Sociedade

De Mozart a Cindy Sherman

Os desafios para quem quer ser um artista autônomo e empreendedor da sua própria obra

Mozart, que tentou ser autônomo e empreendedor da própria obra
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Wolfgang Amadeus Mozart nasceu em 1757, em Salzburgo. Foi compositor prolífico e é considerado um dos maiores gênios da música de todos os tempos. Cindy Sherman nasceu em New Jersey, em 1954. Vive e trabalha em Nova York. É uma das mais renomadas e reconhecidas fotógrafas contemporâneas.

Comparar artistas tão diferentes, de épocas tão distintas, é temerário. Além disso, diante de Mozart, qualquer artista empalidece. Feita a ressalva, lança-se o argumento: há uma instigante relação entre as trajetórias profissionais de Mozart e Sherman, ainda que separados por dois séculos e dois continentes.

Em 1781, Mozart deixou os serviços do arcebispo de Salzburgo para tentar a sorte como músico autônomo, em Viena. Nos dez anos seguintes, tentou a sorte como empreendedor de si mesmo, algo novo para a época. Escapou dos gostos e caprichos de seus antigos protetores, porém teve de se curvar ao tal do mercado.

Quando iniciava uma composição, perguntava-se: como compor para esse novo público dos concertos?

Quando se preparava para apresentar uma obra, indagava-se: o que fazer para agradar o público? Mozart morreu aos 35 anos. Estava endividado. Sentia-se derrotado, marcado pela sensação de fracasso. Pagou preço alto por seu pioneirismo e audácia.

Passados 200 anos, artistas dos mais variados campos continuam enfrentando o mesmo dilema: como equilibrar a liberdade de criação e o atendimento das necessidades básicas de sobrevivência? Tal dilema não afeta apenas artistas. Muitos profissionais liberais lutam para balancear a liberdade de ação com as contas domésticas. Muitos executivos sonham com o dia em que escaparão de suas gaiolas corporativas. Alguns deles consumam a fuga, mas logo percebem que o doce sabor da liberdade vem acompanhado pelo gosto amargo de uma nova submissão: troca-se um chefe incapaz e neurótico por uma dezena de clientes caprichosos e tirânicos.

Para os velhos e novos sonhadores, a trajetória profissional de Cindy Sherman pode ser inspiradora. Sherman iniciou seus estudos de artes pela pintura, mas logo a trocou pela fotografia. Teve a sorte de estudar e viver em um ambiente de experimentação: sua curiosidade e sua criatividade foram estimuladas por professores e colegas que exploravam novas formas de expressão artística.

O reconhecimento veio com as primeiras obras e prolongou-se ao longo da carreira. Em 1995, Sherman ganhou uma bolsa de 500 mil dólares da Fundação MacArthur, conhecida como o prêmio dos gênios. Em 2011, uma de suas fotos foi vendida na casa de leilões Christie’s por 3,9 milhões de dólares, tornando-se, na época, a mais cara fotografia vendida em um leilão de arte. A fama e o sucesso não alteraram seu modelo comercial. Desde o início de sua carreira, a fotógrafa mantém-se fiel a duas galerias que a representam, uma norte-americana e outra europeia. Nenhuma a pressiona por produção.

A fotógrafa trabalha em séries temáticas. Para criar suas obras, labuta solitária em seu estúdio, alternando os papéis de criadora, diretora, iluminadora, estilista, maquiadora, modelo e fotógrafa. Uma de suas séries mais famosas – Untitled Film Stills, desenvolvida de 1977 a 1980 – contém 69 imagens de mulheres, sempre representadas pela própria artista.

Nem todos os trabalhos de Sherman tiveram tanto impacto e sucesso comercial quanto Untitled Film Stills, porém revelam uma artista em constante movimento, sempre capaz de avançar sobre seus próprios limites e provocar sua audiência. Até 11 de junho de 2012, o Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) apresenta uma ampla exposição do trabalho da artista, com mais de 170 obras produzidas desde meados da década de 1970 até o presente. A exposição é mais um reconhecimento da importância de Sherman para a fotografia e para as artes. O website do MoMA disponibiliza uma visita virtual à exposição.

Cindy Sherman, de certa forma, realizou o sonho de Mozart. Assim como o músico, a fotógrafa encontrou cedo (embora não tão cedo quanto Mozart) o seu meio de expressão e a sua voz. Lançou-se como artista autônoma e empreendedora de sua própria obra. Trabalha sozinha. Controla seus temas, seu ritmo de atividade. Domina os meios de produção e canais de acesso ao mercado. Sua matéria-prima é sua humanidade: suas inquietações diante do mundo e suas representações. Seu combustível é sua curiosidade sobre os meios para representar suas ideias.

O mercado é uma entidade real, capaz de recompensar regiamente seu trabalho, mas não lhe atormenta a alma ou condiciona seus caminhos. Sua privilegiada situação é ainda um sonho para poucos, mas representa uma -possibilidade, uma luz no fim do túnel.

Wolfgang Amadeus Mozart nasceu em 1757, em Salzburgo. Foi compositor prolífico e é considerado um dos maiores gênios da música de todos os tempos. Cindy Sherman nasceu em New Jersey, em 1954. Vive e trabalha em Nova York. É uma das mais renomadas e reconhecidas fotógrafas contemporâneas.

Comparar artistas tão diferentes, de épocas tão distintas, é temerário. Além disso, diante de Mozart, qualquer artista empalidece. Feita a ressalva, lança-se o argumento: há uma instigante relação entre as trajetórias profissionais de Mozart e Sherman, ainda que separados por dois séculos e dois continentes.

Em 1781, Mozart deixou os serviços do arcebispo de Salzburgo para tentar a sorte como músico autônomo, em Viena. Nos dez anos seguintes, tentou a sorte como empreendedor de si mesmo, algo novo para a época. Escapou dos gostos e caprichos de seus antigos protetores, porém teve de se curvar ao tal do mercado.

Quando iniciava uma composição, perguntava-se: como compor para esse novo público dos concertos?

Quando se preparava para apresentar uma obra, indagava-se: o que fazer para agradar o público? Mozart morreu aos 35 anos. Estava endividado. Sentia-se derrotado, marcado pela sensação de fracasso. Pagou preço alto por seu pioneirismo e audácia.

Passados 200 anos, artistas dos mais variados campos continuam enfrentando o mesmo dilema: como equilibrar a liberdade de criação e o atendimento das necessidades básicas de sobrevivência? Tal dilema não afeta apenas artistas. Muitos profissionais liberais lutam para balancear a liberdade de ação com as contas domésticas. Muitos executivos sonham com o dia em que escaparão de suas gaiolas corporativas. Alguns deles consumam a fuga, mas logo percebem que o doce sabor da liberdade vem acompanhado pelo gosto amargo de uma nova submissão: troca-se um chefe incapaz e neurótico por uma dezena de clientes caprichosos e tirânicos.

Para os velhos e novos sonhadores, a trajetória profissional de Cindy Sherman pode ser inspiradora. Sherman iniciou seus estudos de artes pela pintura, mas logo a trocou pela fotografia. Teve a sorte de estudar e viver em um ambiente de experimentação: sua curiosidade e sua criatividade foram estimuladas por professores e colegas que exploravam novas formas de expressão artística.

O reconhecimento veio com as primeiras obras e prolongou-se ao longo da carreira. Em 1995, Sherman ganhou uma bolsa de 500 mil dólares da Fundação MacArthur, conhecida como o prêmio dos gênios. Em 2011, uma de suas fotos foi vendida na casa de leilões Christie’s por 3,9 milhões de dólares, tornando-se, na época, a mais cara fotografia vendida em um leilão de arte. A fama e o sucesso não alteraram seu modelo comercial. Desde o início de sua carreira, a fotógrafa mantém-se fiel a duas galerias que a representam, uma norte-americana e outra europeia. Nenhuma a pressiona por produção.

A fotógrafa trabalha em séries temáticas. Para criar suas obras, labuta solitária em seu estúdio, alternando os papéis de criadora, diretora, iluminadora, estilista, maquiadora, modelo e fotógrafa. Uma de suas séries mais famosas – Untitled Film Stills, desenvolvida de 1977 a 1980 – contém 69 imagens de mulheres, sempre representadas pela própria artista.

Nem todos os trabalhos de Sherman tiveram tanto impacto e sucesso comercial quanto Untitled Film Stills, porém revelam uma artista em constante movimento, sempre capaz de avançar sobre seus próprios limites e provocar sua audiência. Até 11 de junho de 2012, o Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) apresenta uma ampla exposição do trabalho da artista, com mais de 170 obras produzidas desde meados da década de 1970 até o presente. A exposição é mais um reconhecimento da importância de Sherman para a fotografia e para as artes. O website do MoMA disponibiliza uma visita virtual à exposição.

Cindy Sherman, de certa forma, realizou o sonho de Mozart. Assim como o músico, a fotógrafa encontrou cedo (embora não tão cedo quanto Mozart) o seu meio de expressão e a sua voz. Lançou-se como artista autônoma e empreendedora de sua própria obra. Trabalha sozinha. Controla seus temas, seu ritmo de atividade. Domina os meios de produção e canais de acesso ao mercado. Sua matéria-prima é sua humanidade: suas inquietações diante do mundo e suas representações. Seu combustível é sua curiosidade sobre os meios para representar suas ideias.

O mercado é uma entidade real, capaz de recompensar regiamente seu trabalho, mas não lhe atormenta a alma ou condiciona seus caminhos. Sua privilegiada situação é ainda um sonho para poucos, mas representa uma -possibilidade, uma luz no fim do túnel.

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