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Mentiras que contam sobre a maconha

A cannabis não escapou das fake news

ilustração enviada pela equipe do Hempadão. foto retirada do site antigo.
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[Este é o Blog do Hempadão em CartaCapital. Acesse aqui o site]

A produção de fake news parece coisa do século 21, mas a história da maconha revela que esta planta já sofre há quase 100 anos com um bombardeio de notícias falsas.

Muito antes do WhatsApp, as mentiras sobre a cannabis eram disseminadas por livros, jornais, artigos científicos e até no cinema. Deu certo para eles: a maconha foi socialmente aceita como a “erva do diabo” e até hoje é difícil convencer parte da população que ela pode salvar vidas.

Boa parte das mentiras utilizadas como motivo para proibir a maconha já foram desqualificadas pela ciência, mas seguem sendo utilizadas até hoje, inclusive nos discursos políticos e médicos. Neste contexto, o questionamento de argumentos falaciosos é fundamental na luta pela legalização. O livro “Maconha: mitos e fatos” da socióloga Lynn Zimmer e do farmacologista John P. Morgan é uma ótima fonte de leitura sobre todo esse arcabouço de tolices que dizem sobre a erva.

Provavelmente o mito mais famoso sobre a maconha é história de que ela destrói neurônios. Essa história começou nos Estados Unidos, na década de 70, quando o uso da cannabis começou a ser associado a um comportamento preguiçoso e improdutivo.

A base científica se deu através de estudos com animais que receberam doses pesadas de THC (inclusive invejável), que eram até 100 vezes acima do normal para o consumo humano regular.

O que é fato nesta questão dos efeitos neurológicos é que a maconha afeta a memória de curto prazo (responsável por armazenar informações de rotina do dia-a-dia), mas de forma temporária. Passado o efeito da erva, a capacidade de memorizar informações volta ao normal, sem provocar danos permanentes.

E tem aquela história, que muitos certamente já ouviram, da maconha ser porta de entrada para outras drogas. Mentira feia! Se aproveitaram do fato de diferentes drogas ilícitas serem tratadas e comercializadas da mesma forma para estabelecer uma relação fisiológica entre elas, quando na verdade são substâncias com efeitos bem diferentes. Para boa parte dos usuários a maconha está mais para droga final do que uma porta de entrada.

A tática mais utilizada por defensores da teoria da porta de entrada e listar usuários de maconha que passaram a usar cocaína. O Brasil é carente de informações sobre este aspecto, mas dados de consumo dos Estados Unidos revelam que apenas 1 em cada 100 usuários de maconha também utiliza cocaína de forma frequente (uma vez por semana ou mais). Não existe nada na composição da maconha que desperte um interesse do usuário por outras drogas. É tipo de conexão tão absurda como dizer que pessoas que andam de bicicleta vão despertar um desejo incontrolável de andar de moto.

São muitas mentiras. Chegaram ao absurdo de relacionar o uso de maconha como algo capaz de estimular a realização de práticas criminosas. Em 1937, o diretor do Departamento de Narcóticos dos EUA, Harry Anslinger (um dos maiores lobistas pela proibição da cannabis), escreveu em artigo que “inúmeros homicídios, suicídios, roubos, agressões, assaltos e invasões de residências” são relacionados a insanidade provocada pelo uso de maconha. Nesta mesma época jornais abusavam do sensacionalismo ao relatar crimes supostamente cometidos por pessoas sob efeito da maconha. Infelizmente parte da imprensa segue trabalhando da mesma forma.

O que existe de estudo nesta linha prova justamente o contrário: a maconha reduz a hostilidade e raiva, mesmo em pessoas que estão sendo provocadas. O crime mais comum entre usuários da erva é fato de estarem comprando e portando algo ilegal.

É verdade que a maconha é uma droga, pode causar dependência (cerca de 9% dos usuários desenvolvem uso abusivo), mas tentar sustentar a proibição com mentiras listadas acima é uma ação inconsequente, que nada contribui para a preservação de vidas. Mudar uma legislação que se consolidou através de mentiras e preconceito (como abordado no texto que trata do racismo na proibição da maconha) é uma questão de justiça social.

Hempadão é um blog especializado em cultura canábica atuante desde 2009. Jornalismo e entretenimento com pitadas de poesia e informação. Saiba mais em http://hempadao.com/ ou fale conosco em [email protected]

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