CartaCapital

Bolsonaro ensaia seu golpe

O objetivo é impedir o pleito límpido e democrático e a vitória inevitável de Lula

O mestre e o aluno denodado. (FOTO: Alan Santos/PR)
Apoie Siga-nos no

No cenário álgido criado no coração do Planalto Central por Oscar Niemeyer, Jair Bolsonaro vive antecipadamente a espera da eleição marcada pelo calendário golpista para outubro de 2022. Não estamos diante de uma tragédia shakespeariana, a recomendar outra ambientação, talvez um castelo medieval. Mesmo assim, o tormento do herói deste momento é absolutamente real, a despeito das distâncias de tempo e espaço. E toda a inquietação do ex-capitão é compreensível.

A derrota eleitoral não há como ser impedida se a refrega for disputada conforme as regras de um evento límpido e democrático, defendidas por ora pelos tribunais competentes, STF e STE. É um jogo de faz de conta, está bem claro, mas é conforme as tradições brasileiras que costumamos aceitar tranquilamente. Para nós, de CartaCapital, a situação é a mais conveniente por ensejar a vitória do nosso candidato, Luiz Inácio Lula da Silva. Neste exato instante, o atual presidente da República já é capaz de enxergar a derrota e busca em desespero uma maneira de evitá-la.

Ricardo III oferecia seu reino por um cavalo no campo da batalha perdida. (FOTO: London Films)

Como diz o sociólogo Claudio Gonçalves Couto, da FGV de São Paulo, a defesa do voto impresso é a nova cloroquina deste momento singular, isto é, providência tão inócua quanto desastrada. Sobra ainda a incógnita das posições eventualmente conflitantes dos dois “Centrões” criados pela própria política bolsonarista, o fardado e o parlamentar. Para todos aqueles que desejam um Brasil livre de Bolsonaro e do bolsonarismo, a solução chama-se Lula.

Ao longo da história eleitoral do Brasil, os votantes sempre buscaram o salvador da pátria, papel que Lula preencheu ao longo de dois mandatos presidenciais, dos quais se despediu com cerca de 90% de aprovação, de acordo com as pesquisas, apoio maciço só conseguido por ele e por Getúlio Vargas. Sempre tivemos a sensação de que Bolsonaro, personagem capaz de tudo, até seus últimos momentos resistiria no lugar alcançado nas eleições de 2018, para a desgraça do Brasil em peso, conscientes ou não os cidadãos envolvidos na tragédia.

Não é por acaso que o ex-capitão amou de desvairada paixão o ex-presidente estadunidense Donald Trump, para ele verdadeiro mestre da contestação antidemocrática até na invasão do Capitólio por seus seguidores enraivecidos. Este marcante episódio deveria ser difícil de repetir nas nossas fronteiras, pela falta talvez de efetivos, embora haja à disposição acólitos armados até os dentes. De todo modo, a resiliência do ex-presidente dos EUA, na memória e em muitos atos do ex-capitão, assusta na sua capacidade de ainda orientar as ações governistas.

Ocorre-me uma das mais trágicas personagens shakespearianas, Ricardo III. Ele vagueia sem rumo pelo campo da batalha perdida, enquanto implora “meu reino por um cavalo”. Na boca de Bolsonaro este pedido extremo não cabe, embora o nosso ex-capitão, na situação em que se encontra, justifique o apelo. Mas, apeado ou do alto da sela, Bolsonaro já perdeu, como Ricardo III.

Quem votou em Bolsonaro integra um eleitorado tão leniente quanto ignorante

Agora, o presidente que resulta da série de golpes a infelicitar o País tenta dar o seu próprio, para impedir a derrota, ao passo que Lula aguarda tranquilamente a chegada do momento certo, do instante decisivo. Era inevitável a reação de Bolsonaro e há tempo prevista também era a tentativa de pôr fim, a qualquer custo, à perspectiva do desastre. Nestas condições, o Brasil enfrenta uma prova determinante do seu futuro.

Ainda me vem à memória a velha frase sobre os poderes da saúva: ou o Brasil acaba com a saúva ou a saúva acaba com o Brasil. As variadas artimanhas do ­atual presidente impõem ao País uma solução drástica. Se eleições houver, Lula vai vencê-las, certamente, como de resto demonstra o alvoroço bolsonarista em torno de alguma solução de curto prazo, antes que o caminho do pleito se desenrole. É do conhecimento até do mundo mineral: Lula é a solução conquistada nas urnas. Antes disso, entretanto, é fundamental que os brasileiros entendam Bolsonaro como o resultado de situação aceita por uma maioria a trafegar entre a ignorância e a leniência.

Publicado na edição nº 1169 de CartaCapital, em 5 de agosto de 2021.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo