Cultura

Um grito parado no ar

Quem são as pessoas que compram ingressos, se aprontam escolhendo uma roupa bacana, pegam o carro, pagam caro o estacionamento e entram num show prontas pra gritar?

Apoie Siga-nos no

Quem são as pessoas que gritam em shows? Quem são as pessoas que compram ingressos, se aprontam escolhendo uma roupa bacana, pegam o carro, pagam caro o estacionamento e entram num show prontas pra gritar? E não é de hoje. Uns vão pra assobiar e outros pra gritar mesmo. Tenho em casa gravações de shows ao vivo datadas dos anos 1960 onde lá no fundo a gente ouve aquele…

– Lindo!

Não é só lindo que gritam não. Tem todo tipo de grito. Quem nunca foi a um show de Maria Bethânia e não ouviu quando dá aquele silêncio sepulcral entre uma música e outra, um gritinho…

– Maravilhosa!

Quem nunca foi a um show em que Caetano Veloso está apresentando as suas novas canções e alguém no escurinho não solta um…

– Leãozinho!

Parece que são sempre as mesmas pessoas, as vozes são parecidas mas, na verdade, não são as mesmas não. Quem já foi a um show de Zeca Baleiro? Lembra? De repente, lá no fundo tem sempre um que berra…

– Toca Raul!

Até em show de João Gilberto, o sistemático que reclama não só do barulhinho mas do ar condicionado, das cordas do violão, da iluminação, da vida, da cidade e do banquinho, tem gente disposta a gritar…

– Chega de saudade!

E aqueles que vão lá no fundo do baú e em pleno show do Chico, um Chico desses tempos de Querido Diário, Essa Pequena, Barafunda e Rap de Cálice e gritam…

– A Banda!

Mas é em show de cantora que os animadinhos e animadinhas mais gostam de colocar suas asinhas de fora. Não tem show de Simone, de Marisa Monte, de Marina Lima, de Adriana Calcanhoto que alguém lá no fundo não solte a voz…

– Gostosa!

– Delícia!

Quando entro numa sala de espetáculo e as luzes ainda estão acesas fico olhando pras pessoas e imaginando quem será que vai gritar, que vai se declarar, que vai pedir uma música.

Últimas crônicas de Alberto Villas:

Foi o que aconteceu no show Recanto da Gal Costa que fui na semana passada em São Paulo, um show digamos de passagem, maravilhoso. Mas não deu outra. E dessa vez não foi uma voz que saiu não se sabe de onde. Saiu de um cara na minha mesa, ao meu lado, que foi ao show com frases prontas e não deixou por menos. Bastou um silêncio depois da canção Divino Maravilhoso pra ele dar o seu berro…

– Um tapa na cara das botocadas!

Todo mundo, acho que meio constrangido, engoliu em seco. Mas eis que de repente, logo depois dela cantar Neguinho, lá vem ele de novo…

– Marilena Chauí número dois!

A resposta veio a cavalo. Um outro cara, lá do outro canto da sala não deixou por menos…

– Vá se foder!

Confesso que gostei mais deste. Foi o último grito que se ouviu naquela noite de sábado naquele recanto.

Quem são as pessoas que gritam em shows? Quem são as pessoas que compram ingressos, se aprontam escolhendo uma roupa bacana, pegam o carro, pagam caro o estacionamento e entram num show prontas pra gritar? E não é de hoje. Uns vão pra assobiar e outros pra gritar mesmo. Tenho em casa gravações de shows ao vivo datadas dos anos 1960 onde lá no fundo a gente ouve aquele…

– Lindo!

Não é só lindo que gritam não. Tem todo tipo de grito. Quem nunca foi a um show de Maria Bethânia e não ouviu quando dá aquele silêncio sepulcral entre uma música e outra, um gritinho…

– Maravilhosa!

Quem nunca foi a um show em que Caetano Veloso está apresentando as suas novas canções e alguém no escurinho não solta um…

– Leãozinho!

Parece que são sempre as mesmas pessoas, as vozes são parecidas mas, na verdade, não são as mesmas não. Quem já foi a um show de Zeca Baleiro? Lembra? De repente, lá no fundo tem sempre um que berra…

– Toca Raul!

Até em show de João Gilberto, o sistemático que reclama não só do barulhinho mas do ar condicionado, das cordas do violão, da iluminação, da vida, da cidade e do banquinho, tem gente disposta a gritar…

– Chega de saudade!

E aqueles que vão lá no fundo do baú e em pleno show do Chico, um Chico desses tempos de Querido Diário, Essa Pequena, Barafunda e Rap de Cálice e gritam…

– A Banda!

Mas é em show de cantora que os animadinhos e animadinhas mais gostam de colocar suas asinhas de fora. Não tem show de Simone, de Marisa Monte, de Marina Lima, de Adriana Calcanhoto que alguém lá no fundo não solte a voz…

– Gostosa!

– Delícia!

Quando entro numa sala de espetáculo e as luzes ainda estão acesas fico olhando pras pessoas e imaginando quem será que vai gritar, que vai se declarar, que vai pedir uma música.

Últimas crônicas de Alberto Villas:

Foi o que aconteceu no show Recanto da Gal Costa que fui na semana passada em São Paulo, um show digamos de passagem, maravilhoso. Mas não deu outra. E dessa vez não foi uma voz que saiu não se sabe de onde. Saiu de um cara na minha mesa, ao meu lado, que foi ao show com frases prontas e não deixou por menos. Bastou um silêncio depois da canção Divino Maravilhoso pra ele dar o seu berro…

– Um tapa na cara das botocadas!

Todo mundo, acho que meio constrangido, engoliu em seco. Mas eis que de repente, logo depois dela cantar Neguinho, lá vem ele de novo…

– Marilena Chauí número dois!

A resposta veio a cavalo. Um outro cara, lá do outro canto da sala não deixou por menos…

– Vá se foder!

Confesso que gostei mais deste. Foi o último grito que se ouviu naquela noite de sábado naquele recanto.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar