Sociedade

Entenda a crise no presídio de Alcaçuz, no Rio Grande do Norte

Caos na penitenciária de Nísia Floresta mostra a incapacidade do País de cuidar de sua população carcerária

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Há seis dias, a Penitenciária Estadual de Alcaçuz, em Nísia Floresta (RN), é símbolo do caos carcerário existente no Brasil e que, nos primeiros dias de 2017, em meio a uma aguda crise, deixou mais de 130 presos mortosNesta quinta-feira 19, o tenso cenário no presídio escalou a um novo patamar, com uma batalha campal entre detentos, observada de longe por policiais incapazes de tomar controle da situação. 

Alcaçuz entrou no noticiário por ter sido palco, no sábado 14, do terceiro maior massacre do ano dentro de presídios. Naquele fim de semana, integrantes do Primeiro Comando da Capital mataram 26 homens do Sindicato do Crime do Rio Grande do Norte (SDC), dissidência do PCC surgida em 2015. Desde então, o presídio está em rebelião constante, sendo que na terça-feira 17, integrantes do PCC e do SDC montaram barricadas com grades, chapas de ferro, armários e colchões para manter afastados seus rivais.

O que está acontecendo no presídio de Alcaçuz nesta quinta-feira 19?

Desde as primeiras horas do dia, presos de duas facções rivais, o PCC e o SDC, estão se enfrentando com paus, pedras e barras de ferro, em uma aparente disputa pelo controle do presídio.

De acordo com o major da Polícia Militar Eduardo Franco, os detentos também carregam armas de fogo. “Os presos estão armados e se matando”, disse ele ao portal G1“Está todo mundo armado. A sorte é que eles não estão atirando contra as guaritas, senão teríamos que revidar”, disse.

Ainda segundo a PM, policiais nas guaritas da prisão dispararam tiros para tentar evitar o confronto. Do lado de fora, forças especiais e um helicóptero monitoram a situação para tentar evitar fugas.

Facilita a ação dos presos o fato de eles circularem livremente no presídio, uma vez que as celas da prisão estão sem grades desde uma rebelião ocorrida em março de 2015.  

Qual é o motivo do confronto entre os presos?

O clima na penitenciária de Alcaçuz se acirrou nesta quinta-feira 19 por conta da transferência de 220 presos ligados ao Sindicato do Crime RN, realizada na quarta-feira 18 pelo governo de Robinson Faria (PSD).

A retirada dos presos teria sido um pedido dos líderes do PCC, que foram contatados por dois negociadores designados pelo governo estadual, uma delegada da Polícia Civil e um oficial da PM, segundo o jornal O Globo.

Por que a transferência de presos acirrou os ânimos?

De acordo com o próprio secretário de Justiça e Cidadania do Rio Grande do Norte, Wallber Virgolino, a transferência reduziu a diferença entre o número de presos ligados ao SDC e a quantidade de membros do PCC, aumentando a possibilidade de conflito. 

Em entrevista à revista Época, Virgolino afirmou que a decisão do governador Robinson Faria desrespeitou as recomendações feitas por ele e pelos serviços de inteligência policiais, que era retirar o PCC do presídio, e não o SDC. “Não foi levado em consideração o que o secretário de Justiça e a inteligência disseram. Sugeri que tirassem o PCC do presídio”, afirmou.

A recomendação do secretário, entretanto, é discutível. Em entrevista ao jornal El País Brasil, parentes de presos do PCC temiam que a transferência os deixasse vulneráveis a massacres em outros presídios, tendo em vista que o SDC domina as principais cadeias do Rio Grande do Norte.

O caos no presídio chegou às ruas do Rio Grande do Norte?

Sim, após o anúncio da transferência do presos do SDC, a facção criminosa local realizou uma série de ataques, principalmente em Natal. Ao todo, 21 veículos, incluindo ônibus, microônibus e um carro oficial do governo estadual foram incendiados.

Além disso, uma rebelião iniciada no fim da tarde de quarta-feira no Presídio Estadual do Seridó, em Cairó, no interior do estado, deixou um detento morto e cinco feridos.

Também houve confronto nas cercanias do presídio, entre os familiares dos presos. Conforme relato da Folha de S.Paulo, as mulheres dos presos também se separaram seguindo as divisões de seus companheiros. 

“Elas acham que porque os maridos delas são do PCC, podem tomar partido deles. Acho errado, mas se elas vierem, a gente vai se defender”, disse ao jornal uma mulher cujo marido na ala do SDC. “A gente não ousa pisar no lado delas, mas não aceitamos elas aqui. A regra deles [presos] vale para nós. É matar ou morrer”, afirmou a mulher de um integrante do PCC.

Contra a transferência dos presos, familiares de membros do SDC montaram barricadas com fogo em uma rua próxima ao presídio e foram reprimidos por policiais militares, com tiros de bala de borracha.

A transferência dos presos foi concluída?

Parcialmente. A ideia inicial era realizar uma permuta de presos, levando os 220 homens de Alcaçuz para três presídios diferentes, todos no Rio Grande do Norte. Alcaçuz, por sua vez, receberia 116 detentos da Penitenciária Estadual de Parnamirim, também na Região Metropolitana de Natal.

A juíza corregedora de Alcaçuz, Maria Nilvalda Torquato, proibiu, no entanto, a entrada de novos presos no presídio. “Os presos foram retirados à revelia e transferidos para Alcaçuz, correndo sérios riscos de morte, em especial porque a rebelião na unidade não foi controlada”, afirmou a magistrada.

Os 116 homens que saíram de Parnamirim foram parar na Cadeia Pública de Natal, que tem capacidade para acomodar até 216 presos e tinha, até a semana passada, 560 detentos. Agora, o presídio tem 676 homens, mais de três vezes mais que o limite.

O que o governo estadual e o federal vão fazer agora?

A intenção do governo estadual é retomar o controle do presídio por meio de uma intervenção policial de larga escala. “A curto prazo agora é evitar uma nova briga, uma nova matança entre eles. Em um segundo momento vamos transferir os presos das facções para presídios separadamente”, disse o governador Robinson Faria.

Policiais militares do Batalhão de Choque e do Batalhão de Operações Especiais (BOPE) do Rio Grande do Norte já invadiram a penitenciária para retomar o controle. Faria afirmou que pretende construir “uma parede física para separar o PCC do Sindicato do RN”. Enquanto a barreira não é erguida, a PM vai formar uma espécie de “paredão humano”.

O governo federal, por sua vez, autorizou o envio das Forças Armadas para Natal para reforçar a segurança nas ruas da cidade.

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