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O governo dos EUA é o pior, e único, mediador possível entre Israel e palestinos

Processo de paz pode ser relançado em março, mas as perspectivas não dão margem a otimismo

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O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, vai visitar Israel pela primeira vez no mês de março. Oficialmente, a intenção é “reafirmar os profundos e duradouros laços entre Estados Unidos e Israel”. Segundo o canal 10 de Israel, no entanto, a visita pode ser mais importante. Obama teria recebido a promessa de que, no país, poderia dar início à retomada do processo de paz com os palestinos.

A Casa Branca nega, até mesmo porque essa possibilidade dependerá da formação de um novo governo por Benjamin Netanyahu, o premier israelense, e da política palestina.

Convém manter o pessimismo.

Um processo de paz liderado pelos Estados Unidos é e continuará a ser a única possibilidade a ser vislumbrada para resolver o conflito, mas é também a pior possível.

Maior potência mundial e única minimamente capaz de influenciar israelenses e palestinos, os Estados Unidos têm uma postura altamente enviesada a favor de Israel. Este aspecto fica claro em momentos importantes, como a votação da ONU em novembro, na qual o voto de Washington foi um dos nove contra o Estado palestino, mas também no dia a dia. É difícil encontrar, nos EUA, livre debate sobre a questão palestina.

Dois episódios deixaram isso claro nesta semana.

A Brooklyn College, uma das principais faculdades da Universidade da Cidade de Nova York, marcou para esta quinta-feira 7 um debate sobre uma forma de pressão contra Israel cada vez mais popular: o boicote ao país, nos moldes do que o mundo fez com o regime segregacionista do Apartheid na África do Sul. O evento terá a participação do palestino Omar Barghouti e da filósofa norte-americana de origem judaica Judith Butler. Ambos são defensores do BDS, sigla em inglês para “boicote, desinvestimento e sanções”, uma campanha de ativistas palestinos contra a ocupação israelense.

A simples existência do debate deixou perturbados vários defensores de Israel. Alan Dershowitz, um proeminente advogado, escreveu artigo afirmando que o evento era uma “orgia de propaganda do ódio”.

Um membro do legislativo municipal de Nova York afirmou que o evento abriria as portas para “um novo Holocausto”.

Outro disse que Barghouti e Judith Butler eram simpatizantes do Hamas, do Hezbollah e “provavelmente” da Al-Qaeda.

Em conjunto com candidatos a prefeito de Nova York e membros do legislativo estadual, os representantes da cidade de Nova York decidiram atacar a liberdade acadêmica: escreveram uma carta ameaçando cortar o financiamento da universidade se o debate fosse levado a cabo. Karen L. Gould, a presidente do Brooklyn College, encontrou uma solução. O evento será realizado, mas nos próximos meses eventos com opiniões contrárias ao boicote a Israel também serão organizados no local.

A histeria só ocorre quando defensores de Israel são deixados de fora do debate. Nada parecido ocorreu nesta quarta-feira 5, quando o Comitê de Relações Exteriores da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos realizou um debate sobre a questão palestina. O nome do evento era “A reconciliação Hamas-Fatah: ameaçando as perspectivas de paz”, um título altamente enviesado.

Especialistas de diversas correntes acreditam que jamais haverá uma paz duradoura caso o secular Fatah e o religioso Hamas (considerado terrorista por Israel e pelos EUA) não encerrem o conflito interno iniciado em 2007. Quem defende que a reconciliação entre os dois grupos é um obstáculo para a paz é justamente a direita israelense. A mesma direita que não deseja a paz com os palestinos, mas manter e ampliar a ocupação sobre os territórios.

No evento no Congresso, os três convidados eram judeus e não havia debatedores palestinos. Dois eram do Washington Institute for Near East Policy, instituição ligada ao lobby de Israel nos Estados Unidos, e outro do American Enterprise Institute, também pró-Israel. Dois deles disseram que a reconciliação era um caminho ruim, enquanto o outro sugeriu que os EUA usassem sua diplomacia para fazer com que Egito, Turquia e Catar tentassem influenciar o Hamas para torná-lo menos radical, uma posição bem mais razoável. Não houve, entretanto, qualquer convidado capaz de mostrar o lado palestino do conflito e ponderar como Israel deveria mudar suas atitudes para obter a paz.

Ainda que o debate transcorra desta forma nos Estados Unidos, Washington é o único mediador capaz entre Israel e palestinos. Os países do Oriente Médio são vistos com desconfianças por um ou pelos dois lados, a China e a Rússia não têm interesse na região e à Europa falta poder de persuasão e capacidade para ser a fiadora da paz. Sobra, então, o governo norte-americano, o que ajuda explicar, ao menos em parte, porque a paz, hoje, parece inviável.

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