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Novos tempos contaminados por velhas práticas

A religião está sendo vergonhosamente usada como escudo protetor para atos ilícitos praticados por aqueles que a enxergam como tal

Ausência de saneamento básico
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Como fora previsto, estamos assistindo com pesar aos desmandos praticados por um governo conservador, elitista, excludente e sem ética contra o povo brasileiro, sobremodo os mais necessitados e as minorias. Não obstante, um esquema arquitetado havia tempos com o objetivo de beneficiar grandes corporações está sendo levado a cabo com a venda de estatais e entrega de reservas naturais a grupos internacionais (que causarão danos irreparáveis ao meio ambiente), o perdão de dívidas bilionárias contraídas por empresas e bancos e as reformas trabalhista e da Previdência, para ficar somente nestes exemplos. Qual será o resultado se isso continuar? É simples: os pobres cada vez mais pobres e os ricos cada vez mais ricos. Até aqui, nenhuma surpresa.

Mas, não se vai longe o dia em que fomos impactados por imagens e discursos provenientes de setores e pessoas da sociedade que jamais esperávamos apoiando esta política e aqueles que a defendem. Destaque-se aqui o meio religioso de onde brotou uma campanha arrogante e desprovida de misericórdia, que vem sendo levada a cabo por homens e mulheres auto proclamados “cristãos autênticos” e “senhores e legítimos guardiões da verdade”. A estes, perguntamos: cristãos autênticos apoiam e tiram fotos portando armas ao lado de quem defende combater a violência com mais violência? Que enxergam a mulher como um objeto? Que apregoa o preconceito racial?

Em seus discursos, preferencialmente, falsas acusações são proferidas contra religiosos e religiosas, padres e pastores, leigos e leigas que assumiram verdadeiramente o compromisso de permanecer ao lado dos mais pobres, para com eles construir uma sociedade mais justa e solidária, onde não haja explorados e exploradores e os direitos humanos sejam garantidos. Sem conhecer a verdade dos fatos e os trabalhos realizados por estes homens e mulheres, os novos “juízes” se voltam contra eles com unhas e dentes, acusando-os, de serem “comunistas ou socialistas” – agregando a estes regimes políticos tudo que há de pior -, que levaram a política para os altares com o objetivo de destruir a Igreja.

Defender a libertação dos pobres do pesado jugo que lhes é posto sobre os ombros por políticas públicas injustas, a partir da prática de uma ética libertadora, é algo impensável para esses grupos. Aliás, chegaram recentemente ao absurdo de acusar a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) de ser “comunista” devido a Campanha da Fraternidade de 2019, que teve como tema “Fraternidade e Políticas Públicas” e como lema “Serás libertado pelo direito e pela justiça” (Is 1,27). Alguns chegaram a dizer que esta campanha tinha por finalidade levar a política para dentro da Igreja, numa clara demonstração de desconhecimento dos fatos e das razões que levaram a CNBB a escolher o referido tema.

Diante dos acontecimentos aqui narrados (e de tantos outros disponíveis nas redes sociais e periódicos), podemos deduzir, tristemente, que o ódio e os preconceitos semeados contra as minorias e determinados grupos sociais encontrou espaço no meio religioso. A religião está sendo vergonhosamente usada como escudo protetor para atos ilícitos praticados por aqueles que a enxergam como tal.

Papa Francisco, que tem se pronunciado abertamente contra as injustiças sociais, o acúmulo de riquezas e o aumento da pobreza, vem sendo vítima de terríveis ataques. O Papa deixa bem claro sua opção pelos pobres e marginalizados, pelos refugiados, pelas viúvas e pelos órfãos.

É hora de fazer, construir, edificar e ensinar com o pobre e não mais para o pobre. É preciso deixar de enxergar os pobres como “instrumentum laboris“, como uma “inesgotável fonte de votos” conquistados devido à miséria em que vivem.

Fazer com o pobre é colocá-lo no centro das atenções, torná-lo sujeito e não objeto; respeitar e reconhecer o seu protagonismo nos trabalhos pastorais desenvolvidos. Infelizmente, ainda hoje (melhor dizendo) principalmente hoje, são poucos aqueles que abrem mão de seu “poder” e se enxerga como mais um “dente na engrenagem” social em que está inserido.

Chega de farisaísmo! Precisamos de profetas destemidos que emprestem suas vozes à luta contra a opressão e a morte. Digamos com Francisco: “Num mundo dilacerado pela lógica do lucro que produz novas pobrezas e gera a cultura do descarte, não desisto de invocar a graça de uma Igreja pobre e para os pobres”.

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