Change.org

Petições contra ataques na educação somam 3 milhões de assinaturas

Docente e estudante que criaram petições em defesa da educação, recebem com insegurança o projeto Future-se, apresentado pelo MEC

(Foto: Luis Fortes/MEC)
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Já chega a aproximadamente 3 milhões o volume de apoiadores em torno de mobilizações online criadas em defesa da educação. Desde que medidas controversas começaram a ser anunciadas na área, professores e estudantes de institutos federais e universidades públicas recorreram à plataforma Change.org para protestar contra o bloqueio de verbas nas instituições, cortes em bolsas de pesquisas e ataques a curso de Humanas, como filosofia e sociologia. Na última quarta-feira 17, o anúncio do Ministério da Educação (MEC) sobre o programa Future-se deixou temerários docentes e alunos quanto ao futuro da educação superior no País.  

Daniel Tourinho Peres, professor de filosofia da Universidade Federal da Bahia (UFBA), começou a se mobilizar em defesa das instituições educacionais logo que o governo federal anunciou o bloqueio de recursos para a manutenção básica das universidades, em abril. Para o docente, a maior preocupação do projeto anunciado pelo MEC gira em torno de que a captação de recursos vinda de outras fontes de financiamento poderia acarretar numa desobrigação futura da União em arcar com os investimentos das instituições nos próximos anos. 

O Future-se foi apresentado pelo Ministério da Educação como um programa de inovação que possibilitaria o financiamento das instituições públicas de ensino superior a partir de modelos de negócios com capital privado. Com o projeto, o orçamento das universidades e institutos federais poderiam contar com receitas vindas de Parcerias Público-Privadas (PPPs) e fundos patrimoniais com doações de empresas e ex-alunos, por exemplo. Para a gestão, as instituições fariam contratos com organizações sociais, as chamadas OSs. 

“Ainda que fundos imobiliários sejam, nas palavras do ministério [da Educação], atrativos no mercado, como as universidades serão protegidas de todo risco inerente à operações de mercado? Quem irá administrar esse fundo? Toda a preocupação está em que o que é um acréscimo, hoje, se torne única fonte amanhã, com a União se desobrigando”, pondera Peres, que conseguiu coletar mais de 1,5 milhão de assinaturas em um abaixo-assinado pelas universidades públicas, que foi entregue à Câmara dos Deputados em maio. 

Enquanto o Future-se era apresentado a reitores de universidades e à imprensa, o MEC informou que a adesão das instituições ao programa será voluntária. O professor Peres, entretanto, enxerga um “elemento de chantagem” na medida, que é anunciada justamente num momento em que as universidades encontram-se fragilizadas e com seu orçamento “sequestrado”, como define o corte de verbas. “Ou se integra ou aguente o apocalipse que preparamos para vocês”, para o docente, esse é o recado passado pelo MEC.

Ao recorrer a outras formas de financiamento para as instituições, o programa tem sido interpretado como um modelo de privatização, embora isso seja negado pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub. Para Daniel Peres, que é professor universitário há 25 anos, essa sensação decorre do fato de que o projeto abre uma margem para que haja uma substituição gradual do atual formato de educação pública e autônoma “por um modelo, digamos assim, semi-privatizado e não autônomo”, define o docente. 

A petição criada por Peres segue aberta e recebendo assinaturas na plataforma Change.org. O professor acredita que a mobilização deve continuar, visto que considera o futuro da educação preocupante. De acordo com ele, o bloqueio no repasse de verbas para despesas de custeio já causa reflexos na universidade onde dá aulas. “A situação é terrível. Nos foi imposto um garrote, inviabilizando nosso trabalho e ameaçando a continuidade do estudo de milhares de estudantes. No caso de minha Universidade, a UFBA, fomos obrigados a reduzir, no período de recesso, as atividades didático-administrativas a meio período, ou seja, fora os laboratórios, a UFBA, no mês de julho e até o retorno às aulas, funcionou apenas no período da manhã. Além disso, os contratos de limpeza e segurança foram reduzidos em quase 13%”, conta.

Daniel Tourinho Peres, o professor que reuniu 1,5 milhão de assinaturas em defesa das universidades públicas (Foto: Arquivo pessoal)

Ataques ideológicos às Ciências Humanas

Além da mobilização liderada pelo professor Daniel Peres, a Change.org também hospeda outra que defende especificamente os institutos federais, também alvo do corte de verbas. A petição, criada pelo Grêmio Estudantil do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS) – Campus Restinga, acumula quase 370 mil assinaturas. Há, ainda, outras campanhas relacionadas à defesa da educação que tratam da proteção dos cursos de filosofia e sociologia, que foram alvo de ataques do governo, com ameaças de cortes de verbas.  

Dois abaixo-assinados em defesa das Ciências Humanas somam mais de meio milhão de apoiadores. Um deles foi aberto por um estudante de licenciatura em filosofia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), que já anunciou que poderia encerrar as atividades devido à indisponibilidade de recursos em caixa. Jonas Pereira de Moraes espera poder se formar dentro de dois anos e meio e sonha “seguir lutando em prol do pensar consciente”.

“Buscar qualidade de vida social, formar cidadãos capazes de pensar, analisar, decidir de maneira sensata e quem sabe no futuro conseguirmos alguém com a cabeça bem estruturada para direcionar nossa nação para uma vida mais harmoniosa, justa e sem desigualdades”, este é o desejo do estudante para o futuro de sua carreira e do país. Apesar da expectativa, o estudante preocupa-se com o que chama de “despreparo” do governo em lidar com essas questões. “Eu vejo um homem um tanto despreparado para comandar um país como o Brasil, penso também que o Bolsonaro está refém de suas promessas não sabendo como cumpri-las”, comenta Jonas, enfatizando que o presidente dá “canetadas” sem avaliar as decisões.   

Para Jonas, as medidas que estão sendo tomadas na área educacional, mesmo que não intencionalmente, são destrutivas e trazem reflexos negativos para a formação dos jovens. “Aqui necessitamos de muito trabalho e conscientização da população para se chegar numa completa transformação educacional e socioeconômica”, comenta o estudante sobre as mobilizações feitas pelos alunos em sua cidade, Pelotas, para defesa da educação. 

Além das campanhas abertas pelo professor Daniel Peres, pelo Grêmio Estudantil do IFRS e por Jonas, a Change.org hospeda outras mobilizações em prol da educação. Juntas, as 10 petições alcançaram um total de quase 3 milhões de assinaturas. 

O outro lado

O Ministério da Educação divulgou que o Future-se ficará aberto a consulta pública pela internet e dependerá de um projeto de lei a ser apresentado ao Congresso Nacional. A pasta informou, ainda, que o programa visa uma mudança de cultura nas instituições públicas de ensino superior, dando maior autonomia financeira a universidades e institutos federais.  

Em notas publicadas em seu portal oficial, o MEC reforça que o programa não prevê a cobrança de mensalidades em cursos e que não irá privatizar as instituições. De acordo com o ministério, o governo continuará a ter um orçamento anual destinado para as instituições.

“O Future-se tenta tornar mais eficiente práticas existentes. As instituições já contam com receitas próprias – cerca de 1 bilhão de reais de universidades, institutos e hospitais universitários somados. Mas os recursos não apresentam retorno direto para as atividades por conta de limitação legal. O dinheiro arrecadado vai para a Conta Única do Tesouro. A proposta do MEC visa à desburocratização do recebimento dessa verba”, diz trecho da publicação.

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