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Paralisia política na Itália põe União Europeia em alerta

A terceira maior economia europeia preocupa mercados e parceiros do euro

O presidente italiano, Giorgio Napolitano, que deixará o cargo no dia 15 de maio. Foto: Vincenzo Pinto/ AFP
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A crise no Chipre está, pelo menos para a União Europeia, controlada. Mas outra, bem mais complicada, parece estar emergindo. Na Itália, os esforços para estabelecer um governo após as eleições de fevereiro acabaram paralisando a política nacional. E o governo do primeiro-ministro Mario Monti tem hoje mais um caráter emergencial do que interino.

A situação deixa cada vez mais tensos os mercados internacionais e a União Europeia, que acompanham dia a dia o quanto a endividada Itália caminha sem orientação; como o vazio político cresce; e como a crise financeira progride de forma cada vez mais acelerada.

Pressionado, o presidente Giorgio Napolitano convocou uma comissão de especialistas composta por representantes dos maiores partidos políticos italianos e altos funcionários do Banco Central Europeu, no intuito de tentar encontrar uma solução para a crise política. Os trabalhos da comissão foram iniciados na terça feira (02/04).

“Os dez sábios”

A comissão de especialistas, chamada por Napolitano de “os dez sábios”, divide-se em dois grupos de trabalho. Um trata das reformas políticas institucionais, que também incluem a lei eleitoral. O outro desenvolve medidas de caráter social e econômico. Os resultados deverão ser apresentados apenas a partir da próxima semana.

Mas, segundo o jornalista Giovanni del Re, correspondente para a União Europeia do jornal Avvenire, não se dever esperar muita coisa dessa comissão.

“Eles certamente vão elaborar um ótimo relatório apresentando o que deve ser reformado no país”, afirmou o jornalista à DW. “Mas deverá ficar por isso mesmo, já que os partidos políticos ainda relutam em cooperar entre si”.

Os “dez sábios”, explica o jornalista, não têm poder de decisão – podem apenas fornecer análises e apontar as reformas necessárias. E enquanto os políticos não demonstrarem disposição para trabalhar em conjunto, os italianos vão se perguntar se as propostas têm de fato valor.

Presidente de saída

Após elogiar inicialmente a criação da comissão, os políticos agora criticam a iniciativa de Napolitano. Em particular a coalizão de centro-direita do ex-premiê Silvio Berlusconi, que considera uma perda de tempo o trabalho da comissão e exige novas eleições – o que, segundo Del Re, seria um grande erro.

“Com as leis eleitorais atuais, nós acabaríamos com a mesma situação caótica de agora”, diz o jornalista, detalhando que nenhum dos partidos conquistaria a maioria no Senado e tudo voltaria ao ponto inicial. “O mínino que temos que fazer é mudar a lei eleitoral, caso contrário tudo continuará do mesmo jeito, o que pode ser muito perigoso para o euro.”

Em meio ao caos, há uma perspectiva de mudança. De todos os protagonistas da crise, é Napolitano – um dos poucos políticos italianos considerados sérios e confiáveis – que deverá deixar o cargo no dia 15 de maio. Devido ao curto tempo que resta de sua Presidência, o político de 87 anos não tem muito o que fazer para tentar lidar com a crise.

“Ele está usando o tempo que ainda tem para tentar reanimar a situação, mas é improvável que uma solução possa de fato emergir”, analisa Del Re.

Um em cada três jovens sem emprego

Para que haja melhoras na economia é preciso que a estabilidade política e as reformas voltem a ser prioridades. Nos últimos cinco anos, a produção industrial encolheu 25%; o índice de desemprego já ultrapassa 11% – um terço da população com menos de 25 anos está sem trabalho; especialistas esperam que a produção econômica do país continue a cair. Além disso, as altas taxas de juros para dívidas novas e antigas contribuem para aumentar ainda mais os problemas.

Parece ser cada vez mais provável que a Itália terá que pedir ajuda à União Européia. Mas a terceira maior economia da Europa é grande demais para um resgate. Para muitos analistas, o país é hoje o maior problema da zona do euro, superando até a Espanha.

Mas ao menos a Itália ainda consegue competir em nível internacional. Não há uma bolha no setor imobiliário, como ocorre em Espanha, Irlanda e Grécia, que possa contribuir para piorar o quadro geral. Além disso, o setor bancário italiano aparenta estar em melhor forma do que o espanhol ou o grego.

Incerteza quanto às reformas

Há semanas as agências internacionais de classificação de risco estão com as atenções voltadas para Roma. A Moody’s já afirmou que acompanhará de perto os esforços para a formação do novo governo. Especialistas presumem que a agência americana certamente rebaixará a nota da Itália, a não ser que a situação apresente melhoras a curto prazo.

O analista Daniel Gros, do Centro de Estudos de Políticas Européias (CEPS), não demonstra muito otimismo. Segundo ele, a Itália, assim como muitos outros países, lida com uma aliança de forças contra as reformas, que não vão ceder seus privilégios sem antes lutar por eles.

“Parece que a crise não chegou a ser suficientemente forte para convencer a população da necessidade de mudanças substanciais nesse sentido” afirmou Gros. “Enquanto não houver consenso, não há muito que a União Europeia e Bruxelas possam fazer.”

Devido à continuação das incertezas políticas e à crescente popularidade de Berlusconi, muitos já duvidam se a Itália deseja de fato as dolorosas medidas de austeridade. Del Re sustenta que, nesse sentido, o resultado da eleição de 25 de fevereiro não foi encorajador. Se os votos de Berlusconi e do ex-comediante Beppe Grillo forem somados, chegariam a 60% do total.

“Os partidos de ambos já se pronunciaram contra as reformas que o país tanto precisa”, lamenta Del Re. O jornalista ressalta que isso pode dar uma impressão de que a Itália não entendeu realmente que muitas das reformas não se fazem necessárias apenas porque Bruxelas quer, mas porque o país precisa delas.

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