Cultura

Conceição do Mato Dentro

Fico daqui imaginando como deve ser bonito e simpático o povo de lá. Por Alberto Villas

"O meu pai, meteorologista, ia muito a Conceição do Mato Dentro onde havia uma posto meteorológico na pracinha". Foto: Prefeitura de Conceição do Mato Dentro
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Em Paris

 

O mundo quase acabando e eu aqui fazendo minha comidinha, lavando minha roupa, escrevendo o meu livro. Aproveito para escrever sempre quando chove lá fora. Da janela vejo um pedacinho de Paris, gente caminhando na garoa sem guarda-chuva rumo ao Beaubourg pra ver Dalí.

André Abujamra está certo quando diz que o mundo é pequeno pra caramba, tem alemão, italiano, italiana. Tem coreano, japonês, japonesa, tem nego da Prússia, do Zaire, tem nego do Zâmbia. Percebo que lá embaixo tem gente de todo canto.

Já corri mundo, corri perigo. Da janela tomando um chá Parney’s Early Grey Bio oferecido pelo flat, fico observando o movimento e pensando com os meus botões: O que estaria acontecendo neste momento em Conceição do Mato Dentro?

O meu pai, meteorologista, ia muito a Conceição do Mato Dentro onde havia uma posto meteorológico na pracinha. Era lá que se media o vento que soprava, a chuva que caia, o sol que fazia. Eu sempre tive vontade de ir a Conceição do Mato Dentro mas nunca fui.

No final dos anos 60, um sábado, enfiei minha calça Lee desbotada, minha camiseta manchada de água sanitária, meu tênis Bamba e com uma mochila de lona nas costas fui pra estrada pedir carona pra Conceição do Mato Dentro. Estava decidido, aquele era o dia. Gostava do nome da cidade e sonhava com aquilo lá, as cachoeiras, as montanhas, os riachos. Eu era uma outra pessoa.

O motorista do primeiro Volkswagem que parou  queria saber o meu destino. Ele estava indo para Brasília e lá fui eu mudando meu destino. Fui parar no planalto central do país dentro de um Volkswagem marrom, deixando para trás o sonho de conhecer Conceição do Mato Dentro.

A cidade fica a apenas 167 quilômetros da minha Belo Horizonte. Nada mais fácil chegar lá mas aquele pequeno desejo do final dos anos 60, começo dos anos 70, perdura até hoje como se fosse uma vontade guardada no peito para sempre. Quanto mais longe vou, mais penso em Conceição do Mato Dentro.

De tempos em tempos dou um Google pra saber como vai minha pequena Conceição. Já sei de cor que tem pouco mais de 20 mil habitantes, que tem a Igreja Matriz, do Rosário, de Santana e a do Bom Jesus do Matozinhos. Sei que em janeiro é a Festa de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos e em novembro o Festival da Cachaça.

Pelas fotos vejo que tem uns sobrados coloniais lindos, muitas montanhas em volta e cada cachoeira mais bonita que a outra. A do Rabo de Cavalo, a de São Miguel e a Cachoeira do Tabuleiro que foi considerada pelo Guia 4 Rodas a cachoeira mais bonita do Brasil.

Sei até que o dia mais frio da história da cidade foi o dia 26 de julho de 1973 quando fez 1 grau. E o dia mais quente foi aquele 18 de outubro de 2005 quando os termômetros do Serviço de Meteorologia marcaram 38,4 graus.

Fico daqui imaginando como deve ser bonito e simpático o povo de lá. Fico daqui imaginando um diálogo da janela de um dos casarões no centro da cidade.

– Oi Dasdô, tudo bom?

– Tudo jóia, fia!

– E os meninos, vão vir pro Ano Novo?

Sei que hoje estou a mais de dez mil quilômetros de distância de Conceição do Mato Dentro mas juro que o que mais queria agora era bater na porta da casa da Dona  Dasdô. Sei que ela iria me receber, oferecer um cafezinho coado na hora, fraquinho fraquinho, docinho docinho, bem mineiro acompanhado de um pedaço de bolo de fubá saindo do forno, fumegando.

Queria sim ver a Dasdô com seus olhos fundos observando o tempo passar na janela que nem a Carolina. Ver os pardais ciscando na pracinha, o coroinha espalhando incenso na Igreja, o vendedor passando com a carroça cheia de legumes… queria ver também um beijo escondido e safado dos adolescentes atrás de uma árvore centenária que certamente lá tem.

Queria conhecer Conceição do Mato Dentro, ver tudo isso agora porque vai que o mundo acaba, não é mesmo?

Em Paris

 

O mundo quase acabando e eu aqui fazendo minha comidinha, lavando minha roupa, escrevendo o meu livro. Aproveito para escrever sempre quando chove lá fora. Da janela vejo um pedacinho de Paris, gente caminhando na garoa sem guarda-chuva rumo ao Beaubourg pra ver Dalí.

André Abujamra está certo quando diz que o mundo é pequeno pra caramba, tem alemão, italiano, italiana. Tem coreano, japonês, japonesa, tem nego da Prússia, do Zaire, tem nego do Zâmbia. Percebo que lá embaixo tem gente de todo canto.

Já corri mundo, corri perigo. Da janela tomando um chá Parney’s Early Grey Bio oferecido pelo flat, fico observando o movimento e pensando com os meus botões: O que estaria acontecendo neste momento em Conceição do Mato Dentro?

O meu pai, meteorologista, ia muito a Conceição do Mato Dentro onde havia uma posto meteorológico na pracinha. Era lá que se media o vento que soprava, a chuva que caia, o sol que fazia. Eu sempre tive vontade de ir a Conceição do Mato Dentro mas nunca fui.

No final dos anos 60, um sábado, enfiei minha calça Lee desbotada, minha camiseta manchada de água sanitária, meu tênis Bamba e com uma mochila de lona nas costas fui pra estrada pedir carona pra Conceição do Mato Dentro. Estava decidido, aquele era o dia. Gostava do nome da cidade e sonhava com aquilo lá, as cachoeiras, as montanhas, os riachos. Eu era uma outra pessoa.

O motorista do primeiro Volkswagem que parou  queria saber o meu destino. Ele estava indo para Brasília e lá fui eu mudando meu destino. Fui parar no planalto central do país dentro de um Volkswagem marrom, deixando para trás o sonho de conhecer Conceição do Mato Dentro.

A cidade fica a apenas 167 quilômetros da minha Belo Horizonte. Nada mais fácil chegar lá mas aquele pequeno desejo do final dos anos 60, começo dos anos 70, perdura até hoje como se fosse uma vontade guardada no peito para sempre. Quanto mais longe vou, mais penso em Conceição do Mato Dentro.

De tempos em tempos dou um Google pra saber como vai minha pequena Conceição. Já sei de cor que tem pouco mais de 20 mil habitantes, que tem a Igreja Matriz, do Rosário, de Santana e a do Bom Jesus do Matozinhos. Sei que em janeiro é a Festa de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos e em novembro o Festival da Cachaça.

Pelas fotos vejo que tem uns sobrados coloniais lindos, muitas montanhas em volta e cada cachoeira mais bonita que a outra. A do Rabo de Cavalo, a de São Miguel e a Cachoeira do Tabuleiro que foi considerada pelo Guia 4 Rodas a cachoeira mais bonita do Brasil.

Sei até que o dia mais frio da história da cidade foi o dia 26 de julho de 1973 quando fez 1 grau. E o dia mais quente foi aquele 18 de outubro de 2005 quando os termômetros do Serviço de Meteorologia marcaram 38,4 graus.

Fico daqui imaginando como deve ser bonito e simpático o povo de lá. Fico daqui imaginando um diálogo da janela de um dos casarões no centro da cidade.

– Oi Dasdô, tudo bom?

– Tudo jóia, fia!

– E os meninos, vão vir pro Ano Novo?

Sei que hoje estou a mais de dez mil quilômetros de distância de Conceição do Mato Dentro mas juro que o que mais queria agora era bater na porta da casa da Dona  Dasdô. Sei que ela iria me receber, oferecer um cafezinho coado na hora, fraquinho fraquinho, docinho docinho, bem mineiro acompanhado de um pedaço de bolo de fubá saindo do forno, fumegando.

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Queria conhecer Conceição do Mato Dentro, ver tudo isso agora porque vai que o mundo acaba, não é mesmo?

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