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Mundo somou 42,5 milhões de ‘refugiados’ em 2011

ONU mostra que o mundo tem 15,2 milhões de refugiados externos e 26,4 milhões pessoas deslocadas internamente. Cerca de 900 mil receberam asilo

na Síria. O agravamento do conflito e da instabilidade no país é uma das causas do deslocamento dos refugiados|Imigrantes desembarcam na ilha de Lesbos
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O ano de 2011 foi marcado por conflitos de grande repercussão internacional. Desde a Primavera Árabe, série de movimentos democráticos que surgiu em países do Oriente Médio e derrubou governos ditatoriais no Egito, Tunísia e Líbia, aos já conhecidos problemas internos da Somália e da Colômbia. Esses conflitos e as perseguições (política, religiosa, sexual, entre outras) forçaram 42,5 milhões de pessoas em todo o mundo a fugir ou se manter longe de suas casas por risco de vida. O número passou dos 42 milhões pelo quinto ano seguido. Esses dados integram o relatório Global Trends 2011 (Tendências Globais, em tradução livre) do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), divulgado nesta segunda-feira 18, e incluem 15,2 milhões de refugiados externos (pessoas que tiveram que cruzar as fronteiras de seus países) – 10,4 milhões sob os cuidados do ACNUR e 4,8 milhões de refugiados palestinos -, além de 26,4 milhões de deslocados internos (dentro de suas próprias fronteiras).

Apesar de haver uma pequena queda ante os 43,7 milhões de refugiados de 2010, o relatório anual do ACNUR reflete uma situação crítica neste tipo de migração no mundo. Em 2011, o planeta viu surgir 800 mil novos refugiados, o maior número em mais de uma década. Assistiu também ao aparecimento de 3,5 milhões de deslocadas dentro de suas fronteiras, número 20% maior que em 2010. Ou seja, 4,3 milhões de pessoas colocadas em situação de vulnerabilidade e deslocamento forçado por conflito ou perseguição. “Isso está relacionado com as crises humanitárias, os conflitos velhos e os novos, como a Primavera Árabe. Como os conflitos antigos não se resolvem e há novos, cria-se uma tendência preocupante para os refugiados”, diz Andrés Ramirez, representante do ACNUR no Brasil, em entrevista a CartaCapital.

 

Os dados do relatório são preocupantes pois mostram que o acúmulo de conflitos suplantou o trabalho do Acnur. Em 2011, o órgão da ONU conseguiu repatriar voluntariamente 532 mil pessoas, mais que os 197,6 mil de 2010, mas o número é o terceiro pior resultado em uma década. Isso significa que os refugiados estão ficando cada vez mais tempo nos países de asilo. Em 2011, um grande número de deslocados internos retornou a suas casas (3,2 milhões), mas ainda assim o número de pessoas nesta situação cresceu em 700 mil em relação a 2010. “É complicado para os refugiados retornarem enquanto a situação em seus países de origem continua crítica”, diz Ramirez.

África

Parte importante deste quadro é resultado de um ano em que conflitos políticos e desastres naturais colocaram a África no centro do problema. O conflito de oito meses entre rebeldes do Conselho Nacional de Transição (CNT) e as tropas do ditador Muammar Kaddafi, que estava no poder há 42 anos na Líbia, forçaram cerca de 150 mil líbios a deixarem o país, maioria para a Tunísia. Outros 500 mil se tornaram deslocados internos. Mas após a morte de Kaddafi e a vitória dos rebeldes – armados pelo Ocidente “por questões humanitárias” e apoiados por bombardeios da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) -, quase todos conseguiram retornar ao país. Na Tunísia e Egito, que também derrubaram ditadores, não houve intervenção estrangeira e os conflitos tiveram duração curta. Por isso, o número de refugiados e deslocados foi menor. Na comparação com 2010, o Egito tinha 8,5 mil pessoas em situação de deslocamento forçado (o que inclui refugiados, pessoas em situação de refúgio e pedidos de asilo). No ano seguinte foram 10.413 mil. O mesmo vale para a Tunísia: Em 2010, 2.731 mil pessoas estavam nesta situação e 3.556 mil em 2011. Os dados sobre a Síria entram no Global Trends 2012, mas um gráfico do relatório atual aponta mais de 25 mil pedidos de asilo vindos do país no ano passado.

Os conflitos antigos e os desastres naturais completam o quadro na África Subsaariana. Nesta parte do continente, mais de 300 mil somalis fugiram para o Quênia, Iêmen e Etiópia devido à maior seca dos últimos 60 anos no Chifre da África – que chegou a colocar o país em estado de fome (Leia ) -, e provocou violência e conflitos no sul e no centro do país. Ao todo, 700 mil somalis deixaram o país nos últimos cinco anos. Na Costa do Marfim, 207 mil pessoas fugiram, a maioria para a Libéria (cerca de 200 mil), após uma onda de violência tomar o país em novembro de 2010. Depois da derrota nas eleições presidenciais para Alassane Ouattara, Laurent Gbagbo, que ocupava o cargo, recusou-se a aceitar a derrota e a deixar o poder. Isso levou a uma guerra entre as tropas de apoio de Gbagbo e Ouattara, apoiado pelo Ocidente. A ONU interveio e levou o presidente eleito ao poder. A partir de abril, mais de 135,2 mil pessoas puderam retornar ao país até o fim do ano. Enquanto isso, os conflitos ou violações de direitos humanos na Eritreia e Sudão criaram um fluxo de mais de 127,5 mil refugiados, 76,8 mil deles do Sudão do Sul, 30,2 mil da Etiópia. Esses países também registraram alto número de deslocados internos. Líbia, Costa do Marfim, Sudão, Somália e Sudão do Sul somaram mais de 5,6 milhões de pessoas nesta situação.

Para os refugiados, problemas se acumulam

Sem conseguir retornar para casa, os refugiados procuram soluções duradouras no países de asilo. Ao menos 900 mil refugiados se naturalizaram nos locais onde foram recebidos na última década. “Como os conflitos continuam e essas pessoas não podem voltar, elas precisam se integrar no país de asilo”, diz o representante do ACNUR no Brasil. Essa busca por soluções permanentes muitas vezes provoca tensões. “Dos 10,4 milhões de refugiados sob cuidado do ACNUR, 75% estão há mais de cinco anos em asilo. Por isso, os países fazem um grande esforço para tentar ajudar esse público a se inserir como beneficiários das políticas públicas locais”, explica. Ramirez usa como exemplo o Iraque, onde a guerra começou em 2003 e os EUA deixaram o país em 2011. Os conflitos entre xiitas e sunitas, diz, continuam e não há como dizer que vão terminar. “Ainda hoje temos muitos refugiados iraquianos na Síria e na Jordânia. Isso é significativo porque as condições de vida nestas regiões são complicadas e estes países possuem seus próprios conflitos internos.”

Além da dificuldade de retornar ao país de origem, outro dado assusta. Segundo o relatório do ACNUR, mulheres e meninas representam 48% dos refugiados e metade de todos os deslocados internos e retornados. 46% dos refugiados e 34% dos solicitantes de asilo são menores de 18 anos. “Isso contribui para desmistificar que eles são fugitivos. Tratam-se de vítimas, crianças, mulheres e idosos. Há também homens adultos, mas essa cifra destaca que essas pessoas não estão engajados nos confrontos e atos violentos.”

Em 2011, houve 895 mil pedidos de asilo individuais, um aumento de 3% em relação a 2010. Os apátridas foram estimados em 12 milhões de pessoas, embora em 2011 o ACNUR tenha identificado apenas 3,5 milhões de pessoas nesta condição em 64 países.

 

Países pobres

De acordo com o relatório, quase 80% dos mais de 10 milhões de refugiados do mundo viviam em países em desenvolvimento, um total de 8,4 milhões de pessoas. “Isso desmistifica a ideia de que essa população imigra para países ricos atrás de uma vida melhor. Pelo contrário, eles fogem para as proximidades, que geralmente são locais muito pobres”, diz Ramirez.

Além de se concentrarem em países pobres, quase 75% dos refugiados sob a proteção do ACNUR terminaram o último ano em “situação prolongada”, ou seja, há ano sem uma solução definitiva ao final de 2011. Essa população representa 7,1 milhões de pessoas em 26 países diferentes.

O Afeganistão manteve o posto de país que mais gera refugiados no mundo. Em 2011, havia 2,7 milhões de afegãos em 79 países, ou seja, 1 a cada 4 refugiados. Segundo o relatório, 95% deles se concentram no Paquistão ou Irã. Os iraquianos aparecem em seguida, com 1,4 milhão de refugiados e os somalis em terceiro (1,1 milhão), três vezes mais que em 2004. O Paquistão novamente recebeu o maior número de refugiados (1,7 milhão), seguido pelo Irã com 886,5 mil pessoas e Síria com 750 mil. A Alemanha aparece em quarto lugar com 571,7 mil refugiados e o Quênia em quinto, com 566,5 mil.

O ano de 2011 foi marcado por conflitos de grande repercussão internacional. Desde a Primavera Árabe, série de movimentos democráticos que surgiu em países do Oriente Médio e derrubou governos ditatoriais no Egito, Tunísia e Líbia, aos já conhecidos problemas internos da Somália e da Colômbia. Esses conflitos e as perseguições (política, religiosa, sexual, entre outras) forçaram 42,5 milhões de pessoas em todo o mundo a fugir ou se manter longe de suas casas por risco de vida. O número passou dos 42 milhões pelo quinto ano seguido. Esses dados integram o relatório Global Trends 2011 (Tendências Globais, em tradução livre) do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), divulgado nesta segunda-feira 18, e incluem 15,2 milhões de refugiados externos (pessoas que tiveram que cruzar as fronteiras de seus países) – 10,4 milhões sob os cuidados do ACNUR e 4,8 milhões de refugiados palestinos -, além de 26,4 milhões de deslocados internos (dentro de suas próprias fronteiras).

Apesar de haver uma pequena queda ante os 43,7 milhões de refugiados de 2010, o relatório anual do ACNUR reflete uma situação crítica neste tipo de migração no mundo. Em 2011, o planeta viu surgir 800 mil novos refugiados, o maior número em mais de uma década. Assistiu também ao aparecimento de 3,5 milhões de deslocadas dentro de suas fronteiras, número 20% maior que em 2010. Ou seja, 4,3 milhões de pessoas colocadas em situação de vulnerabilidade e deslocamento forçado por conflito ou perseguição. “Isso está relacionado com as crises humanitárias, os conflitos velhos e os novos, como a Primavera Árabe. Como os conflitos antigos não se resolvem e há novos, cria-se uma tendência preocupante para os refugiados”, diz Andrés Ramirez, representante do ACNUR no Brasil, em entrevista a CartaCapital.

 

Os dados do relatório são preocupantes pois mostram que o acúmulo de conflitos suplantou o trabalho do Acnur. Em 2011, o órgão da ONU conseguiu repatriar voluntariamente 532 mil pessoas, mais que os 197,6 mil de 2010, mas o número é o terceiro pior resultado em uma década. Isso significa que os refugiados estão ficando cada vez mais tempo nos países de asilo. Em 2011, um grande número de deslocados internos retornou a suas casas (3,2 milhões), mas ainda assim o número de pessoas nesta situação cresceu em 700 mil em relação a 2010. “É complicado para os refugiados retornarem enquanto a situação em seus países de origem continua crítica”, diz Ramirez.

África

Parte importante deste quadro é resultado de um ano em que conflitos políticos e desastres naturais colocaram a África no centro do problema. O conflito de oito meses entre rebeldes do Conselho Nacional de Transição (CNT) e as tropas do ditador Muammar Kaddafi, que estava no poder há 42 anos na Líbia, forçaram cerca de 150 mil líbios a deixarem o país, maioria para a Tunísia. Outros 500 mil se tornaram deslocados internos. Mas após a morte de Kaddafi e a vitória dos rebeldes – armados pelo Ocidente “por questões humanitárias” e apoiados por bombardeios da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) -, quase todos conseguiram retornar ao país. Na Tunísia e Egito, que também derrubaram ditadores, não houve intervenção estrangeira e os conflitos tiveram duração curta. Por isso, o número de refugiados e deslocados foi menor. Na comparação com 2010, o Egito tinha 8,5 mil pessoas em situação de deslocamento forçado (o que inclui refugiados, pessoas em situação de refúgio e pedidos de asilo). No ano seguinte foram 10.413 mil. O mesmo vale para a Tunísia: Em 2010, 2.731 mil pessoas estavam nesta situação e 3.556 mil em 2011. Os dados sobre a Síria entram no Global Trends 2012, mas um gráfico do relatório atual aponta mais de 25 mil pedidos de asilo vindos do país no ano passado.

Os conflitos antigos e os desastres naturais completam o quadro na África Subsaariana. Nesta parte do continente, mais de 300 mil somalis fugiram para o Quênia, Iêmen e Etiópia devido à maior seca dos últimos 60 anos no Chifre da África – que chegou a colocar o país em estado de fome (Leia ) -, e provocou violência e conflitos no sul e no centro do país. Ao todo, 700 mil somalis deixaram o país nos últimos cinco anos. Na Costa do Marfim, 207 mil pessoas fugiram, a maioria para a Libéria (cerca de 200 mil), após uma onda de violência tomar o país em novembro de 2010. Depois da derrota nas eleições presidenciais para Alassane Ouattara, Laurent Gbagbo, que ocupava o cargo, recusou-se a aceitar a derrota e a deixar o poder. Isso levou a uma guerra entre as tropas de apoio de Gbagbo e Ouattara, apoiado pelo Ocidente. A ONU interveio e levou o presidente eleito ao poder. A partir de abril, mais de 135,2 mil pessoas puderam retornar ao país até o fim do ano. Enquanto isso, os conflitos ou violações de direitos humanos na Eritreia e Sudão criaram um fluxo de mais de 127,5 mil refugiados, 76,8 mil deles do Sudão do Sul, 30,2 mil da Etiópia. Esses países também registraram alto número de deslocados internos. Líbia, Costa do Marfim, Sudão, Somália e Sudão do Sul somaram mais de 5,6 milhões de pessoas nesta situação.

Para os refugiados, problemas se acumulam

Sem conseguir retornar para casa, os refugiados procuram soluções duradouras no países de asilo. Ao menos 900 mil refugiados se naturalizaram nos locais onde foram recebidos na última década. “Como os conflitos continuam e essas pessoas não podem voltar, elas precisam se integrar no país de asilo”, diz o representante do ACNUR no Brasil. Essa busca por soluções permanentes muitas vezes provoca tensões. “Dos 10,4 milhões de refugiados sob cuidado do ACNUR, 75% estão há mais de cinco anos em asilo. Por isso, os países fazem um grande esforço para tentar ajudar esse público a se inserir como beneficiários das políticas públicas locais”, explica. Ramirez usa como exemplo o Iraque, onde a guerra começou em 2003 e os EUA deixaram o país em 2011. Os conflitos entre xiitas e sunitas, diz, continuam e não há como dizer que vão terminar. “Ainda hoje temos muitos refugiados iraquianos na Síria e na Jordânia. Isso é significativo porque as condições de vida nestas regiões são complicadas e estes países possuem seus próprios conflitos internos.”

Além da dificuldade de retornar ao país de origem, outro dado assusta. Segundo o relatório do ACNUR, mulheres e meninas representam 48% dos refugiados e metade de todos os deslocados internos e retornados. 46% dos refugiados e 34% dos solicitantes de asilo são menores de 18 anos. “Isso contribui para desmistificar que eles são fugitivos. Tratam-se de vítimas, crianças, mulheres e idosos. Há também homens adultos, mas essa cifra destaca que essas pessoas não estão engajados nos confrontos e atos violentos.”

Em 2011, houve 895 mil pedidos de asilo individuais, um aumento de 3% em relação a 2010. Os apátridas foram estimados em 12 milhões de pessoas, embora em 2011 o ACNUR tenha identificado apenas 3,5 milhões de pessoas nesta condição em 64 países.

 

Países pobres

De acordo com o relatório, quase 80% dos mais de 10 milhões de refugiados do mundo viviam em países em desenvolvimento, um total de 8,4 milhões de pessoas. “Isso desmistifica a ideia de que essa população imigra para países ricos atrás de uma vida melhor. Pelo contrário, eles fogem para as proximidades, que geralmente são locais muito pobres”, diz Ramirez.

Além de se concentrarem em países pobres, quase 75% dos refugiados sob a proteção do ACNUR terminaram o último ano em “situação prolongada”, ou seja, há ano sem uma solução definitiva ao final de 2011. Essa população representa 7,1 milhões de pessoas em 26 países diferentes.

O Afeganistão manteve o posto de país que mais gera refugiados no mundo. Em 2011, havia 2,7 milhões de afegãos em 79 países, ou seja, 1 a cada 4 refugiados. Segundo o relatório, 95% deles se concentram no Paquistão ou Irã. Os iraquianos aparecem em seguida, com 1,4 milhão de refugiados e os somalis em terceiro (1,1 milhão), três vezes mais que em 2004. O Paquistão novamente recebeu o maior número de refugiados (1,7 milhão), seguido pelo Irã com 886,5 mil pessoas e Síria com 750 mil. A Alemanha aparece em quarto lugar com 571,7 mil refugiados e o Quênia em quinto, com 566,5 mil.

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