Cultura

Lovely Rita

Rita não é apenas um nome. É muito mais

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Sempre sonhei em ter uma filha chamada Rita. Tive quatro filhos, um homem e três mulheres, nenhuma Rita. Coisas da vida. Gosto do nome desde que ouvi pela primeira vez, Chico Buarque, pouco mais que menino, cantando A Rita, numa televisão em preto e branco, na casa do vizinho.

Depois foi Rita Lee cantando Panis et Circences no Colégio de Aplicação, onde eu estudava. Gosto do nome desde que ouvi os Beatles cantando Lovely Rita, a terceira faixa do lado b do Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band, num disco ainda de vinil.

O tempo passou e hoje ainda convivo com cinco Ritas. Uma é a Lisauskas, uma espirituosa amiga do Face. Ela escreve coisas assim: “Olá, Susan Miller, boa tarde. Você disse que fevereiro seria o mês mais incrível da década para sagitário, inesquecível e unbeliveable, coisa e tal. Sei que hoje é apenas (cof, cof) dia 26, mas, né? Cadê? Obrigada. De nada”. 

A outra é ainda a do Chico, aquela que levou meu sorriso no sorriso dela, meu assunto, levou junto com ela o que me é direito E arrancou-me do peito e tem mais. Levou seu retrato, seu trapo, seu prato, que papel! Uma imagem de São Francisco e um bom disco de Noel. 

A terceira, continua sendo a Lee, a eterna ovelha negra da família. Vira e mexe, coloco aqui pra tocar Papai me empresta o carro, Ando meio desligado, Lança-Perfume, Vamos tratar da saúde e outas coisas  mais.

A quarta é a adorável Rita, de Lennon e McCartney, aquela policial que nunca veio tomar um chá comigo.

Mas tem uma quinta e é dela que vou falar hoje. A Lobo. 

Na minha casa, quando eu era criança, tinha apenas dois livros de culinária. Um era o Dona Benta, o livro tradicional da cozinha brasileira e o outro, um livro chamado Bolos Maravilhosos. O Dona Benta era a Bíblia da minha mãe, a rainha do camarão ensopadinho com chuchu. O outro era apenas para decorar a estante. Era um livro com fotos de bolos realmente maravilhosos, mas impossíveis de fazer numa casa tão classe média. Eram aqueles bolos de noiva de dois, três, quatro andares.

A Rita Lobo que vim aqui falar é uma chef de cozinha que conheci numa tarde de verão, quando ela chegou toda tímida na minha sala, na redação do Fantástico, lá no Morumbi. Ela entrou muito quietinha, acanhada mesmo mas, aos poucos, foi se soltando.

Ela tinha um projeto na cabeça que gostei de cara. Queria fazer um quadro dentro do programa, com receitas feitas apenas com os  produtos da cesta básica. Achei o máximo. A culinária estava engatinhando na televisão e, talvez por isso, a diretoria, pisando em ovos, disse não. 

Fiquei frustrado e Rita também, certamente. 

Foi a partir desse dia que virei fã de carteirinha da Rita Lobo. Comprei o livro Cozinha de Estar e uma simples salada de lentilhas foi o primeiro prato que fiz, receita dela. Aqui em casa, temos uma pequena biblioteca na cozinha e os livros da Rita Lobo ganharam um destaque especial.

Temos todos. Além do Cozinha de Estar, já meio velhinho, temos A conversa chegou à cozinha, Cozinha Prática e o Panelinha, nosso livro de cabeceira. 

Do Panelinha, já fizemos mil receitas. Batata gratinada, risoto de funghi, abóbora assada, tirinhas de frango oriental com acelga e broto de feijão e muito mais. O tempo foi passando e Rita Lobo começou a fazer um sucesso danado. Guardo aqui nos meus arquivos, até mesmo um suplemento de cor salmão chamado Outlook, que ela foi capa. 

Na televisão, não perdemos um programa dela. Rita é a melhor de todas, a que mais gostamos, a mais simpática, a mais prática, a mais pé no chão. E me desculpem as outras chefs de cozinha, a Rita Lobo é a mais bonita. Eu não trocaria uma Rita Lobo por nada, nem mesmo por uma bela Bela Gil.

Foi ela quem me ensinou a fazer muita coisa, todas elas deliciosas. Até mojito, tão fácil de fazer, foi Rita quem me ensinou o passo a passo.  

A última receita dela que fizemos aqui em casa foi no domingo passado, um fettuccini com escarola. Em princípio, achamos a mistura meio estranha mas fomos à luta. Ficou delicioso, porque não esquecemos nem mesmo as raspinhas de parmezão e de limão siciliano por cima, que ela sugeriu. 

Só lamento a gente nunca ter trabalhado juntos, eu e a Rita. Gostaria, nem que fosse apenas colocando no ar, domingo à noite, a receita daquela marmita do Adoniran, arroz com feijão e um torresmo à milanesa. Mas fazer o quê? São coisas da vida, do show da vida.

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