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A realidade metropolitana da Amazônia

Desafio para a região exige proposição de novos paradigmas sobre a ocupação humana uma prática político-social que seja inovadora

vista aérea próxima de Manaus (wikipedia)
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Com mais de 127 milhões de km2, a Região Metropolitana de Manaus (RMM) é a mais extensa do Brasil, sendo maior que estados como Pernambuco e Santa Catarina. Possui mais de 92% de sua área coberta pela floresta amazônica em diferentes estados de conservação. A região está estrategicamente localizada na confluência de dois dos maiores rios do mundo (Solimões e o Negro originando o Amazonas), possui mais de 10% de sua área coberta por águas e 50% está sob algum tipo de área de proteção.

Dados sobre a realidade urbana da região, apesar da escala amazônica, pouco remetem à exuberância florestal: com mais 2,1 milhões de habitantes, Manaus é o maior aglomerado da Amazônia, sétima maior cidade do Brasil; capital que cresce a ritmo mais acelerado do País; a segunda com menor arborização urbana e possui, atrelado a sua história de desenvolvimento recente, um dos maiores pólos industriais do Brasil.

Tal realidade lança desafios à sociedade não apenas acerca da irrefutável necessidade de conservação da maior floresta tropical do mundo e a reboque de sua biodiversidade, riqueza cultural e bens ainda desconhecidos, como também sobre o desenvolvimento e melhora da qualidade de vida da população local que forneça serviços, facilidades e melhoras em infraestrutura experimentadas em outras regiões do País.

A reposta desse desafio passa pela proposição de novos paradigmas sobre a ocupação humana na Amazônia e uma prática político-social que seja inovadora em seu cerne e forneça ferramental prático para a necessária inovação do desenvolvimento.

Nasce o Observatório da Região Metropolitana de Manaus

Sendo assim, apoiado na forte rede de organizações da sociedade civil comprometida com a proposição de projetos que levantem questionamentos e forneçam respostas aos novos padrões para a conservação da floresta aliado à melhora da qualidade de vida de seus povos (urbanos ou não), nasceu em 2014 o Observatório da Região Metropolitana de Manaus (ORMM).

O mesmo nasce da parceria e trabalho conjunto entre a Fundação Vitória Amazônica (FVA) e professores, grupos de pesquisa da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e parte das principais inovações do ORMM, frente a outras iniciativas semelhantes, se dá por meio de três pontos principais. A construção conjunta de estudos, eventos e orientações técnicas que visam influenciar diretamente políticas públicas setoriais com impacto direto na qualidade de vida da população; a aproximação e atuação forte junto à conselhos e câmaras técnicas dos governos municipal e estadual, de forma a construir ambiente propício à implantação e fortalecimento de estudos e, por último, o engajamento da sociedade civil para redação conjunta de proposições e orientações para a gestão pública que sejam baseados tecnicamente e contem com ampla discussão. Como exemplo, pode-se citar a positiva influência sobre a política estadual de gestão de recursos hídricos, através de seminário sobre o tema e redação da Carta das Águas de Manaus.

Assim, o Observatório vem conduzindo importantes e exitosas inovações ao fortalecer ferramentas de gestão e ao propor construção de políticas públicas que contem com maior participação social e embasamento técnico. Tal visão permite a proposição de abordagem sobre a ocupação humana na Amazônia que seja autêntica e baseada em preceitos locais.

Exemplo que muito consolida tais preceitos estruturantes do ORMM assim como suas principais linhas de ação é a 1ª Caravana do ORMM, iniciativa fomentada pela FVA e pelo CNPq, que levantou ao longo de fevereiro e março de 2019 o perfil socioeconômico de municípios da RMM e realizou audiências para melhor compreender a realidade local.

Tal ação teve como princípio a identificação de dificuldades municipais de gestão, levantamento de propostas e construção de um marco teórico-social pelo desenvolvimento regional, baseado principalmente no fato de se concentrar em municípios não contemplados no primeiro Plano de Desenvolvimento Integrado da RMM, finalizado em 2008 e nunca aplicado.

Dessa forma, os municípios de Careiro Castanho, à beira da BR-319, Manaquiri, próximo ao rio Solimões, Itapiranga e Silves, próximos ao Amazonas, foram palco da Caravana. Próximas de Manaus e acessíveis por via rodoviária possuem, todas, menos de 40 mil habitantes e apesar de suas peculiaridades a serem consideradas em planejamento de desenvolvimento pertinente, apresentam características semelhantes.

Atividades

Além dos poucos benefícios econômicos e sociais provenientes da proximidade de Manaus e da ausência de políticas conjuntas pelo desenvolvimento regional, apresentam pouquíssima oferta de empregos, concentrados na prefeitura; forte contato e dependência do setor primário (frutas, pesca e mandioca e seus derivados majoritariamente); falta de proposição inovadora de alternativas econômicas por parte do poder público e privado e ânsia pelo desenvolvimento e facilidades existentes em Manaus (por exemplo saúde e educação).

Consequentemente, a proximidade com os municípios, materializada no levantamento de dados e audiências, estruturam campo fértil para a ação em prol do planejamento e do desenvolvimento territorial que tenha respaldo e base nas relações urbano-rurais.

Tendo isso em vista, o momento é propício uma vez que vem se trabalhando, a reboque de essencial papel do governo do Estado, pelo desenvolvimento e consolidação do Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI) da RMM conforme preceitos do Estatuto da Metrópole.

O mesmo visa não apenas o diagnóstico e divisão espacial de atividades produtivas pelo espaço metropolitano como também, e principalmente, a proposição de cenários e programas que facilitem e permitam o ordenamento e desenvolvimento da região como um todo e a resposta conjunta às funções públicas de interesse comum que sejam passíveis de solução conjunta.

Novas possibilidades

Trabalhar pelo desenvolvimento da cidade e pela melhora das condições de vida de seus habitantes é também estruturar um campo fértil de ferramentas que permitam novas possibilidades de conservação na Amazônia.

Parte do desafio do trabalho pela aplicação de ferramentas de desenvolvimento territorial na Amazônia passa obrigatoriamente pela reinvenção da ocupação humana e pela restruturação do papel da rede de cidades amazônicas, da sua relação com seus interiores e pela formulação de respostas que fortaleçam a população ribeirinha e seus meios de vida.

Não há possibilidade de implantação de modelo de ocupação na Amazônia que não seja profundamente baseado e estruturado na consulta de seu povo e na construção de cadeias de valor de produtos locais que permitam a manutenção da cobertura florestal.

Como inverter a lógica de desenvolvimento e conservação da região amazônica para que ela se dê através das cidades como nodos de suporte das complexas e extensas cadeias de valor de produtos locais? Como permitir o surgimento e a estruturação de uma sociedade voltada para o fortalecimento da conservação e de mecanismos econômicos que permitam soluções efetivas? Como estruturar e fomentar a criação de um cenário de desenvolvimento inclusivo e sustentável para sua população? Como fortalecer a vocação da academia na construção de uma sociedade mais justa e inclusiva e permitir concomitantemente a conservação da Amazônia?

Iniciativas como o ORMM, além de fortalecer o respaldo social da academia, solidificar o embasamento técnico-teórico de políticas públicas e estreitar a participação social em processos de decisão, criam um novo cenário de trabalho e possibilidades na Amazônia ocidental e deve ser fortalecido como laboratório de práticas sociais.

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