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Agências de avaliação de risco serão investigadas na Europa

Após série de rebaixamentos, inclusive de bancos brasileiros, autoridade fiscalizadora quer saber se instituições usam critérios rígidos em análises

Standard & Poor´s rebaixa nota de risco da França. Foto: Stan Honda/AFP
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Desde a crise de 2008, as agências de classificação de risco são olhadas com desconfiança por suas opiniões excessivamente otimistas sobre bancos e produtos que, à época, acabaram dragados pela turbulência global. Atualmente, essa crise de credibilidade as lançou na mira dos órgãos fiscalizadores europeus. A Autoridade Europeia dos Mercados Financeiros (ESMA) abriu uma investigação sobre os métodos utilizados pelas três maiores agências do setor: Moody’s, Fitch e Standard & Poor’s (S&P).

Um aspecto curioso é que a ação ocorre após diversos bancos e países da região serem sucessivamente rebaixados em meio à crise do euro, aumentando a pressão do mercado sobre suas dívidas e títulos. A iniciativa, para analistas ouvidos por CartaCapital, seria então um recado: a Europa busca uma alternativa aos serviços destas companhias.

O objetivo da ESMA é tentar confirmar ou eliminar desconfianças. A entidade europeia vai checar se as três agências detêm recursos suficientes em termos de análise, rigor e transparência nas classificações. O trabalho deve terminar até o final deste ano, mas a Europa já pensa em um organismo de avaliação interna substituto, aponta Antonio Carlos Alves dos Santos, doutor em economia e professor da PUC-SP. “Essa análise ocorre porque as agências têm apostado fortemente contra os países da Zona do Euro. Caso consiga provar que as agências possuem uma agenda além da técnica, estaria justificada a criação de um novo sistema de avaliação.”

O gatilho para a devassa nas agências de risco pode ter sido o rebaixamento em massa de bancos europeus. Em junho, a Moody’s cortou a nota de 15 dos maiores bancos do mundo, entre eles o Bank of America, Citigroup e o Barclays. Uma ação semelhante havia sido conduzida pela S&P no final de 2011. Em episódios recentes, a S&P reduziu as notas de crédito de 11 bancos espanhóis, incluindo o Santander e o BBVA, e a Moody´s, 28. Os rebaixamentos também chegaram a instituições brasileiras. Oito bancos brasileiros sofreram cortes da Moody´s na última semana. Entre eles, os gigantes Bradesco, Itaú Unibanco, Banco Itaú BBA e Banco do Brasil. Seria essa uma ação para compensar os erros de 2008, quando mantiveram classificação positiva do banco norte-americano Lehman Brothers até dias antes de sua falência? “As agências foram elevadas à condição de infalíveis, o que levou todos a quererem ser bem classificados. Mas não temos como saber quais os critérios, o que pesa mais e as motivações”, destaca Amir Khair, ex-secretário de Finanças em São Paulo e especialista em contas públicas. “Porque apenas agora estão identificando um problema na Europa que já era antigo?”, questiona.

Há um debate grande sobre a capacidade das agências de risco serem independentes. Muitos analistas duvidam que isso seja possível, pois essas instituições enfrentam conflitos de interesse ao classificarem empresas para as quais prestam consultoria. “Por isso, pensa-se em um tipo de agência semipública com controle mais estrito”, diz Ricardo Carneiro, doutor em Ciência Econômica e coordenador do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (CECON) da Unicamp. Um caminho apoiado por Santos. “É mais válido esse modelo, porque quando a Europa começa a discutir a temática via Banco Central Europeu, abre-se para uma avaliação internacional. Inclusive nos EUA, onde há aversão grande à participação do Estado na economia.”

Segundo o professor da PUC-SP, outro fator possibilitou a ação da ESMA. O escândalo do banco britânico Barclays, que tentou influenciar o valor da Libor (a mais importante taxa interbancária do mundo). “Isso acabou funcionando como uma justificativa para um pente fino nas instituições financeiras”, diz. A atitude do banco levou a uma multa de 450 milhões de dólares para encerrar as investigações das autoridades britânicas e americanas sobre tentativas de manipulação de taxas como a Euribor. Essas taxas definem o preço ao qual os bancos emprestam dinheiro, mas também influenciam indiretamente os preços dos créditos a famílias e empresas.

Perda de credibilidade

A investigação parte da dúvida sobre o rigor das classificações e dos dados analisados. Uma suspeita que vem da atuação das agências de risco na crise de 2008, quando adotaram um comportamento “inconveniente”. “Na crise, ficou claro pelos depoimentos do Congresso dos EUA, no qual se mapeou o comportamento incorreto das agencias, que elas avaliavam bancos e prestavam serviços para eles. Havia conflito de interesses”, ressalta Carneiro. Ele diz, no entanto, que não há como avaliar se o mesmo ocorre na Europa atualmente. O coordenador do CECON defende, inclusive, que é alta a probabilidade de os ativos dos bancos rebaixados nas últimas semanas terem se deteriorado de fato.

Rebaixamentos


Os rebaixamentos sucessivos nas últimas semanas contribuíram para o aumento da pressão dos mercados em alguns países e entidades financeiras fragilizadas pela crise. O corte da nota de um banco dificulta o acesso a empréstimos, pois as taxas de juros são elevadas porque os riscos são maiores. O mesmo vale para os títulos da dívida de países. “A partir do momento que os bancos estão em dificuldade de liquidez e precisam aumentar os volumes de recursos para respeitar os novos acordos de Basileia, eles precisam ir ao mercado. Se são rebaixados, o mercado pedirá mais juros para capitalizá-los. Isso pode fragilizar os bancos e, consequentemente, o país”, explica Santos.

As agências também possuem grande poder de influência em investimentos. Diversos fundos de vários países do mundo não podem comprar títulos que estejam abaixo de certos patamares definidos pelas agências. “O problema é que em um banco em crise, isso pode ser um peso grande. Pode levar ao fim”, conclui Carneiro.

Com informações AFP.

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Desde a crise de 2008, as agências de classificação de risco são olhadas com desconfiança por suas opiniões excessivamente otimistas sobre bancos e produtos que, à época, acabaram dragados pela turbulência global. Atualmente, essa crise de credibilidade as lançou na mira dos órgãos fiscalizadores europeus. A Autoridade Europeia dos Mercados Financeiros (ESMA) abriu uma investigação sobre os métodos utilizados pelas três maiores agências do setor: Moody’s, Fitch e Standard & Poor’s (S&P).

Um aspecto curioso é que a ação ocorre após diversos bancos e países da região serem sucessivamente rebaixados em meio à crise do euro, aumentando a pressão do mercado sobre suas dívidas e títulos. A iniciativa, para analistas ouvidos por CartaCapital, seria então um recado: a Europa busca uma alternativa aos serviços destas companhias.

O objetivo da ESMA é tentar confirmar ou eliminar desconfianças. A entidade europeia vai checar se as três agências detêm recursos suficientes em termos de análise, rigor e transparência nas classificações. O trabalho deve terminar até o final deste ano, mas a Europa já pensa em um organismo de avaliação interna substituto, aponta Antonio Carlos Alves dos Santos, doutor em economia e professor da PUC-SP. “Essa análise ocorre porque as agências têm apostado fortemente contra os países da Zona do Euro. Caso consiga provar que as agências possuem uma agenda além da técnica, estaria justificada a criação de um novo sistema de avaliação.”

O gatilho para a devassa nas agências de risco pode ter sido o rebaixamento em massa de bancos europeus. Em junho, a Moody’s cortou a nota de 15 dos maiores bancos do mundo, entre eles o Bank of America, Citigroup e o Barclays. Uma ação semelhante havia sido conduzida pela S&P no final de 2011. Em episódios recentes, a S&P reduziu as notas de crédito de 11 bancos espanhóis, incluindo o Santander e o BBVA, e a Moody´s, 28. Os rebaixamentos também chegaram a instituições brasileiras. Oito bancos brasileiros sofreram cortes da Moody´s na última semana. Entre eles, os gigantes Bradesco, Itaú Unibanco, Banco Itaú BBA e Banco do Brasil. Seria essa uma ação para compensar os erros de 2008, quando mantiveram classificação positiva do banco norte-americano Lehman Brothers até dias antes de sua falência? “As agências foram elevadas à condição de infalíveis, o que levou todos a quererem ser bem classificados. Mas não temos como saber quais os critérios, o que pesa mais e as motivações”, destaca Amir Khair, ex-secretário de Finanças em São Paulo e especialista em contas públicas. “Porque apenas agora estão identificando um problema na Europa que já era antigo?”, questiona.

Há um debate grande sobre a capacidade das agências de risco serem independentes. Muitos analistas duvidam que isso seja possível, pois essas instituições enfrentam conflitos de interesse ao classificarem empresas para as quais prestam consultoria. “Por isso, pensa-se em um tipo de agência semipública com controle mais estrito”, diz Ricardo Carneiro, doutor em Ciência Econômica e coordenador do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (CECON) da Unicamp. Um caminho apoiado por Santos. “É mais válido esse modelo, porque quando a Europa começa a discutir a temática via Banco Central Europeu, abre-se para uma avaliação internacional. Inclusive nos EUA, onde há aversão grande à participação do Estado na economia.”

Segundo o professor da PUC-SP, outro fator possibilitou a ação da ESMA. O escândalo do banco britânico Barclays, que tentou influenciar o valor da Libor (a mais importante taxa interbancária do mundo). “Isso acabou funcionando como uma justificativa para um pente fino nas instituições financeiras”, diz. A atitude do banco levou a uma multa de 450 milhões de dólares para encerrar as investigações das autoridades britânicas e americanas sobre tentativas de manipulação de taxas como a Euribor. Essas taxas definem o preço ao qual os bancos emprestam dinheiro, mas também influenciam indiretamente os preços dos créditos a famílias e empresas.

Perda de credibilidade

A investigação parte da dúvida sobre o rigor das classificações e dos dados analisados. Uma suspeita que vem da atuação das agências de risco na crise de 2008, quando adotaram um comportamento “inconveniente”. “Na crise, ficou claro pelos depoimentos do Congresso dos EUA, no qual se mapeou o comportamento incorreto das agencias, que elas avaliavam bancos e prestavam serviços para eles. Havia conflito de interesses”, ressalta Carneiro. Ele diz, no entanto, que não há como avaliar se o mesmo ocorre na Europa atualmente. O coordenador do CECON defende, inclusive, que é alta a probabilidade de os ativos dos bancos rebaixados nas últimas semanas terem se deteriorado de fato.

Rebaixamentos


Os rebaixamentos sucessivos nas últimas semanas contribuíram para o aumento da pressão dos mercados em alguns países e entidades financeiras fragilizadas pela crise. O corte da nota de um banco dificulta o acesso a empréstimos, pois as taxas de juros são elevadas porque os riscos são maiores. O mesmo vale para os títulos da dívida de países. “A partir do momento que os bancos estão em dificuldade de liquidez e precisam aumentar os volumes de recursos para respeitar os novos acordos de Basileia, eles precisam ir ao mercado. Se são rebaixados, o mercado pedirá mais juros para capitalizá-los. Isso pode fragilizar os bancos e, consequentemente, o país”, explica Santos.

As agências também possuem grande poder de influência em investimentos. Diversos fundos de vários países do mundo não podem comprar títulos que estejam abaixo de certos patamares definidos pelas agências. “O problema é que em um banco em crise, isso pode ser um peso grande. Pode levar ao fim”, conclui Carneiro.

Com informações AFP.

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