Economia

13 pontos que mostram a fragilidade dos planos de Paulo Guedes

O plano do governo não para em pé e nem merece esse nome, mostra a análise das medidas anunciadas para a economia

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O plano do governo não para em pé e nem merece esse nome, deixa claro a análise das medidas anunciadas para a economia desenvolvida a partir de comentários da professora Esther Dweck, da UFRJ, com contribuições de outros economistas. Veja abaxo:

Medidas de curto prazo

Liberação do FGTS e do PIS-Pasep

É a medida que teria efeito mais positivo, mas o total que vai ser liberado até o fim de 2020, de 42 bilhões de reais (0,4% do PIB), é muito pequeno para estimular uma economia do tamanho da brasileira,  isso na suposição de que todo esse volume de saque seja feito e de que as pessoas utilizem todo esse recurso para consumo, o que não é uma hipótese realista, ao contrário. A maior parte desses recursos deve ser canalizada para pagamento de dívidas.

Queda da taxa Selic

A esperada redução da taxa de juros seria muito mais uma consequência da estagnação em que o País se encontra e não tem o papel de estimular a economia por vários motivos. Mesmo que afete as taxas efetivamente cobradas das pessoas pelos bancos na ponta isso não é suficiente para levar alguém a tomar crédito. No caso dos empresários, não há motivo para investir porque a capacidade ociosa é gigantesca. No caso dos consumidores, eles teriam de se endividar novamente para aumentar o consumo, o que também não parece provável num cenário de alto desemprego, baixa perspectiva de crescimento dos salários e desproteção, no caso de aprovação da reforma da Previdência. Não parece uma situação em que as pessoas vão se endividar e o efeito da redução não tende, portanto, a ser significativo.  

Liberação do compulsório 

A liberação do compulsório não vai virar crédito e assim é totalmente ineficaz para dinamizar a economia. Esse dinheiro, na prática, torna-se dívida compromissada. Os bancos deixam de ter a obrigação de manter reservas no BC que não rendem juros e compram títulos públicos.

Medidas de médio-prazo

Governo digital 

Quanto mais digitalizado for o governo, mais eficiente se torna, mas isso não é uma medida de estímulo econômico que de alguma maneira ajudasse a economia a voltar a crescer. 

Reforma tributária 

É uma das reformas mais necessárias, mas da maneira que está sendo proposta tem vários problemas, a começar pelo fato de preocupar-se exclusivamente com a redução da quantidade de impostos indiretos e tentar unificá-los em um único imposto. Para a economia é positivo diminuir a complicação tributária, mas não é uma mudança significativa para a retomada do crescimento. Se reduzisse os impostos dos mais pobres ou aumentasse os dos mais ricos e o governo utilizasse esse dinheiro efetivamente na economia, teria um potencial enorme e seria positiva para o crescimento.  

Medida provisória da liberdade econômica 

Mistura questões pragmáticas de desburocratização e digitalização processual, facilitação de operações financeiras e ataques a direitos trabalhistas que ainda sobreviveram e ao fundo soberano, absurdamente incluído na lista. O viés de desequilíbrio em favor das empresas e bancos é tão explícito que o governo chega a propor, simultaneamente, condições mais rigorosas para que proprietários sejam responsabilizados juridicamente e que as garantias, em caso de inadimplência, sejam mais facilmente executáveis.  

Privatizações 

Vender ativos rentáveis implica a perda de potencial de geração de renda no futuro, mas é mais do que isso porque com as estatais o potencial de acelerar o crescimento é muito maior, o governo tem mais capacidade de participar das decisões e pode de fato ajudar a coordenar os investimentos na economia. Quando se privatiza e, no caso do Brasil, quando se desnacionaliza, há risco enorme, como tende a acontecer com a Embraer, de a empresa simplesmente sair do País. A parte em que o governo está de olho, do dinheiro que vai entrar em caixa, é também um encaminhamento completamente equivocado. As receitas do governo estão muito baixas e tenta-se tapar o buraco por meio da venda de um ativo e geração de receita só uma vez, esse dinheiro não volta no ano seguinte. Não se resolve problema fiscal dessa maneira. No curto prazo, o governo tende a simplesmente guardar ou usar esse dinheiro para pagar juros da dívida. Não gera estímulo econômico. 

Reforma da Previdência 

Seus efeitos a curto prazo são nulos, a longo prazo reduz a renda das classes B, C e D. Seus benefícios são aumentar a garantia do mercado financeiro para a solvência da dívida pública, o que não induz a crescimento por si. É economicamente neutra porque trata de redistribuição de renda já produzida. A economia se dará basicamente sobre os mais pobres, as mega-aposentadorias extrateto das corporações mal foram tocadas. Na prática, a reforma retira renda que iria para o consumo e a direciona para o mercado financeiro detentor da dívida pública. Seu efeito é contracionista da demanda.

Medidas de longo prazo

Lei do saneamento 

Assim como no caso da reforma da Previdência, em que o modelo de capitalização foi proposto sem qualquer análise sólida sobre os impactos sociais, ou mesmo os custos fiscais de transição, a ideia de privatização do setores de saneamento básico afronta análises sólidas sobre as experiências já realizadas. Na América do Sul, os casos boliviano e argentino de privatizações em água e esgoto foram marcados por crescimento significativo do custos ao consumidor, afetando a população mais carente.

Reforma do funcionalismo 

Terá apenas viés recessivo se contemplar a destruição de direitos e garantias de amplas e sacrificadas categorias do funcionalismo público federal, sem atacar os privilégios de determinadas categorias privilegiadas e bem posicionadas politicamente. É questionável se a retirada da estabilidade e demais propostas asseguram uma maior capacidade de atuação do setor público. Ainda mais com a sinalização do ministro Paulo Guedes, de que não se admitirá nenhum funcionário nos próximos anos e vai-se simplesmente digitalizar. Os reflexos serão graves em especial na educação e na saúde, intensivas em pessoal.  

Pacto federativo 

O País precisa contemplar uma revisão da dívida dos estados e de alguns municípios grandes com dívidas impagáveis e que foram por anos corrigidas por indexadores absurdos, muito acima da taxa Selic, o que fez com que a dívida explodisse, ainda mais durante a recessão que atingiu especialmente alguns estados, como o Rio de Janeiro. É necessário propor um pacto de recuperação da economia como um todo, em que os estados e os municípios tenham um papel atuante. Com a simples descentralização de recursos sem ampliação e renegociação efetiva das dívidas que não se limite ao que foi feito, que é adiar em três anos para depois a bomba explodir no colo do próximo governante, os estados não terão capacidade efetiva de retomar a economia. É preciso discutir também o Fundeb para aumentar os recursos para a educação e que poderiam entrar na discussão do pacto federativo. Não se vê isso pensado em conjunto. Parece também pouco provável que o presidente Bolsonaro abandone sua estratégia de confronto com os governadores e instituições para uma composição política na base da descentralização de recursos. 

Mercado secundário de renda fixa e revisão da garantias financeiras

Estão associados à ideia de que para baixar os spreads na economia há necessidade de uma grande reforma do sistema financeiro e de que estimular o mercado secundário de renda fixa e melhorar as garantias vai automaticamente se converter em redução dos spreads bancários. As propostas não contemplam o problema da excessiva concentração bancária, que faz com que o Brasil tenha spreads absurdamente altos comparados aos de qualquer outro país. Não têm potencial de puxar o crescimento econômico.

Acordos comerciais 

O Brasil está abandonando uma estratégia de aliança com países mais próximos do ponto de vista da estrutura produtiva e com os quais seria possível maior maior soberania e protagonismo para aliar-se à Europa, que fez o acordo com o Mercosul numa tentativa de reduzir os efeitos da guerra comercial China versus EUA. O tratado é muito mais benéfico à Europa do que ao Brasil. É lamentável também voltar, de uma maneira piorada, à discussão da Alca de forma totalmente subordinada aos Estados Unidos. Opta-se nesses acordos comerciais por uma inserção subordinada sem ganhos claros, o que do ponto de vista de desenvolvimento econômico é bastante questionável, ainda mais no momento em que o País está com a estrutura produtiva fragilizada e o mundo passa por guerra comercial e protecionismo.

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