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Rivais se unem em Israel, e ataque ao Irã ganha força

Inclusão de partido de centro na coalizão governista ajuda a estabilizar o país, mas deixa Netanyahu pronto para decidir sobre ofensiva militar

Mofaz e Netanyahu conversam na primeira sessão do novo gabinete, realizada no domingo 13, em Jerusalém. Foto: Oded Balility
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No domingo 13, o novo (e velho) governo de Israel realizou sua primeira reunião conjunta. O chefe continua a ser o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, mas seu principal aliado mudou. O novo gabinete é resultado de uma longa reunião realizada na madrugada da terça-feira 8, na qual Bibi, como é chamado o premiê, e o líder do partido de centro Kadima, Shaul Mofaz, fecharam um surpreendente acordo que evitou a realização de novas eleições.

Pelo acerto, os 28 parlamentares do Kadima, maior partido do parlamento, se juntaram aos 66 da coalizão de direita de Netanyahu. Bibi passou a comandar, assim, o governo mais forte da história de Israel, com 94 das 120 cadeiras do parlamento.

Com todo esse poder, Netanyahu poderá fazer avançar questões importantes da política interna de Israel e também sua agenda externa. No primeiro caso, isso pode ser interessante, pois Israel poderia fazer bom uso de estabilidade, e com menos polêmicas. No segundo, pode vir a ser perigoso para toda a região, uma vez que, na agenda externa de Netanyahu uma ofensiva militar contra o programa nuclear do Irã ocupa lugar de destaque.

Internamente, os desafios da nova coalizão são grandes e envolvem demandas econômicas e sociais. A alta nos preços de moradias e de alimentos, a precarização dos serviços de saúde e educação, o aumento da desigualdade social e o crescimento dos níveis de pobreza extrema levaram às ruas centenas de milhares de manifestantes em 2011, e os protestos devem se repetir nos próximos meses. Neste clima, o governo deve elaborar um novo orçamento para 2013 e modificar o sistema de governança do país. Com o Kadima no barco, as coisas devem ser mais fáceis, pois o partido de Mofaz é bem visto pela classe média e deve pelo menos tentar reduzir os cortes de gastos draconianos defendidos por Netanyahu.

A chegada do Kadima à coalizão, entretanto, não se dará de forma tranquila. Outro assunto no qual o partido deve ajudar Netanyahu é a alteração da chamada Lei Tal, que libera os judeus ortodoxos do serviço militar.

O Kadima é secular e vai se aliar aos membros atuais do governo interessados em incluir os ortodoxos no Exército, como deseja Netanyahu.

A modificação na Lei Tal será bastante delicada. Netanyahu tem, entre seus aliados, partidos extremistas de direita, que defendem cegamente a isenção do serviço militar aos ortodoxos.

Essa divisão interna da coalizão poderia irritar os extremistas e colocar o governo em dificuldades. Mas Netanyahu tem um trunfo. Em entrevista a Carta Capital, Jonathan Rynhold, professor do Centro de Estudos Estratégicos Begin-Sadat, da Universidade Bar-Ilan, em Israel, diz acreditar na capacidade do premiê de manter a maioria nas votações mais importantes. “Esses temas polêmicos não devem ameaçá-lo, pois em muitos assuntos controversos o governo pode contar também com a oposição”, diz Rynhold.

Um exemplo dessa cooperação governo-oposição pode ser justamente a Lei Tal. Os Trabalhistas, atuais líderes da oposição de Israel, também querem incluir os ortodoxos no Exército.

A paz com os palestinos e a questão do Irã

Na frente externa, os resultados que a nova coalizão pode produzir ainda são incertos. Atualmente, os dois assuntos mais importantes nas relações internacionais de Israel são a paz com os palestinos e o programa nuclear do Irã.

Ao anunciar a entrada no bloco governista, o Kadima estabeleceu como uma de suas prioridades a promoção de um novo processo de paz. Shaul Mofaz é alguém com legitimidade para insistir nisso. Ele serviu no Exército de Israel por mais de três décadas, foi chefe das Forças Armadas e ministro da Defesa. Seu plano para a paz é otimista, talvez até demais. Ele defende a busca de um acordo com os palestinos por meio de um estágio intermediário de negociações, no qual Israel reconheceria a Palestina em aproximadamente 60% da Cisjordânia em troca da não remoção dos assentamentos israelenses na região.

A proposta, entretanto, parece ser incapaz de quebrar o clima de desconfiança mútua e generalizada existente entre israelenses e palestinos.

“Isso é parte da constante mudança de planos de Israel para ganhar tempo e mais terras e propriedades, inviabilizando o estado palestino”, diz Magid Shihade, professor do Instituto Abu-Lughod de Estudos Internacionais da Universidade Birzeit, na Palestina.

O professor israelense Jonathan Rynhold considera que os maiores impedimentos para a paz são promovidos pelos palestinos, mas também se diz pessimista quanto à iniciativa de Mofaz. Segundo Rynhold, do ponto de vista político, a presença de Mofaz no governo é positiva para Netanyahu, pois seu gabinete passará a ser retratado como mais moderado. “Além disso, [esse plano] pode colocar a iniciativa [da paz] nas mãos de Israel, com a perspectiva de que fazer alguma coisa é melhor do que não fazer nada”, afirma.

A parte mais preocupante da aliança entre Netanyahu e Mofaz é a questão iraniana. Pessoalmente, Mofaz (nascido no Irã) é contra um ataque ao Irã sem o apoio dos Estados Unidos. Como o governo Barack Obama prefere a alternativa diplomática, Israel seria obrigado a atacar sozinho agora.

Ao trazer alguém com esta posição para o centro da tomada de decisões de seu governo, Netanyahu pode estar tentando dar legitimidade a uma possível decisão favorável ao ataque. Afinal, se mesmo com o moderado Mofaz no gabinete a decisão for pelo ataque, o espaço para críticas a uma ofensiva militar dentro de Israel ficará bastante reduzido.

“A aliança com Mofaz manda uma mensagem clara de que Israel está considerando seriamente uma ação militar”, diz Rynhold. Como o professor da Universidade Bar-Ilan, praticamente todos os analistas israelenses acreditam que, com Mofaz no governo, Netanyahu ficou mais confortável para atacar o Irã. Alguns apontam para o caráter oportunista da aliança de Mofaz com Netanyahu. Esses lembram que, também para o líder do Kadima, a situação é confortável. Se um ataque ao Irã der certo, ele poderá se gabar de ter ajudado a tomar a decisão. Se for um desastre, destacará seu voto contrário ao ataque.

Hoje, pode-se dizer que a decisão de um ataque de Israel ao Irã ainda não foi tomada. Um grupo de menos de dez pessoas na cúpula do governo israelense detém as decisivas informações diplomáticas, militares e de Inteligência sobre isso. Mas, agora, com o líder do Kadima em seu círculo mais íntimo, Netanyahu está ainda mais seguro para tomar a decisão, capaz de jogar o Oriente Médio em uma espiral de violência sem precedentes.

No domingo 13, o novo (e velho) governo de Israel realizou sua primeira reunião conjunta. O chefe continua a ser o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, mas seu principal aliado mudou. O novo gabinete é resultado de uma longa reunião realizada na madrugada da terça-feira 8, na qual Bibi, como é chamado o premiê, e o líder do partido de centro Kadima, Shaul Mofaz, fecharam um surpreendente acordo que evitou a realização de novas eleições.

Pelo acerto, os 28 parlamentares do Kadima, maior partido do parlamento, se juntaram aos 66 da coalizão de direita de Netanyahu. Bibi passou a comandar, assim, o governo mais forte da história de Israel, com 94 das 120 cadeiras do parlamento.

Com todo esse poder, Netanyahu poderá fazer avançar questões importantes da política interna de Israel e também sua agenda externa. No primeiro caso, isso pode ser interessante, pois Israel poderia fazer bom uso de estabilidade, e com menos polêmicas. No segundo, pode vir a ser perigoso para toda a região, uma vez que, na agenda externa de Netanyahu uma ofensiva militar contra o programa nuclear do Irã ocupa lugar de destaque.

Internamente, os desafios da nova coalizão são grandes e envolvem demandas econômicas e sociais. A alta nos preços de moradias e de alimentos, a precarização dos serviços de saúde e educação, o aumento da desigualdade social e o crescimento dos níveis de pobreza extrema levaram às ruas centenas de milhares de manifestantes em 2011, e os protestos devem se repetir nos próximos meses. Neste clima, o governo deve elaborar um novo orçamento para 2013 e modificar o sistema de governança do país. Com o Kadima no barco, as coisas devem ser mais fáceis, pois o partido de Mofaz é bem visto pela classe média e deve pelo menos tentar reduzir os cortes de gastos draconianos defendidos por Netanyahu.

A chegada do Kadima à coalizão, entretanto, não se dará de forma tranquila. Outro assunto no qual o partido deve ajudar Netanyahu é a alteração da chamada Lei Tal, que libera os judeus ortodoxos do serviço militar.

O Kadima é secular e vai se aliar aos membros atuais do governo interessados em incluir os ortodoxos no Exército, como deseja Netanyahu.

A modificação na Lei Tal será bastante delicada. Netanyahu tem, entre seus aliados, partidos extremistas de direita, que defendem cegamente a isenção do serviço militar aos ortodoxos.

Essa divisão interna da coalizão poderia irritar os extremistas e colocar o governo em dificuldades. Mas Netanyahu tem um trunfo. Em entrevista a Carta Capital, Jonathan Rynhold, professor do Centro de Estudos Estratégicos Begin-Sadat, da Universidade Bar-Ilan, em Israel, diz acreditar na capacidade do premiê de manter a maioria nas votações mais importantes. “Esses temas polêmicos não devem ameaçá-lo, pois em muitos assuntos controversos o governo pode contar também com a oposição”, diz Rynhold.

Um exemplo dessa cooperação governo-oposição pode ser justamente a Lei Tal. Os Trabalhistas, atuais líderes da oposição de Israel, também querem incluir os ortodoxos no Exército.

A paz com os palestinos e a questão do Irã

Na frente externa, os resultados que a nova coalizão pode produzir ainda são incertos. Atualmente, os dois assuntos mais importantes nas relações internacionais de Israel são a paz com os palestinos e o programa nuclear do Irã.

Ao anunciar a entrada no bloco governista, o Kadima estabeleceu como uma de suas prioridades a promoção de um novo processo de paz. Shaul Mofaz é alguém com legitimidade para insistir nisso. Ele serviu no Exército de Israel por mais de três décadas, foi chefe das Forças Armadas e ministro da Defesa. Seu plano para a paz é otimista, talvez até demais. Ele defende a busca de um acordo com os palestinos por meio de um estágio intermediário de negociações, no qual Israel reconheceria a Palestina em aproximadamente 60% da Cisjordânia em troca da não remoção dos assentamentos israelenses na região.

A proposta, entretanto, parece ser incapaz de quebrar o clima de desconfiança mútua e generalizada existente entre israelenses e palestinos.

“Isso é parte da constante mudança de planos de Israel para ganhar tempo e mais terras e propriedades, inviabilizando o estado palestino”, diz Magid Shihade, professor do Instituto Abu-Lughod de Estudos Internacionais da Universidade Birzeit, na Palestina.

O professor israelense Jonathan Rynhold considera que os maiores impedimentos para a paz são promovidos pelos palestinos, mas também se diz pessimista quanto à iniciativa de Mofaz. Segundo Rynhold, do ponto de vista político, a presença de Mofaz no governo é positiva para Netanyahu, pois seu gabinete passará a ser retratado como mais moderado. “Além disso, [esse plano] pode colocar a iniciativa [da paz] nas mãos de Israel, com a perspectiva de que fazer alguma coisa é melhor do que não fazer nada”, afirma.

A parte mais preocupante da aliança entre Netanyahu e Mofaz é a questão iraniana. Pessoalmente, Mofaz (nascido no Irã) é contra um ataque ao Irã sem o apoio dos Estados Unidos. Como o governo Barack Obama prefere a alternativa diplomática, Israel seria obrigado a atacar sozinho agora.

Ao trazer alguém com esta posição para o centro da tomada de decisões de seu governo, Netanyahu pode estar tentando dar legitimidade a uma possível decisão favorável ao ataque. Afinal, se mesmo com o moderado Mofaz no gabinete a decisão for pelo ataque, o espaço para críticas a uma ofensiva militar dentro de Israel ficará bastante reduzido.

“A aliança com Mofaz manda uma mensagem clara de que Israel está considerando seriamente uma ação militar”, diz Rynhold. Como o professor da Universidade Bar-Ilan, praticamente todos os analistas israelenses acreditam que, com Mofaz no governo, Netanyahu ficou mais confortável para atacar o Irã. Alguns apontam para o caráter oportunista da aliança de Mofaz com Netanyahu. Esses lembram que, também para o líder do Kadima, a situação é confortável. Se um ataque ao Irã der certo, ele poderá se gabar de ter ajudado a tomar a decisão. Se for um desastre, destacará seu voto contrário ao ataque.

Hoje, pode-se dizer que a decisão de um ataque de Israel ao Irã ainda não foi tomada. Um grupo de menos de dez pessoas na cúpula do governo israelense detém as decisivas informações diplomáticas, militares e de Inteligência sobre isso. Mas, agora, com o líder do Kadima em seu círculo mais íntimo, Netanyahu está ainda mais seguro para tomar a decisão, capaz de jogar o Oriente Médio em uma espiral de violência sem precedentes.

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