada estratégia de desinvestimentos da companhia, sobretudo na Bacia de Campos. Com isso, apesar da trajetória crescente da produção do pré-sal desde sua descoberta, a produção da Petrobras caiu neste trimestre em relação ao anterior, em boa medida pela venda de blocos de produção.

Um exemplo desse processo foi a venda de 25% de Carcará para a Equinor (ex-Statoil) por 2,4 bilhões de dólares, que, embora tenha internalizado recursos imediatos para a companhia, transferiu definitivamente uma parcela da produção da Bacia de Campos para a empresa norueguesa. Não por acaso, a produção da Equinor cresceu 72% entre março e junho de 2018, colocando-a como a segunda maior produtora do País.

Apesar do impacto positivo da exploração, sem dúvida a mudança mais abrupta dos resultados deste trimestre ocorreu no abastecimento, onde os lucros cresceram 72% em relação ao trimestre anterior (2,2 bilhões de reais a mais), e são resultados de uma mudança na estratégia do refino.

Primeiro, observou-se um aumento significativo do fator de utilização do parque de refino da Petrobras, que saiu de 72% para 81% entre os dois últimos trimestres sem que isso significasse aumento de custos – como argumentado pela Petrobras para justificar a enorme capacidade ociosa durante a greve dos caminhoneiros. Ao contrário, estes caíram de 2,96 para 2,36 dólares.

Segundo, notou-se um forte crescimento das importações de derivados (97%), o que significa que a Petrobras tem buscado reassumir o controle da distribuição de derivados no mercado interno, deslocando as importadoras.

Como efeito dessas duas medidas, o volume de vendas cresceu 9% (subiu de 1.648 para 1.791 mil barris/dia), ampliando tanto o market share quanto a margem da companhia no abastecimento.

Essa reversão estratégica no refino reforça a avaliação dos pesquisadores do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Zé Eduardo Dutra sobre o equívoco da política de refino da Petrobras.

Em recente texto publicado nesta mesma CartaCapital, lembramos que a opção da Petrobras subutilizava as “suas refinarias e favorecia a entrada dos importadores. Em 2013, a Petrobras utilizava praticamente 100% do seu parque de refino e, em 2017, esse percentual caiu para 76%. Com isso, uma parcela substancial do mercado interno (vinha sendo) suprida com importações. Com a enxurrada de importações (que já detém por 24% do mercado interno), a Petrobras ficava refém de uma política de preço atrelada ao mercado externo. (…) e abdicava de sua posição de price maker (formador de preço) – que lhe possibilitava mantém maiores margens – para adotar uma posição de price taker (tomador de preço)”.

Além disso, desmistifica as justificativas da gestão da Petrobras de que a redução do nível de utilização das refinarias estaria relacionada a uma questão técnica associada à diferença entre as capacidades de destilação e das unidades de conversão (craqueamento e coqueamento).

Quanto maior essa diferença, menores os ganhos com a ampliação do refino. Esse elemento técnico das refinarias existe, mas ele, por si, não explicava o nível de utilização total do parque de refino no primeiro trimestre de 2018, ainda menos das refinarias que foram colocadas à venda pela empresa.

O Ineep recentemente mostrou que em algumas refinarias, como Landulpho Alves-Mataripe, na Bahia, as unidades de conversão não estavam com nível de utilização similar às de destilação. 

Os dados são incontestáveis de que houve uma revisão da estratégia anterior e os resultados refletem o aumento do controle do mercado de abastecimento, central para a geração de caixa da Petrobras.

Ou seja, existia um equívoco entre o mix da política de preços da Petrobras (variações nos preços dos derivados nas refinarias e alinhamento internacional) e a estratégia para o refino (variações na quantidade processada nas refinarias), que não maximizava a geração de caixa, criando artificialmente capacidade ociosa.

Das duas uma: ou a Petrobras estava adotando uma estratégia sui generis de não competir e não participar pelo seu mercado ou estava ocorrendo um erro gerencial de alocação ineficiente dos recursos produtivos da empresa.

Por fim, deve-se ressaltar que, novamente alertado pelo Ineep, a estratégia para a gestão da dívida tem sido orientada, cada vez mais, para um alongamento dos passivos do que para uma redução draconiana do endividamento.

Neste trimestre, as dívidas foram reduzidas em apenas 2% em relação ao anterior (de 360,7 bilhões para 352,9 bilhões de reais). E houve uma clara realocação temporal das mesmas. As dívidas com vencimento em 2019, por exemplo, foram diminuídas em 53%, ao passo que aquelas com vencimento depois de 2023 cresceram 23%.

Esses resultados operacionais e financeiros evidenciam uma melhora do cenário externo para a Petrobras (aumento do preço do Brent), a importância do refino para a geração de caixa da empresa e melhora no perfil da dívida.

Nesse novo contexto, qual seria o sentido de continuar com uma estratégia de desalavancagem tão acelerada que implicaria em continuar vendendo ativos, inclusive campos do pré-sal e refinarias, fundamentais para geração de caixa presente e futura da Petrobras, como observado nos resultados no balanço desse trimestre.   

* Rodrigo Leão é mestre em desenvolvimento econômico (IE/UNICAMP). Atualmente, é Diretor técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Zé Eduardo Dutra (INEEP) e pesquisador visitante do NEC-UFBA. E-mail: [email protected]

Eduardo Costa Pinto é professor do Instituto de Economia da UFRJ e integrante do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Zé Eduardo Dutra (INEEP) E-mail: [email protected].

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