Sociedade

Ocupação de sem teto tem creche, filmes e planeja biblioteca

“Estamos fazendo o trabalho que o Estado deveria estar fazendo. Quem organiza tudo é a gente,” diz coordenadora da ocupação

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Josilene Maria, de 28 anos, trabalhava como cozinheira na zona leste de São Paulo. Mãe de duas filhas, uma com um ano e outra com três, ela se demitiu do trabalho porque não tinha quem cuidasse das crianças. “Eu deixava elas com a minha mãe, mas ela se mudou da cidade e eu tive que largar o serviço,” conta. A dificuldade só foi resolvida quando Josilene se mudou para uma ocupação sem teto, onde há uma creche organizada e mantida pelos moradores.

“A creche foi muito importante, me deu a oportunidade de eu poder trabalhar de novo”, diz. Agora que as filhas têm onde ficar, ela será contratada como auxiliar de serviços gerais num local próximo à ocupação onde mora.

A creche da ocupação atende sete crianças, além de outras que a frequentam esporadicamente. Cada mãe deve cadastrar o filho e pagar uma taxa de 100 reais por mês, que é revertida para a manutenção e para a profissional que cuida das crianças. Flavia de Castro, responsável pela creche, mora na ocupação e ganha cerca de 600 reais por mês pelo trabalho.

 

A creche fica dentro de um prédio ocupado próximo à Praça da República, no centro da cidade, onde vivem 120 famílias. O local tem brinquedos, um tatame e almofadas onde as crianças podem descansar. Em breve, eles pretendem adquirir uma cadeirinha para alimentar as crianças, isolar o local com uma tela, fazer prontuários médicos e uniformes com a bandeira do movimento social, o MMPT (Movimento Moradia para Todos).

“Estamos fazendo o trabalho que o Estado deveria estar fazendo. Quem organiza tudo é a gente,” diz a coordenadora da ocupação, Welita Caetano, de 28 anos. “Dentro da ocupação precisa ter vida. Não adianta você fechar um monte de quartinhos, colocar um monte de família aqui dentro e deixar cada uma na sua.”

Welita diz que a creche dentro da ocupação ajuda a demanda do movimento no Ministério Público e a Defensoria Pública. Ela conta que outra ocupação, posteriormente desapropriada no centro da cidade, só foi mantida porque havia uma creche dentro dela.

Cinema, cozinha comunitária e biblioteca. Além da creche, os moradores também contam com seções de cinema, uma cozinha comunitária e tentam criar uma biblioteca. Uma exibição de filmes semanal com as crianças ocorre há meses. Desde a semana passada, outra sala de projeção serve aos adultos. As lideranças do movimento também tentam criar uma biblioteca no local. Eles estão organizando o acervo e preparando a sala para receber os livros.

Uma cozinha comunitária também funciona na ocupação. Ela é mantida por contribuições e trabalho voluntário dos próprios moradores. Uma vez por semana, as famílias vão ao mercado municipal pedir doações. O restante dos alimentos é comprado pelos sem teto.

Organização. O funcionamento da ocupação é mantido com uma organização rígida. Na portaria, os moradores se revezam em turnos de três horas cada. O barulho é proibido depois das dez da noite e o uso de qualquer droga não é tolerado dentro do prédio. As portas de cada dormitório contém a hora de entrada e saída do morador. Assim, é possível saber se há espaço inutilizado no prédio.

As vagas em todas as sete ocupações do movimento são catalogadas em um escritório onde funcionários mantêm os dados de todos os moradores digitalizados. Aos domingos, há reuniões abertas para receber quem necessita de moradia e cadastrá-los junto ao movimento.

Reivindicações. O movimento não pede a posse do prédios. Eles defendem a sua desapropriação e a destinação dele ao aluguel-social.  Com ele, os moradores não se tornam proprietários, mas teriam o direito de viver no local pagando um valor reduzido. “Se for um prédio inteiro fechado, pode ser de 300 a 400 reais por pessoa. Isso funciona bem no exterior, na Itália e em outros países,” diz Welita.

O secretário municipal de Habitação de São Paulo, José Floriano, recebeu o movimento somente uma vez desde a sua posse. Procurada pela reportagem, a secretária da Habitação do município disse, em nota, que ainda não tem uma posição sobre as ocupações do movimento. “Estamos mapeando a situação para estudar a viabilidade dos casos.”

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