Política

Bolsonaro não é zebra

Pelo menos quatro fatores fazem crer que Bolsonaro imprimirá uma concorrência verdadeira nas eleições de 2018

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Créditos: Geraldo Magela/Agência Senado|||||| ||||||
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A zebra não é um dos animais do jogo do bicho. Por isso, é um resultado impossível e serve como metáfora para aquilo que ninguém esperava acontecer. Pois bem, é comum nas análises sobre as eleições de 2018 ouvir-se que o pré-candidato Jair Bolsonaro é zebra, mesmo com o desempenho crescente dele nas pesquisas recentes. Será? Pelo menos quatro fatores fazem crer que Bolsonaro imprimirá uma concorrência verdadeira nas eleições de 2018 e, assim, ele está no conjunto dos resultados possíveis.

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Em primeiro lugar, diversas pesquisas mostram a violência como uma constante reclamação da população brasileira, independente do estrato de renda a que pertencem. Além disso, outro problema continuamente apontado são as drogas que, contudo, a população compreende como sendo a principal causa da violência. Ou seja, estes são problemas comumente relatados e que, para a população, estão intimamente relacionados.

Diferente de emprego e inflação, que são problemas que aparecem de acordo com a conjuntura, violência e drogas estão sempre entre as maiores queixas. Ao apontá-las como problemas constantes com que convive, a população reclama, em outros termos, segurança e ordem, e são estas as duas principais bandeiras de Bolsonaro. Daí, inclusive, seu reconhecido caráter autoritário.

O segundo elemento a favor de Bolsonaro é a desordem política. A operação Lava Jato vem confirmando o que há muito já se sabia, porém jamais de forma tão clara: a política brasileira é uma desordem plena, cujo único denominador comum reconhecido é a corrupção.

Diante de uma população desacreditada da classe política, Bolsonaro, que dela faz parte, porém ainda está ileso da Lava Jato, ganha crédito e ressonância. Quando isso se soma ao seu perfil ordenador, intransigente, autoritário, o eleitor nele encontra uma opção para seus anseios imediatos, de segurança e ordem, social e política.

O terceiro ponto é o conservadorismo, espécie de cura para o medo coletivo, fruto da sensação de insegurança e desordem. Brexit e Trump são exemplos de conservadorismos construídos a partir da sensação de desordem que, para americanos e britânicos, a globalização e seu mundo com menos fronteiras e mais imigrantes, construiu. No Brasil, a desordem tem outras naturezas, o caos político e o social, mas a resposta tem sido similar, polarização e, sobretudo, conservadorismo. E qual a escolha conservadora para 2018? Não, a resposta não será zebra.

Por fim, um último fator é Bolsonaro não se construir como o anti-Lula, para surfar na rejeição ao ex-presidente. A estratégia de ser o anti-Lula é a adotada pelo prefeito de São Paulo, João Doria. Porém, é uma estratégia que não convence, pois sugere pouco conteúdo e muito populismo, o “jogar para a torcida”.

Embora alguns achem Bolsonaro um populista no sentido ruim da palavra, como o é Doria, esta é uma análise incorreta. As falas de ordem e segurança de Bolsonaro, bem como sua marca autoritária, não são de agora, mas o acompanham desde sempre. Isso o confere uma plataforma e uma identidade, algo requerido pelos que buscam um candidato. Isso é ainda mais o caso quando há desejos conservadores mais aflorados, que normalmente temem a fluidez da modernidade.

Enfim, diversos elementos relevantes para a decisão do eleitor, que atendem seus desejos mais imediatos, porém não apenas de momento, como emprego ou salário, fazem historicamente parte da identidade política de Bolsonaro. Por sua vez, a circunstância histórica está construindo a convergência destes anseios individuais com o perfil do pré-candidato, tirando-o da condição de zebra.

A história é repleta desses matches, e nos últimos dois anos Trump e Brexit servem de exemplo. Que o exemplo sirva para não se subestimar o poder competitivo de Bolsonaro. De outra forma, a narrativa de que ele é um mito pode se transformar em verdade. Fossem tempos normais, valeriam posturas mais centrais, em termos das escolhas políticas do eleitor médio, que é o que decide a eleição. Já tempos extremos…

*Fábio Terra é professor da Universidade Federal do ABC

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