Saúde

A prevenção faz sentido?

Com a Aids fora de controle, há esperança no uso de coquetéis para evitar o contágio, explica o médico Esper Kallas, da USP

Cautela. Especialistas esperam que o efeito da profilaxia seja confirmado por novos estudos. Foto: Philippe Lissa/Photononstop/AFP
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A infecção por HIV e a resultante Aids continuam preocupando o mundo médico. Somente em 2011, mais de 2 milhões de pessoas foram contaminadas. A maioria em países com condições econômicas limitadas e acesso restrito ao coquetel de tratamento.  É uma epidemia ainda hoje fora de controle. Uma discussão extensa foi publicada esta semana na revista médica New England Journal of Medicine, sobre a novidade que poderá ter um grande impacto no assunto. A profilaxia, ou prevenção pré-exposição: tomar algum medicamento antes do contato de risco, prevenindo a infecção. Já pela discussão se percebe que a eficiência e a aplicação ainda não estão claras. Conversamos sobre esse importante tema com o doutor Esper Kallas, infectologista e professor da Faculdade de Medicina da USP.

CartaCapital: Temos novidades no manejo da Aids?


Esper Kallas: Sem dúvida. Estávamos ansiosos por novas estratégias para combater o avanço dessa grave epidemia, especialmente na área da prevenção.

CC: O que apareceu recentemente?


EK: Os anos 2010 e 2011 trouxeram boas notícias na pesquisa sobre o combate à transmissão do vírus, especialmente utilizando remédios anti-HIV como forma de prevenção. A primeira foi o uso preventivo em pessoas que não são infectadas, mas que se expõem com frequência ao vírus em relações sexuais de alto risco, conhecida como profilaxia pré-exposição (PrEP, em inglês). A segunda foi a demonstração de que o uso do coquetel de drogas em pessoas já infectadas, com consequente diminuição da quantidade do HIV no sangue e nas secreções genitais, diminui muito a frequência com que o vírus é transmitido para pessoas não infectadas, o tratamento como prevenção.

CC: Essas estratégias já devem ser adotadas na rotina?


EK: A estratégia da prevenção já motivou modificações em saúde pública em vários países, inclusive o Brasil. Aqui, a recomendação de uso do coquetel mudou, sugerindo agora que ele seja iniciado um tanto mais cedo nas pessoas que convivem com o HIV.

CC: E a prevenção pré-exposição à infecção?


EK: Diferentemente da indicação acima, o emprego da PrEP em saúde pública continua aguardando mais informações. Embora tenha sido demonstrada sua capacidade de prevenção em pessoas vulneráveis que ainda não têm o vírus, em especial homens, travestis e mulheres transgênero que fazem sexo com homens e pessoas não infectadas que mantêm relações sexuais com outras que convivem com o vírus, muitos especialistas esperam que o efeito protetor seja confirmado com estudos adicionais.

CC: Como seu grupo de pesquisa tem abordado essa questão especificamente?


EK: Em trabalho recente do nosso grupo na Disciplina de Imunologia da USP, foi estudada a correlação entre a presença dos remédios preventivos no sangue, em particular uma droga de nome Tenofovir, com a capacidade de prevenção contra a aquisição do HIV. Os resultados apontam que, se tomado diariamente, este medicamento pode prevenir até 99% das infecções pelo HIV. Também é possível que o uso de uma pílula quatro vezes por semana possa conferir proteção de até 96%.

CC: Esse estudo poderá modificar o tratamento e a prevenção da Aids?


EK: Realmente, esses resultados abrem portas para que se possa discutir outros esquemas de utilização de remédios para prevenir a transmissão do HIV. Será que podem ser empregados esquemas mais simples? Podemos facilitar e baratear o uso de PrEP? É possível reduzir os efeitos colaterais associados ao uso desses remédios? É importante, todavia, reforçar que nada exime o emprego das medidas de prevenção habituais, que são o uso da camisinha, o diagnóstico e tratamento de doenças sexualmente transmissíveis, os testes frequentes e a redução das práticas que trazem risco de infecção por HIV. Mas as novas estratégias de combate à doença, em particular o tratamento e o emprego de PrEP, são uma excelente oportunidade para se rediscutir a prevenção no Brasil e no mundo, particularmente a direcionada aos grupos mais vulneráveis à infecção por HIV.

A infecção por HIV e a resultante Aids continuam preocupando o mundo médico. Somente em 2011, mais de 2 milhões de pessoas foram contaminadas. A maioria em países com condições econômicas limitadas e acesso restrito ao coquetel de tratamento.  É uma epidemia ainda hoje fora de controle. Uma discussão extensa foi publicada esta semana na revista médica New England Journal of Medicine, sobre a novidade que poderá ter um grande impacto no assunto. A profilaxia, ou prevenção pré-exposição: tomar algum medicamento antes do contato de risco, prevenindo a infecção. Já pela discussão se percebe que a eficiência e a aplicação ainda não estão claras. Conversamos sobre esse importante tema com o doutor Esper Kallas, infectologista e professor da Faculdade de Medicina da USP.

CartaCapital: Temos novidades no manejo da Aids?


Esper Kallas: Sem dúvida. Estávamos ansiosos por novas estratégias para combater o avanço dessa grave epidemia, especialmente na área da prevenção.

CC: O que apareceu recentemente?


EK: Os anos 2010 e 2011 trouxeram boas notícias na pesquisa sobre o combate à transmissão do vírus, especialmente utilizando remédios anti-HIV como forma de prevenção. A primeira foi o uso preventivo em pessoas que não são infectadas, mas que se expõem com frequência ao vírus em relações sexuais de alto risco, conhecida como profilaxia pré-exposição (PrEP, em inglês). A segunda foi a demonstração de que o uso do coquetel de drogas em pessoas já infectadas, com consequente diminuição da quantidade do HIV no sangue e nas secreções genitais, diminui muito a frequência com que o vírus é transmitido para pessoas não infectadas, o tratamento como prevenção.

CC: Essas estratégias já devem ser adotadas na rotina?


EK: A estratégia da prevenção já motivou modificações em saúde pública em vários países, inclusive o Brasil. Aqui, a recomendação de uso do coquetel mudou, sugerindo agora que ele seja iniciado um tanto mais cedo nas pessoas que convivem com o HIV.

CC: E a prevenção pré-exposição à infecção?


EK: Diferentemente da indicação acima, o emprego da PrEP em saúde pública continua aguardando mais informações. Embora tenha sido demonstrada sua capacidade de prevenção em pessoas vulneráveis que ainda não têm o vírus, em especial homens, travestis e mulheres transgênero que fazem sexo com homens e pessoas não infectadas que mantêm relações sexuais com outras que convivem com o vírus, muitos especialistas esperam que o efeito protetor seja confirmado com estudos adicionais.

CC: Como seu grupo de pesquisa tem abordado essa questão especificamente?


EK: Em trabalho recente do nosso grupo na Disciplina de Imunologia da USP, foi estudada a correlação entre a presença dos remédios preventivos no sangue, em particular uma droga de nome Tenofovir, com a capacidade de prevenção contra a aquisição do HIV. Os resultados apontam que, se tomado diariamente, este medicamento pode prevenir até 99% das infecções pelo HIV. Também é possível que o uso de uma pílula quatro vezes por semana possa conferir proteção de até 96%.

CC: Esse estudo poderá modificar o tratamento e a prevenção da Aids?


EK: Realmente, esses resultados abrem portas para que se possa discutir outros esquemas de utilização de remédios para prevenir a transmissão do HIV. Será que podem ser empregados esquemas mais simples? Podemos facilitar e baratear o uso de PrEP? É possível reduzir os efeitos colaterais associados ao uso desses remédios? É importante, todavia, reforçar que nada exime o emprego das medidas de prevenção habituais, que são o uso da camisinha, o diagnóstico e tratamento de doenças sexualmente transmissíveis, os testes frequentes e a redução das práticas que trazem risco de infecção por HIV. Mas as novas estratégias de combate à doença, em particular o tratamento e o emprego de PrEP, são uma excelente oportunidade para se rediscutir a prevenção no Brasil e no mundo, particularmente a direcionada aos grupos mais vulneráveis à infecção por HIV.

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