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Time de futebol para gays coleciona títulos e muda vida de jogadores

‘Através da participação no BeesCats, me aceitei melhor e me entendi enquanto LGBT+. Eu era um antes do time, agora eu sou outro’

BeesCats
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Não é só um jogo, não é só futebol. Como dito por Flávio Amaral, artilheiro do BeesCats Soccer Boys, “não é só pelo time, é pela iniciativa”. Às quartas, treinos dignos da equipe competitiva que, em menos de dois anos de criação, já coleciona dois títulos e outras quatro finais de campeonatos. Já durante uma sexta-feira do mês, o futebol fica em segundo plano: é hora de reunir amigos, conversar e se divertir. Eu não ousaria apontar qual dos dias é mais significativo.

Flávio explica que a ideia para a criação de um time de futebol para gays no Rio de Janeiro surgiu quando André Machado – fundador da equipe – assistiu uma reportagem sobre o Unicorns Futebol Clube, equipe de São Paulo criada em 2015 com o intuito de ser um espaço para homossexuais praticarem futebol society. “Por que não tentar algo similar no Rio?”, pensou. A ideia de André não era montar um time, ele só queria organizar uma pelada entre amigos. Da surpreendente quantidade de pessoas que apareceram para jogar e da constância dos encontros, nasceu o BeesCats Soccer Boys em maio de 2017.

Os encontros lúdicos às sextas, na Guanabara, recebem mais de 40 pessoas. Ali, com o esporte tratado como brincadeira, é que se entende a filosofia do time: “Mostrar que podemos ser nós mesmos jogando bola”, diz Flávio. O jogador conta que a equipe de futebol mudou sua vida e o ajudou a lidar com sua orientação sexual. “O fato de ser jornalista esportivo me fez fechar para isso durante toda a faculdade e, através da participação no BeesCats, eu me aceitei melhor e me entendi enquanto LGBT+. Eu era um antes do time, agora eu sou outro”, revela.

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Vamos jogar futebol?

Flávio explica que muitos homossexuais se afastaram do esporte ainda na adolescência, por conta de preconceito e de bullying no ambiente escolar. A existência dos times LGBT+ permite que as pessoas pratiquem o futebol com o sentimento de libertação, além de ser uma forma de conscientizar a sociedade. “Através desses times, as pessoas estão trabalhando questões que ficaram mal resolvidas no passado. Por isso eu falo que essas equipes são espaços de cura – curam traumas e transformam a visão desses homens sobre o esporte”, ressalta o jogador.

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Os jogadores do BeesCats desejam que mais equipes sejam criadas no Brasil e lançou uma campanha na qual entrava em contato com pessoas que já tinham demonstrado interesse pela iniciativa e os convocaram para fundar um time. As redes sociais foram aliadas no processo e o saldo foi positivo: hoje existem mais de 50 equipes LGBT+ no país. “A gente está fazendo um trabalho de formiguinha e saber que inspiramos o surgimento desses novos times é muito recompensador”, garante Flávio. Ele conta que alguns times LGBT+ também possuem times femininos e que é importante que esse processo de estenda para todos. “Quero que todo mundo tenha essa relação positiva com o esporte que nós estamos tendo hoje”, conclui.

Além de torcer para que o movimento atinja cada vez mais pessoas, Flávio também contribui na divulgação das equipes através da coluna que escreve para o site Pop Bola, chamada “Orgulho em campo”. “Eu apresento um panorama das competições e do ambiente dos eventos, sempre buscando trazer informações na palavra de quem participa e de quem organiza os torneios”, relata.

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Sucesso em campo

A história da equipe em competições começou vitoriosa. Logo no primeiro torneio disputado – 1ª Taça Hornet de Futebol da Diversidade, em São Paulo – a equipe do Rio de Janeiro foi campeã e Flávio foi o artilheiro da competição. A briga por títulos é algo que virou tradição do BeesCats, que foi vice-campeão de duas Champions Ligay, da 2ª Taça Hornet e da principal competição que disputaram: a Gay Games.

A Gay Games, realizada em Paris em 2018, é um torneio conhecido como “Olimpíada Mundial LGBT” por reunir atletas de diversas modalidades e de várias partes do mundo. O BeesCats Soccer Boys foi o único time de futebol brasileiro a participar da disputa e recebeu a medalha de prata, após perder para a equipe da casa por 3 a 2, com gol decisivo no último minuto da partida. “É importante mostrar que esse espaço também pode ser ocupado por nós. A gente sentiu na pele a honra de defender o nosso país lá fora e foi incrível conviver com pessoas de 91 países diferentes. A experiência vai muito além do esporte, eu vou levar para o resto da minha vida.”

A sequência de vice-campeonatos terminou em setembro, com a conquista da Copa Sudeste. Flávio associa a vitória com a chegada de um treinador na equipe, Alan Paschoal. “A gente vinha de quatro vice-campeonatos, uma coisa meio traumatizante para gente e o Alan Paschoal conseguiu nos dar um cara mais competitivo e tirar o melhor de cada jogador”, diz Flávio. Ele conta que o diferencial foi a experiência do treinador com a modalidade praticada pela equipe: o futebol society.

Com os investimentos dos times em treinamento, o nível de competitividade dos torneios LGBT+ aumenta. Para Flávio, a consequência é clara: maior visibilidade para as equipes. “O movimento só tende a crescer, é um caminho sem volta”, diz orgulhoso. O artilheiro revela que o que torna as competições LGBT+ especiais é a leveza, que permanece a mesma diante do crescimento da competitividade. “Você tem coisas muito mais importantes na vida do que a vitória. O que eu vejo nas competições LGBT+ é uma certa leveza, não só em campo, mas também em todo o contexto do evento. É uma energia mais leve e que permite a integração entre todos que participam. Este é um ganho muito grande, é o famoso close certo”, conclui Flávio.

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