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Confesso: me tornei admirador de Bolsonaro

‘Ele está colocando os militares em uma situação que a volta aos quartéis está sendo mais do que desejada, é algo que pode preservá-los’

Jair Bolsonaro
Jair Bolsonaro. Foto: EVARISTO SA / AFP Jair Bolsonaro. Foto: EVARISTO SA / AFP
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Durante muitos anos os democratas assistiram constrangidos os militares brasileiros se esquivando da prestação de contas das mortes, torturas e outras tantas atrocidades cometidas durante o regime militar. O Brasil é o único país em toda a América Latina em que os militares não se sentaram no banco dos réus. E nesse período vimos os militares, principalmente o alto generalato, pousando de democratas e proferindo louvas à democracia. Algo tão surreal como se imaginar um vegetariano defendendo as propriedades da carne animal.

Mas eis que surge Bolsonaro com sua candidatura presidencial, e trazendo como vice um general da reserva. Bolsonaro, capitão reformado do Exército por insubordinação, e sendo considerado pelos generais como mau soldado, surge para se redimir frente àqueles que tentaram execrá-lo da vida militar.

Nos primeiros instantes de seu mandato presidencial, o vice presidente, o general Mourão, ao ser questionado sobre a súbita ascensão de seu filho para o alto escalão do Banco do Brasil, onde era funcionário subalterno, simplesmente brada que aquele não era o objetivo da entrevista e que não mais falaria sobre tal assunto. Repetia em sua conduta o que sempre víamos do generalato: um posicionamento que não aceita qualquer questionamento de sua atitude.

O que o general Mourão não sabia é que essa verve autoritária seria abrandada pelo bravo capitão Bolsonaro. Hoje chega a ser constrangedor ver o general Mourão tentando explicar as tantas incongruências do seu superior. E até nisso ele já teve demonstração de que tem prazo de validade para breve, pois o capitão Bolsonaro já ventilou que numa próxima candidatura poderá ter como vice de sua chapa alguém do leque político civil.

Bolsonaro, desde o início de seu mandato, nomeou para os ministérios e principais secretarias militares das mais diferentes patentes, inclusive generais da ativa. Militarizou seus ministérios e secretarias como nem a ditadura militar havia efetivado. E aos poucos, começou a humilhar esses assessores publicamente. Fosse general ou qualquer outra patente, ele começou a insultá-los e a dispensá-los do governo.

Tivemos recentemente a humilhação imposta ao general Pazuello, militar ainda da ativa e considerado um grande estrategista na área da logística, que foi alçado ao Ministério da Saúde tendo como uma de suas principais missões defender e viabilizar junto aos órgãos da saúde a posição negacionista do governo Bolsonaro frente à pandemia que assola todo o planeta. O capitão Bolsonaro o repeliu publicamente se posicionando contrário ao que havia sugerido, e o general Pazuello simplesmente disse que um manda e outro obedece.

E Bolsonaro, quando não humilha e desfaz pessoalmente desses militares, usa seus filhos e outros assessores para igualmente destratá-los de modo impiedoso. Bolsonaro está colocando os militares em uma situação que a volta aos quartéis está sendo mais do que desejada, é algo que pode preservá-los de algum resquício de dignidade, se ainda restar. Mais do que uma mera vingança por ter sido expulso do seio militar, Bolsonaro igualmente tripudia sobre todos que veneravam essa alta patente militar como seres devidamente qualificados e, principalmente acima dos civis.

Neste momento, mais do que se questionar a necessidade de Exército em país com tamanhas desigualdades sociais, em que, apesar do grande arsenal armamentista, não será possível se enfrentar qualquer potência minimamente armada, o que Bolsonaro faz é exibir a falta de condição cognitiva e até mesmo moral desses militares diante da sujeição imposta a alguns representantes de seu alto comando.

Bolsonaro está exibindo matizes precisas de que o único papel relevante do Exército é ameaçar a população civil de possível golpe armado se seus interesses forem contrariados – leia-se, nesse sentido, seu alinhamento automático com os interesses estadunidenses. Bolsonaro está agindo com os militares de modo que, talvez, nem mesmo seus inimigos ousariam conceber.

Bolsonaro também está acossando de modo avassalador as pilastras do Judiciário, algo que igualmente exibe suas vísceras de modo inconteste. Inicialmente trouxe o ex-juiz Sérgio Moro para seu ministério. Desmoralizou totalmente o antigo paladino da moralidade trazendo-o para um governo acusado dos mais diferentes teores de corrupção, principalmente aos filhos de seu grande líder, o capitão Bolsonaro.

Moro teve que hesitar por diversas vezes e fazer inúmeros contorcionismos para tentar se esquivar das acusações de corrupção que o governo do qual fazia parte sofria continuamente. Moro saiu blasfemando contra seu antigo líder, como se não fosse um dos principais criadores da criatura denominada Bolsonaro.

Bolsonaro sempre tratou de bradar aos quatro cantos que iria nomear para todos os cargos do judiciário que são prerrogativas suas, juristas com quem tivesse afinidades pessoais. E então, passamos a ouvir referências a promotores e juízes bolsonaristas. E desde ministros da Suprema Corte até instância inferiores, tudo, absolutamente tudo, ficou escancarado que atenderia aos seus interesses pessoais, e principalmente na defesa das acusações de que seus filhos são alvos.

O capitão Bolsonaro mostrou ainda que todas as acusações que cercavam o ministro do SFT Dias Toffoli, de que este não possuía notório saber para fazer parte da alta corte do País, afinal, não conseguira sequer ser aprovado em concursos para a magistratura, eram abstrações irreais diante do que ele expos. Bolsonaro mostrou que após alguns encontros e mimos ao ministro Toffoli, então presidente do STF, coincidência ou não, algumas decisões monocráticas de sua autoria sempre beneficiaram o clã Bolsonaro. Decisões que na quase maioria das vezes foram rechaçadas por seus pares como se esses estivessem diante de algo inusitado. Igualmente mostrou que proximidade com ministros da Suprema Corte em nome de apaziguamento das relações entre os poderes era senha para outros interesses.

Diante disso tudo, confesso: me tornei admirador de Bolsonaro.

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