Justiça

Desemprego ‘verde e amarelo’ aumentará com medida do governo

‘Boom’ na precarização das relações de trabalho com criações de subempregos sem estabilidade põem por terra promessas de criação de empregos

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Em novembro de 2019 foi publicada a Medida Provisória 905, a qual instituiu o contrato “verde e amarelo” e implementou alterações na legislação trabalhista, tributária e previdenciária.

A referida MP surge em meio a uma série de reformas na legislação trabalhista, impostas pelo governo, sob o argumento de garantir a redução do desemprego, a inclusão da população jovem no mercado de trabalho e crescimento econômico do país, se adaptando à realidade de uma política neoliberal, tida como uma tendência irreversível na economia mundial globalizada.

O “contrato verde e amarelo” promete incentivos às empresas que contratem empregados entre 18 e 29 anos, com remuneração limitada a 1,5 salário mínimo nacional. A nova modalidade contratual poderá englobar até 20% do efetivo das empresas.

Os empregadores que aderirem a este novo modelo, terão isenção de contribuição previdenciária, salário-educação, contribuição destinada a outras entidades (Sistema S), inclusive a destinada ao Incra. E ainda terão a alíquota de FGTS reduzida a 2%, independentemente do valor da remuneração.

Ocorre que o apelo de sua implementação, supostamente visando o combate ao desemprego, traz uma série de questionamentos quanto a efetividade da medida, e os reais interesses que motivaram tais mudanças.

A proposta de facilitar o acesso ao mercado de trabalho se mostra contraditória, quando se observa que está atrelada a redução de direitos da classe trabalhadora e impõe um retrocesso nas garantias mínimas conquistadas pela legislação trabalhista nos últimos anos.

A título ilustrativo, elencamos as seguintes inovações aos empregados submetidos ao “contrato verde e amarelo”: a redução da multa fundiária, antes de 40%, ao percentual de 20%, e a exclusão da obrigatoriedade na contribuição previdenciária.

A MP 905/2019 autoriza o labor em domingos e feriados, sem a autorização prévia dos sindicatos, o que enfraquece a atuação destes na defesa dos interesses da categoria e na fiscalização do equilíbrio das relações de trabalho. O intuito de abolir a atuação do movimento sindical fica ainda mais evidente, quando a norma torna dispensável a sua presença nas negociações em torno da PLR.

O caráter duvidoso do interesse em proteger a classe trabalhadora e aumentar os postos de trabalho, destacados no pacote de medidas adotadas pelo governo, tem respaldo nos números apurados pelos órgãos oficiais.

Rodrigo Maia e Paulo Guedes. Foto: Agência Brasil.

Segundo o IBGE, no terceiro trimestre de 2017, a taxa de desemprego da economia brasileira era de 12,4%. No mesmo período em 2019, essa taxa chegou a 11,8%. A queda foi de 0,6 ponto percentual. Mas este dado não é absoluto, pois foi camuflado pela dura realidade vivida, já que aumentou o número de empregados que desistiram de buscar emprego, e passaram a “correr atrás” de novas formas para prover a subsistência, os quais não integram a classificação como desempregados.

Em verdade, as medidas adotadas pelo governo acarretaram em verdadeiro “boom” na precarização das relações de trabalho, criações de subempregos e contratos informais, potencializando as chances de infração à legislação vigente, que assegura a saúde e segurança do trabalhador.

Nos deparamos não com aumento dos postos de trabalho, mas sim com mudanças na forma de contratar, fomentadas por contratos intermitentes e temporários. Nestas modalidades, os empregados são desprovidos de um mínimo de estabilidade financeira e submetidos a jornadas extenuantes.

As inovações incentivam a substituição das relações formais de emprego, por outras precárias, ignorando direitos básicos dos empregados, como seguro desemprego, folga em domingos e feriados, jornada especial aos bancários e assistência sindical na rescisão do contrato de trabalho.

Assim surgem novas categorias, como os motoristas de aplicativos, trabalhadores sob regime de home office e microempreendedores não registrados que contratam auxiliares informalmente.

 

O resultado são salários baixos, demissões em massa, exclusão de garantias trabalhistas e estimulo a contratação irregular, dada a ausência de fiscalização e medidas punitivas, acarretando o engessamento da atuação do trabalhador na economia e polarização na distribuição de renda. Acompanham estas mudanças  um aumento exponencial da violência nos centros urbanos, e limitação no acesso à educação formal, já que o jovem precisa ingressar mais cedo no mercado de trabalho informal, para assegurar a sua sobrevivência.

O pacote de reformas trazido pelo governo não significou inflexão da taxa de desemprego, mas uma crise social decorrente da exploração da mão de obra, que fomenta o desequilíbrio econômico.

E não há que se falar em surpresas nos resultados obtidos, já que medidas idênticas implementadas em países da Europa, como a Espanha, comprovaram a sua ineficácia e o consequente agravamento da crise política, econômica e social nesses países.

A Espanha convive com a precariedade das relações de trabalho advindas da reforma trabalhista, iniciada em 2012, e marcada pela redução de empregos formais, baixa remuneração, fragilidade das medidas que inibam e punam a violação aos direitos do trabalhador. Lá a flexibilização da lei tem como alvo a geração “millennial” que cresceu em meio ao processo de inovação tecnológica, questionando padrões sociais. Alvo fácil para a construção de um mercado informal, almejando o empreendedorismo.

Após a reforma trabalhista espanhola, as taxas de desemprego chegam a 40%, e refletem diretamente na construção das famílias, já que a idade média de emancipação é 29 anos, consequentemente, demorando mais para ter filhos. O cenário pós reforma é marcado por um movimento crescente de migração dos jovens em busca de emprego em outros países, e frustrados com as perspectivas em seu país de origem.

As mudanças propostas observam apenas um lado da classe sócio-econômica, sendo que numa verdadeira democracia devem ser observados os pontos de vista e necessidades reais de todas as categorias sociais, respeitando as suas diferenças, e visando um crescimento harmônico, amparado na realidade do seu povo.

O prometido combate ao desemprego não se concretizou após a reforma trabalhista, e os defensores das medidas implementadas, justificam que ainda não houve tempo suficiente para que os resultados se sobressaiam, mas que ainda há muito a percorrer no caminho em busca da desburocratização das relações de trabalho, tão almejada pelo “mercado internacional”.

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