Observatório do Banco Central

Formado por economistas da UFRJ, analisa a economia suas relações fundamentais com a moeda e o sistema financeiro

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Regra ou arbítrio do Banco Central do Brasil

Há vantagem de ter regras, fórmulas e algoritmos, em vez de arbítrios humanos, na execução da política monetária com base em previsões?

A sede do Banco Central, em Brasília. Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil
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Em 2021, a inflação superou todas as aplicações financeiras. A SELIC/CDI teve perda real de -5,08% e o dólar em -0,23% no ano passado. Em março daquele ano, quando o COPOM partiu em busca do tempo perdido, a SELIC/CDI registrava perda real de -1,54%, o dólar acumulava alta de +6,3% e o Bitcoin +114% no primeiro trimestre.

As cotações internacionais das commodities tiveram forte alta no primeiro trimestre de 2021, em comparação ao mesmo período do primeiro ano da pandemia. Essas altas contribuíram para o maior nível nos termos de troca (relação entre os preços médios de exportação e os de importação) do Brasil desde 2011, mas pressionavam os preços no mercado doméstico. A inflação do IPA, medido pelo IBRE/FGV, chegou a 42,6% em 12 meses até março de 2021. O IGP-M acumulou 31,1% em igual período.

Problemas externos de suprimento, relacionados à pandemia e à guerra da Rússia na Ucrânia, aumentaram os preços mundialmente. A grande questão, para o próximo governo social-desenvolvimentista, é decidir se é preferível ter um aumento temporário na inflação em vez de outra década perdida de baixo crescimento de renda e emprego.

Desde maio de 2022, a SELIC, o CDI e o CDB passaram a apresentar taxa de juro real positiva ex-post, isto é, descontado o IPCA a cada mês. Entre janeiro e julho, a bolsa de valores acumulou queda real de -6,6%, o dólar no mercado -11,6%, euro -20% e Bitcoin -57,5%, ou seja, dado o custo de oportunidade, as operações especulativas refluíram com significativas perdas reais no ano corrente.

A capitalização da riqueza financeira com juros compostos aumentará a possibilidade de compra de ativos existentes no futuro por seus possuidores. Por causa dessa concentração (e acumulação) dela, uma grande dívida pública interna, geralmente, é detestada pela esquerda, devido a essa dívida propiciar um enriquecimento de poucos.

Por sua vez, porta-vozes midiáticos ficam “precificando” a atitude do Comitê de Política Monetária, às vésperas de todas as suas reuniões, para decidir aumentar ou não a taxa de juro básica SELIC. Pressionam-no para adoção da Regra de Taylor – desvio da meta e hiato do produto – e as tesourarias não perderem com a antecipação correta.

Antes da morte do monetarismo, os adeptos da Teoria Quantitativa da Moeda foram os maiores críticos da discricionariedade da diretoria do Banco Central, incorporada na política monetária. Defendiam uma regra “constitucional” da oferta de moeda crescer de acordo com o produto real, em longo prazo, e fornecer uma âncora nominal para a economia.

Eles também apontavam a dificuldade de prever, exatamente, tanto a evolução econômica quanto o impacto das ações de política. Tudo isso implicava em os Bancos Centrais não deverem sequer cogitar de estabilizar a economia, em curtos períodos, por meio de ações de políticas discricionárias.

Dadas as defasagens temporais e as incertezas envolvidas, tal volatilidade na política monetária e fiscal provavelmente causaria mais danos em vez de benefícios, apesar das melhores intenções. Seria a melhor conduta aquela sem abruptas oscilações na política, pois a Autoridade Monetária falharia em não tolerar o diferimento entre as suas ações, nas quais só tem evidência empírica sobre as condições presentes, e os efeitos subsequentes em futuro indeterminado sobre a economia.

Viés e ruído, respectivamente, desvio sistemático e dispersão aleatória, são componentes diferentes do erro no julgamento humano. Ocorrem nas diversas decisões tomadas coletivamente.

Preguiça social surge quando o desempenho do indivíduo não é visível diretamente, mas se dilui em um grupo. Por qual razão investir toda sua força se também não é notado quando faz menos esforço?

Pensamento de grupo nem sempre conduz a uma correta decisão técnica. Um grupo de pessoas inteligentes toma decisões absurdas porque cada uma ajusta sua própria opinião ao suposto consenso. No caso, é pautado por pressuposta “opinião especializada”, composta dos “analistas de O Mercado”, publicada no jornalismo econômico.

Discricionariedade é o arbítrio na decisão da Autoridade Monetária. Possui poder discricionário, isto é, capacidade de fazer variações discretas (“subir em degraus de escada a taxa de juro”) e não contínuas (“subir em rampa”). Também pode se referir à liberdade dada ao Banco Central independente.

Há necessidade diferenciar dois modos de regular seu comportamento: regras ou padrões. As regras são feitas para eliminar a discricionariedade por parte de quem as aplica. Os padrões são verificados para conceder tal discricionariedade na orientação dos tecnocratas nomeados (e não eleitos) para a diretoria do Banco Central.

Há vantagem de ter regras, fórmulas e algoritmos, em vez de arbítrios humanos, na execução da política monetária com base em previsões? Ao contrário da crença popular, isso tem menos a ver com um discernimento superior das regras – e mais com ruídos.

O julgamento preditivo — a ignorância objetiva do futuro —conspira com o ruído para restringir a qualidade da previsão. O ser humano não tem consciência do ruído e se admira, ex-post, com eventos não terem sido previstos no passado.

O entendimento da razão de o futuro ser incerto é fundamental para o entendimento holístico com a finalidade de um julgamento adequado. Ele é resultante de decisões descentralizadas, descoordenadas entre si e desinformadas umas das outras, inclusive por muitas ainda não terem sequer sido tomadas.

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