Política

Maluf: a água nas narinas

Condenado a devolver 22 milhões de dólares à cidade de São Paulo, o deputado torce para seu crime prescrever no Brasil

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O deputado federal Paulo Salim Maluf sente a água próxima às narinas e calafrios no bolso em face de desfalques ordenados pelas Justiças internacional e nacional. Ao que se nota, apenas o seu cacife político, apesar de ação civil de improbidade administrativa em curso, continua com lastro. Maluf é poupado por seus pares, relutantes em instaurar, para perda do seu mandato, processo ético-disciplinar. Se sair do Brasil, será preso por força de mandado internacional. Diante do cerco, o deputado teve de se adaptar: trocou Paris e Monte Carlo por Campos do Jordão e Guarujá.

Maluf se segura na Constituição, que não permite a extradição criminal de brasileiros natos. E também consagra o princípio de ninguém ser obrigado a se autoacusar. Como a mentira, no nosso direito, não é tipificada como crime, Maluf, com base nela, continua a negar tudo. Sustenta, por exemplo, não lhe dizer respeito a recentíssima sentença da Corte Real de Jersey a determinar a devolução, para a municipalidade de São Paulo, de 22 milhões de dólares, importância atualizada até o fechamento do ano fiscal de 1999.

Para ocultação da identidade dos endinheirados, o mundo capitalista admite os chamados “espaços livres do Direito” e, com a facilidade, apareceu uma miríade de empresas offshore. Elas aumentaram depois da tragédia de 11 de setembro, pela proibição das contas despersonalizadas: no Panamá podia-se abrir conta corrente bancária com qualquer nome ou combinação de números. Nem a instituição bancária conhecia a identidade do correntista.

No paraíso fiscal da Ilha de Jersey foram bloqueados capitais nas contas Chanani e Durant. As contas seriam geridas por Maluf e seu filho Flávio. Segundo os procuradores Rodrigo de Grandis e Sílvio Marques, essas contas foram irrigadas com pagamento de comissão ilegal da superfaturada obra da Avenida Água Espraiada, quando Maluf era prefeito. A Real Corte de Justiça de Jersey, diante das evidências de ilicitude, acabou de decidir que os valores movimentados pelas offshore devem ser restituídos à cidade.

Pelas investigações, Maluf e o filho receberam 11,1 milhões de dólares da empreiteira Mendes Júnior. Para as contas da ­offshore Chanani, aberta no Safra National Bank of New York, a dupla repassou 10,5 milhões no período de janeiro a fevereiro de 1988. Depois, foram efetivas transferências da Chanani para a Durant International Corporation no período de 22 de janeiro a 20 de fevereiro de 1988. A Durant tem sede fiscal na Ilha de Jersey. Na origem de tudo está a empreiteira Mendes Júnior, que recebeu da Empresa Municipal de Urbanização (Emurb) o equivalente a 57,2 milhões de dólares pela construção da Água Espraiada. O suborno de Maluf foi estimado em 20% do valor da obra. A consumação dos crimes de corrupção ativa e passiva, consoante os representantes do Ministério Público, ocorreram quando Maluf era prefeito. Nas ilegais operações de lavagens, as movimentações interbancárias foram feitas em cinco semanas.

Maluf goza de foro privilegiado e, até agora, teve declarada a extinção da punibilidade pela prescrição no crime de formação de quadrilha. O prazo prescricional, por ele ter mais de 70 anos, foi contado pela metade. No Congresso Nacional tramita a apelidada ­emenda constitucional da bengala, que aumentaria de 70 para 75 anos a idade de aposentadoria de magistrados, procuradores e funcionários públicos. Mas não existe um projeto pontual e urgente para alterar o artigo do Código Penal que aumente para 75 anos o benefício do prazo prescricional pela metade, ainda que não se possa aplicar retroativamente ao já octogenário Maluf.

Na contramão da tendência internacional, não existe no Brasil projeto a garantir, ao réu acusado, o direito de renunciar à prescrição. No mundo civilizado descobriu-se ser um direito natural do réu de buscar uma sentença que conclua pela absolvição e não pela prescrição da ação pela demora do julgamento. Por aqui, o juiz está obrigado a decretar a prescrição e Maluf jamais renunciaria à prescrição. Na Itália, onde é possível, o ex-premier Silvio Berlusconi não renunciou e justificou-se: disse não confiar na Justiça.

Perante o STF, Maluf é acusado de várias operações de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. As acusações foram apresentadas em dezembro de 2006 e recebidas pelo STF cinco anos depois do ajuizamento. As acusações referem-se, além do caso Jersey, às operações detectadas na França e nos Estados Unidos.

Num pano rápido, o fraudador pobre vai para os arquivos criminais registrado com os vulgos de Zé, Mané, Valdisnei. O acusado Maluf, confirmadas as acusações, poderá ter como vulgo Chanani, Durant etc.

Leia os últimos artigos de Wálter Maierovitch:

O deputado federal Paulo Salim Maluf sente a água próxima às narinas e calafrios no bolso em face de desfalques ordenados pelas Justiças internacional e nacional. Ao que se nota, apenas o seu cacife político, apesar de ação civil de improbidade administrativa em curso, continua com lastro. Maluf é poupado por seus pares, relutantes em instaurar, para perda do seu mandato, processo ético-disciplinar. Se sair do Brasil, será preso por força de mandado internacional. Diante do cerco, o deputado teve de se adaptar: trocou Paris e Monte Carlo por Campos do Jordão e Guarujá.

Maluf se segura na Constituição, que não permite a extradição criminal de brasileiros natos. E também consagra o princípio de ninguém ser obrigado a se autoacusar. Como a mentira, no nosso direito, não é tipificada como crime, Maluf, com base nela, continua a negar tudo. Sustenta, por exemplo, não lhe dizer respeito a recentíssima sentença da Corte Real de Jersey a determinar a devolução, para a municipalidade de São Paulo, de 22 milhões de dólares, importância atualizada até o fechamento do ano fiscal de 1999.

Para ocultação da identidade dos endinheirados, o mundo capitalista admite os chamados “espaços livres do Direito” e, com a facilidade, apareceu uma miríade de empresas offshore. Elas aumentaram depois da tragédia de 11 de setembro, pela proibição das contas despersonalizadas: no Panamá podia-se abrir conta corrente bancária com qualquer nome ou combinação de números. Nem a instituição bancária conhecia a identidade do correntista.

No paraíso fiscal da Ilha de Jersey foram bloqueados capitais nas contas Chanani e Durant. As contas seriam geridas por Maluf e seu filho Flávio. Segundo os procuradores Rodrigo de Grandis e Sílvio Marques, essas contas foram irrigadas com pagamento de comissão ilegal da superfaturada obra da Avenida Água Espraiada, quando Maluf era prefeito. A Real Corte de Justiça de Jersey, diante das evidências de ilicitude, acabou de decidir que os valores movimentados pelas offshore devem ser restituídos à cidade.

Pelas investigações, Maluf e o filho receberam 11,1 milhões de dólares da empreiteira Mendes Júnior. Para as contas da ­offshore Chanani, aberta no Safra National Bank of New York, a dupla repassou 10,5 milhões no período de janeiro a fevereiro de 1988. Depois, foram efetivas transferências da Chanani para a Durant International Corporation no período de 22 de janeiro a 20 de fevereiro de 1988. A Durant tem sede fiscal na Ilha de Jersey. Na origem de tudo está a empreiteira Mendes Júnior, que recebeu da Empresa Municipal de Urbanização (Emurb) o equivalente a 57,2 milhões de dólares pela construção da Água Espraiada. O suborno de Maluf foi estimado em 20% do valor da obra. A consumação dos crimes de corrupção ativa e passiva, consoante os representantes do Ministério Público, ocorreram quando Maluf era prefeito. Nas ilegais operações de lavagens, as movimentações interbancárias foram feitas em cinco semanas.

Maluf goza de foro privilegiado e, até agora, teve declarada a extinção da punibilidade pela prescrição no crime de formação de quadrilha. O prazo prescricional, por ele ter mais de 70 anos, foi contado pela metade. No Congresso Nacional tramita a apelidada ­emenda constitucional da bengala, que aumentaria de 70 para 75 anos a idade de aposentadoria de magistrados, procuradores e funcionários públicos. Mas não existe um projeto pontual e urgente para alterar o artigo do Código Penal que aumente para 75 anos o benefício do prazo prescricional pela metade, ainda que não se possa aplicar retroativamente ao já octogenário Maluf.

Na contramão da tendência internacional, não existe no Brasil projeto a garantir, ao réu acusado, o direito de renunciar à prescrição. No mundo civilizado descobriu-se ser um direito natural do réu de buscar uma sentença que conclua pela absolvição e não pela prescrição da ação pela demora do julgamento. Por aqui, o juiz está obrigado a decretar a prescrição e Maluf jamais renunciaria à prescrição. Na Itália, onde é possível, o ex-premier Silvio Berlusconi não renunciou e justificou-se: disse não confiar na Justiça.

Perante o STF, Maluf é acusado de várias operações de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. As acusações foram apresentadas em dezembro de 2006 e recebidas pelo STF cinco anos depois do ajuizamento. As acusações referem-se, além do caso Jersey, às operações detectadas na França e nos Estados Unidos.

Num pano rápido, o fraudador pobre vai para os arquivos criminais registrado com os vulgos de Zé, Mané, Valdisnei. O acusado Maluf, confirmadas as acusações, poderá ter como vulgo Chanani, Durant etc.

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