Política

Edson Fachin, “opção segura”

Segundo especialistas, o novo relator da Lava Jato tem perfil discreto e costumava acompanhar os votos do falecido Teori Zavascki

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Por Jean-Philip Struck

A relatoria da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF) tem novo responsável: o ministro Edson Fachin, o novato da Corte. Eleito na quinta-feira 2 em sorteio, ele vai assumir o trabalho que foi desempenhado por dois anos pelo ministro Teori Zavascki, que morreu no dia 19 de janeiro.

Para especialistas ouvidos pela DW, a escolha de Fachin indica uma continuidade nos trabalhos da Lava Jato no tribunal – que incluem os casos de políticos envolvidos nos desvios da Petrobras – e também na desconfiança do STF em relação ao Executivo.

“De um modo geral, a escolha de Fachin mostra a Lava Jato vai ser conduzida da mesma maneira. Ele é razoavelmente reservado como Teori”, afirma o professor de direito constitucional Rubens Glezer, da FGV São Paulo.

Segundo Glezer, o sorteio de Fachin evitou a escolha de figuras mais controversas junto à opinião pública, como os veteranos Ricardo Lewandowski ou Gilmar Mendes, que poderiam levantar questionamentos imediatos sobre o futuro da operação por causa das relações próximas de ambos com o mundo político.

Ainda assim, o tempo de casa de Fachin e sua postura discreta levantam questões. “A incógnita principal é como ele vai reagir em relação à pressão da opinião pública e dos seus colegas. É preciso lembrar que ele é ministro há menos de dois anos. Agora ele fica em evidência”, afirma Glezer.

Já o cientista político Rafael Cortez, da Consultoria Tendências, avalia que Fachin é “a opção mais segura” do STF. “O caso todo retrata a desconfiança do STF em relação ao mundo político”, afirma, citando o fato de que a presidente do tribunal, Cármen Lúcia, não quis esperar a indicação de um novo ministro pelo presidente Michel Temer – evitando assim que um novo membro herdasse a relatoria.

Cortez também afirma que a manobra para transferir Fachin de turma no tribunal, que permitiu a participação dele no sorteio que definiu o relator – e diluiu as chances de Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e outros – também demonstrou que existe desconfiança entre os próprios ministros.

Ainda que a postura que Fachin deve tomar em relação à Lava Jato seja alvo de especulações, seu histórico de votos no mínimo indica que ele estava sintonizado com Teori nas ocasiões em que recursos da operação foram levados ao plenário do STF. Ele sempre acompanhou o relatório e o voto de Teori.

Em maio de 2016, por exemplo, Fachin votou pelo afastamento do ex-deputado Eduardo Cunha da presidência da Câmara; em junho, acompanhou Teori mais uma vez quando negou um recurso do peemedebista que questionava uma denúncia. Em março, ele já havia acompanhado o voto que retirou das mãos de Sergio Moro as investigações contra o ex-presidente Lula.

Indicado por Dilma Rousseff

Fachin foi indicado ao STF pela presidente Dilma Rousseff em abril de 2015. Ele assumiu a vaga de Joaquim Barbosa, que havia deixado o tribunal oito meses antes. Com 58 anos, foi criado no Paraná e iniciou sua carreira jurídica em Curitiba. Em 1980, fundou um escritório de advocacia e posteriormente foi procurador do Estado e professor de direito na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Ele também atuou como pesquisador convidado do Instituto Max Planck, em Hamburgo, na Alemanha.

Sua campanha à vaga no STF foi promovida pela bancada paranaense no Senado, mas não foi livre de controvérsias. Setores do PMDB não gostaram da escolha, que foi encarada como um aceno de Dilma aos movimentos sociais. O nome de Fachin desagradou especialmente ao então presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL), que chegou a manobrar para adiar a sabatina do paranaense.

Parlamentares do PMDB também julgaram que Fachin tinha ligações com o PT – ele integrou a Comissão Estadual da Verdade do Paraná por indicação da CUT e em 2010 foi filmado pedindo votos para Dilma durante a campanha presidencial. Ao final, seu nome passou no Senado por 52 votos a 27. A aprovação foi encarada como uma derrota para Renan.

Decisões no STF

Coincidentemente, um dos primeiros casos que Fachin relatou no STF foi uma denúncia contra Renan por peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso. O inquérito apontava que o peemedebista usou nos anos 2000 dinheiro de uma empreiteira para pagar pensão a uma filha que teve fora do casamento.

No início de dezembro de 2016, Fachin finalmente concluiu o relatório e votou a favor do recebimento da denúncia. Por oito votos a três, o STF decidiu tornar Renan réu. O caso acabaria dando origem a um novo capítulo na crise entre os poderes quando o ministro Marco Aurélio usou o processo como justificativa para afastar Renan do Senado. Fachin apoiou a decisão do colega, mas eles acabaram sendo voto vencido no plenário.

Coube também a Fachin a relatoria dos processos que pediam a anulação do impeachment de Dilma. Em dezembro de 2015, o ministro votou a favor da manutenção de aspectos do rito estabelecido por Cunha na Câmara, como a criação de chapa avulsa e voto secreto para a formação de comissão. Ele foi voto vencido em todas as ocasiões.

Em outros casos, também proferiu votos favoráveis à prisão imediata de condenados em segunda instância e para impedir que réus no Supremo ocupem cargos que estão na linha direta de substituição do presidente da República.

Primeiras decisões da Lava Jato

No STF, o relator dirige e toma decisões relacionadas ao processo, tal como a autorização de escutas telefônicas e a abertura ou arquivamento de inquéritos. Ele também pode tomar algumas decisões monocráticas (sem o voto de outros ministros), como o julgamento de pedidos de habeas corpus quando a Segunda Turma ou o plenário do STF não estão reunidos.

Como o próprio nome indica, também é papel do relator elaborar um relatório e apresentar seu voto aos outros ministros do STF. O documento e voto são utilizados como referência. Outros ministros podem acompanhar o voto do relator ou discordar.

Da Lava Jato, Fachin vai herdar mais 40 inquéritos e três ações penais e ditar o ritmo de pedidos de investigações do Ministério Público. A primeira leva deve ser baseada nas delações de executivos da Odebrecht, que acabaram de ser homologadas. Fachin também deve determinar que as penas acertadas com os 77 delatores comecem a ser cumpridas.

As delações continuam, por enquanto, sob sigilo atendendo a um pedido do procurador-geral, Rodrigo Janot. Caso mude de ideia, Janot deverá informar o novo relator, que pode autorizar a divulgação.

Fachin também deverá analisar mais uma denúncia contra Renan, desta vez pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, entregue em dezembro pelo MP. Na fila também está a análise de um pedido de Eduardo Cunha para anular a sua prisão.

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