Cultura

Todo tempo é bom

“Meu pai ficava furioso quando eu colocava o Jimmy Hendrix na vitrola. Ele gostava mesmo era do vozeirão do Nelson Gonçalves”

"Meu pai ficava furioso quando eu colocava o Jimmy Hendrix na vitrola. Ele gostava mesmo era do vozeirão do Nelson Gonçalves".
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Passei a minha infância inteira ouvindo uma ladainha do meu pai.

– O meu tempo é que era bom!

Tudo na época do meu pai parecia ser bom, uma maravilha. Os carrinhos de madeira que ele mesmo fabricava, os biscoitinhos de nata que a mãe dele fazia, o programa Aeiourca, o César de Alencar no rádio, as viagens nas asas da Panair, os bailes no Cassino da Pampulha, o velho e bom Studebaker, o Tesouro da Juventude, a folha seca do Didi e até mesmo a Coca-Cola que vinha num vidro chamado tamanho família.

Definitivamente o meu pai não gostava da minha época e achava que o mundo se não tinha acabado, estava perdido. Ele abria a porta do meu quarto para pedir um som mais baixo e falava sério.

– Esse John Lennon pra conversar comigo tem de primeiro cortar o cabelo, fazer a barba e tomar um bom banho!

O meu pai não gostava de nada, absolutamente nada da minha época. Ficava horrorizado ao ver os meus carrinhos de plástico,  a minha calça americana, o meu cabelo como a juba de um leão, eu de botinha sem meia e sem espelho para me pentear. Ele não gostava do Caetano cantando “É proibido proibir”, do Jorge Ben dizendo “mó num pá tropi’’ e muito menos do Ronnie Von jogando o cabelo para trás e cantando “meu bem…”

O meu pai era um cara que não amava os Beatles nem os Rolling Stones. Ficava furioso quando eu colocava um Jimi Hendrix na vitrola solando “Spanish Castle Magic” ou até mesmo um Simon e Garfunkel cantando “The Sound of Silence”.  Ele odiava o Grateful Dead, The Who, The Doors, The Monkees, o Deep Purple , o Black Sabbath. Não gostava dos Mamas & Papas, do Peter, do Paul e tampouco da Mary.

O meu pai gostava mesmo era do vozeirão do Nelson Gonçalves, da elegância do Mario Reis, da bossa do Lucio Alves, da Ângela Maria, da Emilinha, do violão do Dilermando Reis, dos forrós e dos xaxados do Luiz Gonzaga.

Últimas crônicas de Alberto Villas:

Confesso que tem dias que sinto uma saudadezinha dos  Hermans Hermits cantando “No Milk Today”, do Johnny Rivers cantando “Do You Want a Dance”, do Plinio Marcos e do Luiz Gustavo na novela Beto Rockfeller, dos porquinhos das Casas da Banha dançando num anúncio na TV, do seriado Papai Sabe Tudo, da banana split da lanchonete das Lojas Americanas, dos soldadinhos que vinham dentro do vidro de Toddy. Sinto saudade até mesmo do bicho da goiaba, do Kolynos com clorofila e da garrafa marrom do Crush.

Mas confesso também que adoro o Paulinho da Viola cantando “Eu sou assim, quem quiser gostar de mim eu sou assim. Meu mundo é hoje não existe amanhã pra mim”.  Pensando aqui com os meus botões chego a conclusão que o mundo é mesmo hoje. Por mais desumano que possa estar, acho que não tem mais volta. Não tem mais como viver sem um caixa 24 horas,  sem internet, sem e-ticket, sem celular, sem Amazon ponto com.

Sei que os mais saudosistas vão pensar com seus colchetes que é possível sim viver sem caixa 24 horas, sem internet, sem e-ticket, sem celular e sem Amazom ponto com. Mas eu sinceramente não abro mão dessas coisas de hoje. Adoro Chegadas e Partidas no GNT, ler o Libération no Ipad, postar uma foto no Instagram, enviar minha crônica pra Carta Capital por e-mail, fazer check-in pela internet, saber o saldo via banking phone mesmo quando ele está negativo.

Gosto de ouvir Karina Buhr, Tiê, Tulipa Ruiz, Marcia Castro, Rodrigo Campos, Caê Rolfsen, o primeiro cd do grupo Terno, o segundo da Trupe Chá de Boldo e a Laura Lavieri cantando no disco do Jeneci. Eu, Paulinho, também sou assim, quem quiser gostar de mim eu sou assim. Meu mundo é hoje não existe amanhã pra mim.  A única dúvida que tenho, sinceramente, é se amanhã, lá pelo ano 2020, 2025 alguém vai sentir saudade do lanchinho da Gol, da voz do telemarketing,  do BBB, da Sandy, do Junior, da banda Restart  ou da tal “Ai se eu te pego” na voz do Michel Teló.

Passei a minha infância inteira ouvindo uma ladainha do meu pai.

– O meu tempo é que era bom!

Tudo na época do meu pai parecia ser bom, uma maravilha. Os carrinhos de madeira que ele mesmo fabricava, os biscoitinhos de nata que a mãe dele fazia, o programa Aeiourca, o César de Alencar no rádio, as viagens nas asas da Panair, os bailes no Cassino da Pampulha, o velho e bom Studebaker, o Tesouro da Juventude, a folha seca do Didi e até mesmo a Coca-Cola que vinha num vidro chamado tamanho família.

Definitivamente o meu pai não gostava da minha época e achava que o mundo se não tinha acabado, estava perdido. Ele abria a porta do meu quarto para pedir um som mais baixo e falava sério.

– Esse John Lennon pra conversar comigo tem de primeiro cortar o cabelo, fazer a barba e tomar um bom banho!

O meu pai não gostava de nada, absolutamente nada da minha época. Ficava horrorizado ao ver os meus carrinhos de plástico,  a minha calça americana, o meu cabelo como a juba de um leão, eu de botinha sem meia e sem espelho para me pentear. Ele não gostava do Caetano cantando “É proibido proibir”, do Jorge Ben dizendo “mó num pá tropi’’ e muito menos do Ronnie Von jogando o cabelo para trás e cantando “meu bem…”

O meu pai era um cara que não amava os Beatles nem os Rolling Stones. Ficava furioso quando eu colocava um Jimi Hendrix na vitrola solando “Spanish Castle Magic” ou até mesmo um Simon e Garfunkel cantando “The Sound of Silence”.  Ele odiava o Grateful Dead, The Who, The Doors, The Monkees, o Deep Purple , o Black Sabbath. Não gostava dos Mamas & Papas, do Peter, do Paul e tampouco da Mary.

O meu pai gostava mesmo era do vozeirão do Nelson Gonçalves, da elegância do Mario Reis, da bossa do Lucio Alves, da Ângela Maria, da Emilinha, do violão do Dilermando Reis, dos forrós e dos xaxados do Luiz Gonzaga.

Últimas crônicas de Alberto Villas:

Confesso que tem dias que sinto uma saudadezinha dos  Hermans Hermits cantando “No Milk Today”, do Johnny Rivers cantando “Do You Want a Dance”, do Plinio Marcos e do Luiz Gustavo na novela Beto Rockfeller, dos porquinhos das Casas da Banha dançando num anúncio na TV, do seriado Papai Sabe Tudo, da banana split da lanchonete das Lojas Americanas, dos soldadinhos que vinham dentro do vidro de Toddy. Sinto saudade até mesmo do bicho da goiaba, do Kolynos com clorofila e da garrafa marrom do Crush.

Mas confesso também que adoro o Paulinho da Viola cantando “Eu sou assim, quem quiser gostar de mim eu sou assim. Meu mundo é hoje não existe amanhã pra mim”.  Pensando aqui com os meus botões chego a conclusão que o mundo é mesmo hoje. Por mais desumano que possa estar, acho que não tem mais volta. Não tem mais como viver sem um caixa 24 horas,  sem internet, sem e-ticket, sem celular, sem Amazon ponto com.

Sei que os mais saudosistas vão pensar com seus colchetes que é possível sim viver sem caixa 24 horas, sem internet, sem e-ticket, sem celular e sem Amazom ponto com. Mas eu sinceramente não abro mão dessas coisas de hoje. Adoro Chegadas e Partidas no GNT, ler o Libération no Ipad, postar uma foto no Instagram, enviar minha crônica pra Carta Capital por e-mail, fazer check-in pela internet, saber o saldo via banking phone mesmo quando ele está negativo.

Gosto de ouvir Karina Buhr, Tiê, Tulipa Ruiz, Marcia Castro, Rodrigo Campos, Caê Rolfsen, o primeiro cd do grupo Terno, o segundo da Trupe Chá de Boldo e a Laura Lavieri cantando no disco do Jeneci. Eu, Paulinho, também sou assim, quem quiser gostar de mim eu sou assim. Meu mundo é hoje não existe amanhã pra mim.  A única dúvida que tenho, sinceramente, é se amanhã, lá pelo ano 2020, 2025 alguém vai sentir saudade do lanchinho da Gol, da voz do telemarketing,  do BBB, da Sandy, do Junior, da banda Restart  ou da tal “Ai se eu te pego” na voz do Michel Teló.

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