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Com visita à Faixa de Gaza, Catar rompe isolamento do Hamas

A influência do pequeno país pode ser benéfica para os palestinos, mas carrega riscos para a paz com Israel

AL-Thani, o emir do Catar, e Ismail Haniyeh, primeiro-ministro do Hamas durante a visita oficial. Foto: Mohammed Salem / AFP
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A Primavera Árabe se espalhou com velocidade pelo Oriente Médio, mas passou ao largo dos territórios palestinos. Na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, a derrubada de governos autoritários foi observada e não copiada, mas mesmo assim um dos principais atores políticos palestinos, o fundamentalista Hamas, viu sua posição bastante alterada. No início de 2011, o Hamas era considerado integrante do eixo formado por Irã, Síria e Hezbollah. Com as mudanças na região, o grupo palestino passou a recorrer ao Egito (opositor ao eixo iraniano) e agora ganhou um novo aliado, o Catar. O apoio do Catar ao Hamas, formalizado nesta terça-feira 23, pode ser benéfico, mas carrega dentro de si riscos para a paz entre palestinos e Israel.

A parceria entre Hamas e o Catar foi fechada com um ato simbólico. Nesta terça, o emir do Catar, Sheik Hamad bin Khalifa al-Thani, se tornou o primeiro chefe de Estado a visitar a Faixa de Gaza desde 2007, quando o Hamas assumiu o controle da região. Al-Thani foi ao país formalizar os investimentos de 254 milhões de dólares do Catar na reconstrução de três estradas, na construção de um hospital para amputados em Beit Lahia e de mil casas no vilarejo de Khan Younis.

O investimento, mais um dos realizados pelo governo do Catar em sua tentativa de ganhar influência internacional, deve ter efeitos positivos. O mais claro deles é melhorar a qualidade de vida do 1,6 milhão de palestinos que vivem na Faixa de Gaza numa situação precária provocada, em grande parte, pelo bloqueio mantido por Israel. As obras devem servir também para gerar emprego e reativar a economia da Faixa de Gaza. A pobreza desesperadora e a falta de perspectiva à que jovens e crianças são submetidos diariamente e, em alguns casos, por toda a vida, é uma das explicações para a popularidade do fundamentalismo entre os palestinos.

O rompimento do isolamento do Hamas pode ter outro efeito positivo. O Hamas, dono de um braço armado e de um partido político, é considerado um grupo terrorista por Estados Unidos, Europa, Israel e Japão, entre outros, por pregar a destruição de Israel. Há indícios, entretanto, de que o Hamas pode, a longo prazo, moderar seu discurso. A estratégia de isolar o grupo por conta de seus atos de violência, capitaneada por Israel, de nada adiantou até aqui. O radicalismo e a violência persistem. O governo do Catar é fundamentalista, como o Hamas, mas também pragmático. A partir de agora, o Catar poderá exercer influência sobre o Hamas e tentar criar mecanismos para o diálogo entre o grupo e Israel e Estados Unidos.

O apoio do Catar ao Hamas, no entanto, pode trazer efeitos negativos para o futuro da disputa entre israelenses e palestinos. Ao prestar auxílio ao Hamas, o Catar está automaticamente dando legitimidade ao grupo. Isso serve para reforçar o domínio do Hamas na Faixa de Gaza, onde atua de forma autoritária, suprimindo grupos ainda mais radicais. Não é, portanto, um apoio pró-democracia.

Ao legitimar o Hamas, o Catar incorre em um outro perigo – ampliar as divisões entre os grupos palestinos. Desde 2007, quando se enfrentaram em uma guerra civil, o Hamas e o Fatah, partido secular que comanda a Cisjordânia (o maior dos territórios palestinos), não têm relações amistosas. A divisão é considerada uma vergonha pela população palestina e um grande obstáculo para o estabelecimento de um Estado palestino.

O emir do Catar poderia ter tentado contornar essa situação caso realizasse também uma visita a Ramallah, sede do governo do Fatah na Cisjordânia. “Mudar a miserável situação de Gaza é bom, mas isso não deve ser usado para encorajar a separação entre a Cisjordânia e Gaza ou para tornar a reconciliação mais difícil”, disse à Associated Press um funcionário do governo do Fatah. O desprezo ao Fatah incomodou até mesmo Israel. Um porta-voz do Ministério das Relações Exterior israelense classificou a diferenciação feita pelo Catar, em entrevista ao jornal Haaretz, como “assombrosa”.

O Catar tem dinheiro e influência capazes de facilitar a paz entre palestinos e israelenses. Num momento em que a liderança dos Estados Unidos na região está cada vez mais desgastada e faltam mediadores capazes de estimular o diálogo, o Catar poderia contribuir de forma positiva. Para tanto, o emirado precisará remediar sua própria relação com Israel (atualmente rompida) e insistir na moderação do Hamas. Caso contrário, o Catar provará ser mais um Estado manipulador da tragédia palestina em proveito próprio.

A Primavera Árabe se espalhou com velocidade pelo Oriente Médio, mas passou ao largo dos territórios palestinos. Na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, a derrubada de governos autoritários foi observada e não copiada, mas mesmo assim um dos principais atores políticos palestinos, o fundamentalista Hamas, viu sua posição bastante alterada. No início de 2011, o Hamas era considerado integrante do eixo formado por Irã, Síria e Hezbollah. Com as mudanças na região, o grupo palestino passou a recorrer ao Egito (opositor ao eixo iraniano) e agora ganhou um novo aliado, o Catar. O apoio do Catar ao Hamas, formalizado nesta terça-feira 23, pode ser benéfico, mas carrega dentro de si riscos para a paz entre palestinos e Israel.

A parceria entre Hamas e o Catar foi fechada com um ato simbólico. Nesta terça, o emir do Catar, Sheik Hamad bin Khalifa al-Thani, se tornou o primeiro chefe de Estado a visitar a Faixa de Gaza desde 2007, quando o Hamas assumiu o controle da região. Al-Thani foi ao país formalizar os investimentos de 254 milhões de dólares do Catar na reconstrução de três estradas, na construção de um hospital para amputados em Beit Lahia e de mil casas no vilarejo de Khan Younis.

O investimento, mais um dos realizados pelo governo do Catar em sua tentativa de ganhar influência internacional, deve ter efeitos positivos. O mais claro deles é melhorar a qualidade de vida do 1,6 milhão de palestinos que vivem na Faixa de Gaza numa situação precária provocada, em grande parte, pelo bloqueio mantido por Israel. As obras devem servir também para gerar emprego e reativar a economia da Faixa de Gaza. A pobreza desesperadora e a falta de perspectiva à que jovens e crianças são submetidos diariamente e, em alguns casos, por toda a vida, é uma das explicações para a popularidade do fundamentalismo entre os palestinos.

O rompimento do isolamento do Hamas pode ter outro efeito positivo. O Hamas, dono de um braço armado e de um partido político, é considerado um grupo terrorista por Estados Unidos, Europa, Israel e Japão, entre outros, por pregar a destruição de Israel. Há indícios, entretanto, de que o Hamas pode, a longo prazo, moderar seu discurso. A estratégia de isolar o grupo por conta de seus atos de violência, capitaneada por Israel, de nada adiantou até aqui. O radicalismo e a violência persistem. O governo do Catar é fundamentalista, como o Hamas, mas também pragmático. A partir de agora, o Catar poderá exercer influência sobre o Hamas e tentar criar mecanismos para o diálogo entre o grupo e Israel e Estados Unidos.

O apoio do Catar ao Hamas, no entanto, pode trazer efeitos negativos para o futuro da disputa entre israelenses e palestinos. Ao prestar auxílio ao Hamas, o Catar está automaticamente dando legitimidade ao grupo. Isso serve para reforçar o domínio do Hamas na Faixa de Gaza, onde atua de forma autoritária, suprimindo grupos ainda mais radicais. Não é, portanto, um apoio pró-democracia.

Ao legitimar o Hamas, o Catar incorre em um outro perigo – ampliar as divisões entre os grupos palestinos. Desde 2007, quando se enfrentaram em uma guerra civil, o Hamas e o Fatah, partido secular que comanda a Cisjordânia (o maior dos territórios palestinos), não têm relações amistosas. A divisão é considerada uma vergonha pela população palestina e um grande obstáculo para o estabelecimento de um Estado palestino.

O emir do Catar poderia ter tentado contornar essa situação caso realizasse também uma visita a Ramallah, sede do governo do Fatah na Cisjordânia. “Mudar a miserável situação de Gaza é bom, mas isso não deve ser usado para encorajar a separação entre a Cisjordânia e Gaza ou para tornar a reconciliação mais difícil”, disse à Associated Press um funcionário do governo do Fatah. O desprezo ao Fatah incomodou até mesmo Israel. Um porta-voz do Ministério das Relações Exterior israelense classificou a diferenciação feita pelo Catar, em entrevista ao jornal Haaretz, como “assombrosa”.

O Catar tem dinheiro e influência capazes de facilitar a paz entre palestinos e israelenses. Num momento em que a liderança dos Estados Unidos na região está cada vez mais desgastada e faltam mediadores capazes de estimular o diálogo, o Catar poderia contribuir de forma positiva. Para tanto, o emirado precisará remediar sua própria relação com Israel (atualmente rompida) e insistir na moderação do Hamas. Caso contrário, o Catar provará ser mais um Estado manipulador da tragédia palestina em proveito próprio.

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