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‘O centro democrático no Brasil se chama Lula’, diz Ricardo Coutinho, de volta ao PT

O povo nordestino é politizado, tanto que “não seguiu a boiada” em 2018, lembra o ex-governador da Paraíba

“O PSB precisa se reencontrar com sua história”, diz Coutinho. (FOTO: Wanezza Soares)
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O ex-governador da Paraíba, Ricardo Coutinho, está de volta às suas origens. Depois de trocar o PT pelo PSB, partido pelo qual se elegeu prefeito de João Pessoa e governador do estado, ele está de malas prontas para retornar às hostes petistas. Em entrevista a CartaCapital, Coutinho fala sobre o caminho de volta, o desejo de ver o PSB no palanque de Lula em 2022 e defende uma frente ampla para derrotar o bolsonarismo, desde que ela seja formada por legendas compromissadas com uma agenda progressista.

A íntegra da entrevista em vídeo está disponível em nosso canal do YouTube.

O retorno ao PT

As eleições de 2022 são as mais importantes da história republicana, é preciso que os setores ditos democráticos, progressistas, se unam. Essa não é uma eleição que a gente pode esperar os 45 minutos do segundo tempo para apoiar alguém. O centro democrático do Brasil chama-se Luiz Inácio Lula da Silva, é por ele que as aspirações democráticas do nosso país se expressam. Então, passamos a dialogar mais uma vez com o PT e creio que isto é uma necessidade. Sou uma pessoa de construir histórias, não espero a história acontecer. É lamentável o ponto em que o Brasil chegou com Bolsonaro: a antipolítica, a antigestão, o radicalismo idiotizado que uma parcela da população comunga. O Brasil não aguenta mais quatro anos, e eu não digo nem de Bolsonaro, porque eu acho que ele está profundamente enfraquecido. Refiro-me ao bolsonarismo em seu conteúdo econômico e social. As forças políticas consequentes precisam ter essa clareza.

PT e PSB juntos em 2022

O PSB precisa afirmar um caminho onde caiba a história e o discurso do partido. Em 2014, cometemos um profundo erro, o de apoiar Aécio Neves no segundo turno das eleições. Não segui a orientação do partido e apoiei Dilma ­Rousseff. Depois, tivemos o impeachment, outro erro (a executiva nacional da legenda apoiou o processo). É preciso que o PSB se reencontre com a sua história, com a construção de uma esquerda democrática, de um país soberano e popular. A minha intenção, o meu coração, a minha vontade, era de que nós estivéssemos construindo o processo e não esperando maio, junho, julho do próximo ano para dizer: “Nós vamos apoiar”.

O voto nordestino

Enganam-se aqueles que acham que o povo nordestino, os milhões de brasileiros que aqui moram, são pessoas sem nenhum grau de politização. Na essência, é exatamente o inverso. Se você for fazer uma análise das eleições de 2018 e comparar com o restante do Brasil, vai ver que o voto mais politizado foi exatamente no Nordeste. Não é porque votou no Haddad, quase 70%, e sim porque o fosso social é mais profundo aqui. Se fosse verdade que essa população é despolitizada, o caminho mais natural seria apoiar a candidatura que todos apoiavam: o capital financeiro, os grandes empresários, os grandes meios de comunicação. Se essa população não fosse politizada, acompanharia essa boiada. Em vez disso, tivemos um voto esclarecido e também de gratidão. Eu não creio que o aumento do Bolsa Família, às vésperas de uma eleição, vá mudar a tendência. O Brasil perdeu com Bolsonaro em todos os sentidos: internacionalmente, hoje é um pária, e internamente, porque a economia tinha quebrado antes da pandemia.

O ex-governador da Paraíba não acredita nas ameaças golpistas de Bolsonaro. “No Nordeste, a gente sempre diz: cão que ladra não morde”

A transição democrática

A grande questão do governo Lula, no meu entender, vai ser uma transição democrática, porque este país está despedaçado. É preciso colocar as coisas nos seus lugares e, ao mesmo tempo, reconstituir aquilo que nós chamamos de tecido social. Nenhum governo vai conseguir governar o Brasil sem uma profunda sensibilidade social. A fome voltou, o desemprego está em 15%, fora os mais de 35% de trabalhadores uberizados, precarizados. Qual é o futuro que temos com esse tipo de política? E a turma ainda acha pouco e quer aprofundar o neoliberalismo, tentam vender tudo como se estivessem no Baile da Ilha Fiscal (o último do Império, dias antes da Proclamação da República), naquela despedida em que eles sabem que perderão.

Frente ampla

É preciso, primeiro, cuidar de uma coisa fundamental: o que vamos fazer? Se não deixarmos isso claro para a população, corremos o risco de um novo 2016, de um novo golpe. Os que pregam e lutam por mudanças só escapam de golpes se tiverem do seu lado um povo instruído.

A ameaça golpista

Não acredito em golpe, Bolsonaro está mais isolado que nunca. Por incrível que pareça, o Brasil chegou ao ponto de ter um presidente que não consegue falar sobre saúde, não consegue falar sobre balança comercial, não consegue falar sobre absolutamente nada, a não ser sobre golpe, ditadura, tortura, fake news, é um propulsor da desorganização de uma nação. Ele não tem qualificação de exercer o mais alto cargo de uma nação. Por outro lado, quando radicaliza nesse caminho, ele demonstra uma fraqueza enorme. No Nordeste, a gente sempre diz: cão que ladra não morde.

Falsas simetrias

Preocupo-me quando percebo representantes do empresariado, essas forças que ficam aí, fazendo a cabeça de bancos, falando: “Lula não”. Ora, por que Lula não? Tentam colocar no mesmo nível Bolsonaro e Lula, e isso é um absurdo, do ponto de vista histórico chega a ser criminoso. Lula é um ser profundamente democrático. Você pode não gostar dele, não votar nele, mas não há como negar esse fato. A história de Bolsonaro é outra, ele sempre foi um inimigo da democracia. Os setores empresariais e acadêmicos precisam rejeitar isso. O Brasil não aguenta mais essa instabilidade.

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