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TSE é pressionado a fazer campanha de estímulo ao voto em negros

Cobrança é feita em petição pela Coalizão Negra por Direitos; pedido é para que haja propaganda como as que incentivam a eleição de mulheres

Movimento negro
Demanda é apresentada pelo movimento negro. Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil Demanda é apresentada pelo movimento negro. Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
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Mais da metade da população brasileira é composta por pessoas pretas ou pardas. Apesar de os negros representarem 55% do total de habitantes, apenas 27% dos cargos legislativos foram ocupados por eles nas últimas eleições. A fim de corrigir essa distorção, a Coalizão Negra por Direitos lidera uma mobilização para pressionar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a promover campanhas publicitárias de estímulo ao voto em candidatos negros. 

 

A proposta vai ao encontro da necessidade de o País construir parlamentos que sejam, de fato, representativos da população brasileira, ou seja, não compostos em sua maioria por homens brancos heterossexuais, mas também por mulheres, pretos, pardos, indígenas, LGBTs etc. A demanda do movimento negro se concentra em um abaixo-assinado aberto pela Coalizão na plataforma Change.org. A petição reúne até o momento mais de 15 mil apoiadores. 

Em agosto, a justiça eleitoral avançou na busca por uma política que reflita melhor a diversidade da sociedade brasileira. O TSE decidiu pela divisão proporcional dos recursos de financiamento de campanhas e do tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e TV entre candidatos negros e brancos. Na semana passada, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que a regra da “cota eleitoral racial” deve valer já para o pleito deste ano.  

A medida foi considerada pelo movimento negro como “uma importante vitória no enfrentamento ao racismo institucional na política”. Durante o julgamento no TSE, o ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso e presidente da Corte, também fez referência à justiça racial. “Há momentos na vida em que cada um precisa escolher em que lado da história deseja estar. Hoje, afirmamos que estamos ao lado dos que combatem o racismo, ao lado dos que querem escrever a história do Brasil com tintas de todas as cores”, falou na ocasião. 

Na opinião do professor de História, fundador da Uneafro Brasil e integrante da Coalizão Negra por Direitos, Douglas Belchior, para haver coerência entre a decisão e a prática é necessário que o TSE promova a conscientização da população sobre a importância das candidaturas negras. Por isso, a Coalizão Negra – união de 150 organizações, grupos e coletivos do movimento negro brasileiro – criou a petição a fim de pressionar o TSE. 

“É extremamente coerente, necessário, que o TSE promova uma campanha dando publicidade e estimulando a sociedade a se sensibilizar assim como ele próprio se sensibilizou. Então, as justificativas, os porquês, os motivos pelos quais seria necessária essa mobilização da sociedade em torno do voto em pessoas negras já estão dadas pelas próprias instituições”, pontua Belchior, considerando que os passos tomados são importantes para o reconhecimento de uma injustiça histórica e do quanto o racismo influencia nos resultados eleitorais.  

No abaixo-assinado, o movimento requer que sejam feitas peças publicitárias de incentivo ao voto em negros para veiculação em rádios e TVs. A proposta ainda pede a elaboração de cartazes educativos para exposição nos cartórios eleitorais, materiais para internet e redes sociais, além da preparação de conteúdos aos partidos políticos para sensibilizá-los sobre a criação de políticas internas que potencializem candidaturas negras.

A demanda usa como exemplo ações que o TSE promove para valorizar candidaturas femininas e contra a abstenção do voto. Recentemente, a Corte lançou a campanha “Mais mulheres na política: a gente pode, o Brasil precisa”, além de veicular um vídeo, em março, para celebrar o Dia da Mulher. No ano passado, também criou a página #ParticipaMulher, dedicada àquelas que fizeram e ainda fazem história na política e na Justiça Eleitoral.

A Coalizão considera, no texto da petição, que a medida é necessária para que haja coerência entre a importância histórica da decisão do TSE sobre a “cota eleitoral racial” e a emergência do tema. O movimento espera que o pedido seja atendido com urgência, a tempo de as peças serem divulgadas nas últimas três semanas do período da campanha eleitoral. 

“É importante e está em tempo ainda para que o TSE, em regime de urgência, promova uma grande campanha publicitária de nível nacional em cadeia de rádio e televisão, dialogando com o movimento negro, trazendo referências do movimento negro, das artes, da cultura, da intelectualidade, pessoas negras e negros de todas essas áreas, do próprio movimento social negro, para ter espaço também nessa ação de valorização do voto em pessoas negras e da maior representação negra nos espaços de poder”, detalha o fundador da Uneafro. 

Recorde de candidaturas negras

Urna eletrônica Quantidade de candidatos negros inscritos é maior que brancos. Foto: Elza Fiúza/Agência Brasil

O pleito de 2018 elegeu deputados distritais, estaduais, federais e senadores. Dentre as 1.626 vagas abertas, apenas 444 foram ocupadas por candidatos que se autodeclararam pretos ou pardos. Neste ano, as eleições vão escolher vereadores e prefeitos e estão marcadas para os dias 15 e 29 de novembro – 1º e eventual 2º turno, respectivamente.  

No que depender da quantidade de pedidos de registro de candidatura aos postos de chefe dos executivos municipais e às cadeiras nas câmaras de vereadores, o resultado dessas eleições poderá ser mais igualitário. Pela primeira vez desde 2014 – ano em que o TSE começou a perguntar a cor dos candidatos – o total daqueles que se identificam como negros (pretos ou pardos) é maior do que os autodeclarados brancos. 

Segundo o TSE, foram feitos 526 mil pedidos de candidatura. Do total de inscritos, 264 mil, ou 51%, afirmaram ser pretos ou pardos, enquanto 249, ou 48%, apresentaram-se como brancos. De acordo com análises de especialistas, diferentes fatores podem ter influenciado esse cenário, como a aplicação da “cota eleitoral racial” e o aumento de pessoas que passaram a se identificar como negras após a intensificação do debate racial. 

Belchior explica que a reivindicação da “cota” não era nova, mas fruto da luta histórica do movimento negro e da pressão da sociedade civil, que fizeram com que as instituições respondessem a ela. “O debate está sendo feito num outro nível, num nível de adesão, de sensibilização, de entendimento da importância da pauta, como antes a gente ainda não havia ainda vivido. E é muito importante que haja avanços concretos”, afirma o educador.    

O integrante da Coalizão Negra por Direitos ainda chama a atenção para a necessidade de a justiça criar instrumentos de acompanhamento e fiscalização para que a nova norma seja obedecida pelos partidos. Segundo ele, está ocorrendo uma “avalanche de denúncias” de candidaturas que não estão sendo apoiadas pelos partidos conforme determinado.

Neste ano, também houve recorde na quantidade de mulheres inscritas para o pleito eleitoral. Foram feitas 177 mil candidaturas femininas, ou seja, 34% do total. 

A posição do TSE

A equipe da Change.org entrou em contato com o TSE para saber se a instituição irá atender à demanda do movimento negro e promover a campanha publicitária. Por meio de nota, a assessoria de comunicação informou que as campanhas do TSE para as eleições deste ano não preveem uma ação específica para candidaturas negras.  

O comunicado esclareceu que, apesar disso, as ações do TSE tratam o tema em conjunto. “Isso pode ser visto na campanha ‘Mais Jovens na Política’, que começou a ser veiculada em 21 de setembro”, informa a nota. A instituição respondeu, ainda, que sua próxima campanha de valorização da mulher na política, prevista para o final deste mês, terá como protagonista a atriz e embaixadora da ONU Mulheres, Camila Pitanga, e contará também com a participação de Nina Silva – executiva de TI, fundadora do Movimento Black Money – e de Vivi Duarte, que é empreendedora social e fundadora do projeto Plano Feminino.

A pressão do movimento negro, entretanto, continua. O abaixo-assinado segue aberto na plataforma Change.org. A petição faz parte de uma página, lançada pela organização em parceria com a Coalizão Negra, que concentra mais de 90 campanhas sobre causas em prol da justiça racial. Confira o hotsite neste link: http://changebrasil.org/VidasNegras

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